Crítica: Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa - Cinem(ação): filmes, podcasts, críticas e tudo sobre cinema
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Crítica: Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa

Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa – Ficha técnica:
Direção: Fernando Fraiha
Roteiro: Elena Altheman, Fernando Fraiha, Raul Chequer 
Nacionalidade e Lançamento: Brasil, 9 de janeiro de 2025
Elenco: Isaac Amendoim, Pedro Dantas, Anna Julia Dias, Lorena de Oliveira, Davi Okabe, Guilherme Tavares, Enzo Henrique, Augusto Madeira, Luis Lobianco, Livia La Gatto, Débora Falabella, Guga Coelho, Taís Araújo.
Sinopse: Chico Bento e sua turma precisam se unir para salvar a goiabeira de Nhô Lau quando ela é colocada em risco pelo arrogante coronel Dotô Agripino.

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O que acaba fazendo “Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa” a melhor entre todas as produções audiovisuais Mauricio de Sousa Produções até agora não é apenas o capricho da produção mas a tomada de decisão em ilustrar o imaginário infantil e a própria mente do personagem Chico Bento (Isaac Amendoim, ótimo) com uma vertente cinematográfica que prima pela imaginação. Se nos longas–metragens do Daniel Rezende, por mais que o esforço e empolgação com o material sejam evidentes, os filmes caiam por vezes num lugar mais engessado e apelativo emocionalmente enquanto o longa–metragem co–escrito e dirigido por Fernando Fraiha (que entre outras coisas é o diretor do programa “Choque de Cultura”, o que não é surpreendente ao se assistir ao filme) acaba conseguindo equilibrar um viés pop, sarcástico, cheio de trocas de diálogos irônicas, sacadas de texto maravilhosas de Fraiha, Elena Altheman e Raul Chequer (que também atua no filme e é companheiro de Fraiha do “Choque de Cultura”), quebras de quarta parede, ilustrações visuais mais estilizadas como um momento em animação, as partes do Chico Bento vestido de coração desesperado quando o filme mostra como o seu corpo funciona, a fantasia lúdica do imaginário brasileiro sejam as crianças vestidas de criaturas de folclore ou a visita da Mãe Natureza e também ser muito energético (principalmente em momentos específicos da montagem e do trabalho de câmera) ao mesmo tempo que é um filme com um olhar muito terno pro universo do interior, pras brincadeiras infantis, pra vida infantil, pra inocência, sem nenhum tipo de cinismo, mas também sem nunca ser pueril ou comum, com uma simplicidade na sua trama de uma aventura maravilhosamente banal, uma teatralidade quando Chico é transportado para outro mundo e recuperando uma tradição do cinema brasileiro popular e comercial que parecia perdida entendendo os fatores mais essenciais que compõe o Chico Bento enquanto figura.

É um filme que ao mesmo tempo tem uma referência rápida e fluida a Tudo em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo também acaba dando continuidade para um estilo de cinema digno de Mazzaropi. O equilíbrio é a chave com o filme conseguindo encontrar soluções que podem ser tanto hilarias quanto encantadores como o humor corporal e gestual de todos os personagens como por exemplo os vilões Genesinho e Dotô Agripino (Enzo Henrique e Augusto Madeira, ótimos) repetindo as expressões corporais um do outro enquanto falam ou aquele momento incrível que num grande plano aberto vemos Chico Bento e Rosinha (Anna Júlia Dias) encostados na arvore transformados em duas silhuetas com um pôr do sol fortíssimo e Romária no fundo sendo cantada pelo Renato Teixeira. Um deslumbre. Os contraluzes, a vegetação saturada, as cores e o amarelado da iluminação conseguem dar vida a uma lógica própria vibrante onde o estilo de vida de Chico Bento, o estilo de vida na roça e no interior é celebrado. O filme vê valor nisso e respeita isso. Respeita as tradições, os espaços e os cotidianos até quando faz piada com eles. Os diálogos engraçadíssimos e a composição dos atores encontrando um carisma particular pra esses personagens é um deleite de se ouvir e de se ver a cada momento que ouvimos um “Agripino Road”, Genesinho conta vantagem de viajar pelo exterior, o pai de Zé Lelé (Pedro Dantas) é impedido de pegar as comidas e por aí vai.

Existe uma humanidade muito grande na caricatura assumida que o filme assume – como se tudo fosse uma “grande brincadeira” muito bem construída –  e ele consegue dar lições importantes como a preservação da natureza, a valorização da agricultura familiar, a ganância dos grandes latifundiários e ouvir os que estão ao seu redor de um modo que é orgânico, engraçado, bonito e coerente com a própria trama do filme. É um desses filmes que não quer ser nada além de um filme infantil comercial mas quem por isso faz qualquer coisa, é preguiçoso ou displicente e sim decidi entregar uma obra artística e de entretenimento de muita qualidade pro grande público e para as crianças com o uso inteligente, assertivo e criativo dos elementos que tem em mãos. Isso que tornou os quadrinhos do Chico Bento apaixonantes para uma geração de crianças e tomara que esse filme faça o mesmo. O melhor do cinema infantil brasileiro está muito bem representado nesse filme em que ser “popular”, ser “comercial” e ser “infantil” não é desculpa.

Nota: 4/5

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