15 anos de High School Musical 3: por que ainda é tão lembrado? - Cinem(ação): filmes, podcasts, críticas e tudo sobre cinema
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15 anos de High School Musical 3: por que ainda é tão lembrado?

Muita gente séria do meio cinéfilo nunca imaginaria que um filme como High School Musical pudesse emergir como assunto em um site especializado. A verdade é que nem eu mesmo poderia prever que me sentiria motivado a lembrar de minha tenra infância e a recordar dos filmes que me fizeram ter essa paixão pelo cinema que tenho hoje.

Sim, nem todos nós ingressamos no parquinho da cinefilia querendo assistir ao Sétimo Selo já de primeira. Posso apostar até que, vários de vocês que clicaram ou por curiosidade ou por vontade de criticar, conseguem puxar pela memória as primeiras sensações que tiveram quando foram expostos de maneira inédita a essa mídia que hoje amamos tanto. Seja um filme que passou na querida Sessão da Tarde (conheço vários amigos que citam Matilda de 1996 como um marco), ou seja uma grande estreia em cinema como Titanic, todos nós temos esse importante gatilho em nossas mentes, guardado como uma eterna influência.

No meu caso, foi High School Musical. Sentado no sofá lá por 2005, sofri esse baque terrível quando estava na fase correta pro consumo desse tipo de mídia adolescente. O resultado foi a criação de uma tolerância enorme pra musicais e filmes bobinhos da Disney que até hoje me pegam.

E pasme você, em 2023, a terceira iteração da franquia High School Musical completa 15 anos de existência. Estamos ficando velhos. No decorrer do texto portanto, darei o meu máximo pra descrever o que essa famosa franquia tem de tão extraordinário e porquê uma geração inteira venera esses três filmes como clássicos culturais dos anos 2000. Mas pra isso, precisamos primeiramente voltar lá pra 1953.

“The Wild One”, com Marlon Brando, é tido como o primeiro filme adolescente – mainstream– da história do cinema americano. Na época, passado aquele frenesi todo por filmes noir e westerns, Hollywood estava à procura de algo diferente. Neste caso em específico, Wild One é fruto de situações reais que envolviam rebelião e violência, retratando uma gangue de motoqueiros adolescentes que contrariava os estabelecimentos da sociedade. Esse tipo de retrato se tornou lucrativo, ele se comunicava com uma faixa etária diferente das que costumavam frequentemente assistir cinema. E foi por isso que em 1956 a indústria apostou ainda mais alto na juventude como protagonista. “Rebel Without a Cause”, o celebrado e famoso filme de James Dean, chegou como um choque, um terremoto cultural. Inspirando inúmeros jovens da época com seu estilo, personalidade e aparência, a interpretação de Dean no filme foi – agora sim – o pontapé definitivo pra se evidenciar cada vez mais a juventude na telona. O filme era transgressor (em uma escala menor da que se pensa) e problemático de uma maneira que encantava os jovens dos anos 50. O sucesso de “Rebel Without a Cause” – a segunda maior bilheteria de 1956 pra Warner – fez com que “Beach Party” de 1963, mais uma vez retratando adolescentes que vadiavam por cenários deslumbrantes, fosse produzido e amplamente distribuído. Mas mais importante ainda: esse novo ímpeto comercial deu vida ao filme que estou querendo finalmente comparar com High School Musical, uma clara equiparação que tentarei equilibrar.

O filme de Zac Efron e Vanessa Hudgens em 2005 com certeza sequer existiria sem “Grease” de 1978. John Travolta e Olivia Newton-John construíram o molde, deram o exemplo definitivo do que esse tipo de filme adolescente poderia alcançar – e inspirar – com o público jovem. “Grease” era dinâmico, era carismático, era performático ao extremo e tinha principalmente o grande advento da música como um de seus astros principais. Uma combinação letal. Ao conversar com meu pai, por exemplo, vejo que pra ele “Grease” foi o que High School Musical é pra mim. Pela primeira vez no cinema um longa conseguiu inflamar uma geração que queria se ver na tela, queria se iludir, queria se apaixonar. Uma geração quase que perdida, que clamava por histórias de rebeldia, sim, mas também de puro e concreto amor.

Foi seguindo essa exata mesma fórmula que a Disney conseguiu adaptar, expondo os mesmos sentimentos gerados por “Grease” agora para uma nova geração nos anos 2000. Apesar de ter o aspecto técnico em um nível extremamente fraco nos primeiros dois filmes – afinal, tinham o orçamento de televisão e foram feitos para a televisão – “High School Musical 1” e “High School Musical 2” foram sucesso de audiência, os maiores índices de espectadores simultâneos na TV paga americana da primeira década dos 2000. E por isso, em 2008, Zac Efron e amigos foram convidados a projetar todo seu talento nos cinemas ao redor do globo.

“High School Musical 3”, o filme que dá origem a este artigo e que completa 15 anos de idade em 2023, é a versão definitiva da franquia. O terceiro longa é uma extrapolação inacreditável de todos os aspectos dramáticos e estilísticos que HSM já apresentava. A mistura que ficou famosa em “Grease”, de uma história de amor com uma história de aceitação social e cultural, juntada com o sentimento de zelo pela arte (neste caso musical), é ampliada a nível 1000 pelo diretor e idealizador Kenny Ortega (com os cuidados do roteirista original Peter Barsocchini).

O filme que chegou aos cinemas em 2008 já começa com uma super revitalização do aspecto de fotografia, com tons pastéis e senso de profundidade muito mais nivelado do que os telefilmes anteriores. Além disso, todo o esquema de coreografia e cenário é dilatado ao extremo, dando vida a sets extravagantes e cheios de cor.

Mas muito mais do que o visual, “High School Musical 3” também amplia seus temas. A produção é tudo aquilo que correspondia com a geração perdida, uma juventude mais inocente e ingênua do que a dos anos 90 (que tinham acabado de abandonar o grunge e a estética grotesca), e que agora tinha fome de inspiração; o que também traça um paralelo com a geração de “Grease” no final dos anos 70.

O terceiro High School Musical é sobre a incerteza do futuro, a ansiedade da vida adulta e as dores do crescimento. E foi o fechamento perfeito para entusiastas da franquia que se viam nos personagens de Troy, Gabriella, Ryan, Chad (e nem tanto na Sharpay). Foi a conclusão perfeita pois, não tratou a adolescência como algo caricato e muito menos passageiro. A construção de narrativa – um tanto básica porque afinal é um filme da Disney – foi o suficiente para milhares de jovens conseguirem ter um espelho, um norte, uma inspiração para seguirem seus rumos sejam lá quais forem. Principalmente para pessoas que hoje amam arte e tem a ambição de viver dela, High School Musical certamente foi um filme pungente para suas carreiras (vide Maya Hawke em entrevista de imprensa para Asteroid City, ou a imensidão de depoimentos de artistas como Billie Eilish que dizem ter sido muito fanáticos por HSM em suas idades passadas).

É claro que a galhofa dos filmes se ressalta também como um bom atrativo para aqueles que encaram o cinema com bom humor. Não vou mentir que tem muito disso – bem evidente nas coreografias tresloucadas de Kenny Ortega em “Bet on It” e “Screen”, já infames na internet. E isso tudo faz parte do charme. Tudo isso contribuiu pra esse sucesso astronômico e pra esse arrebate geracional que a Disney teve em suas mãos durante quase todo o percurso dos anos 2000 (e que continua até hoje com reboots e remakes). Como eu disse, a conclusão de HSM não trata a adolescência como algo passageiro, assim como “Grease” também não tratou. Sempre levamos as experiências dessa fase conosco. São nossos anos de formação. E assim como a minha mãe, outra assídua espectadora de “Grease”, muito bem disse quando me levou pra ver HSM3 em 2008: “dá vontade de voltar pra viver tudo de novo”. Essa frase dela me marcou quando eu era criança e faço questão de que marque esse artigo como mote.

High School Musical é tão lembrado afinal porque fez parte dos corações de uma juventude transviada, de uma infância inflamada pela arte que acima de tudo guiou uma nova geração pelos caminhos e pelas dores dessa já séria demais vida adulta que hoje teimamos em renegar. Foi uma recontagem, uma adaptação de um modelo de história que tem suas raízes há muito estabelecidas e que vez ou outra sempre ganha uma nova edição ao passar dos anos. Fico muito feliz que na minha vez, foi essa.

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