Crítica: May December - Festival de Cannes 2023
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Crítica: May December – Festival de Cannes 2023

May December – Ficha técnica:
Direção: Todd Haynes
Roteiro: Samy Burch, Alex Mechanik
Nacionalidade e Lançamento: EUA, 2023 (Festival de Cannes)
Sinopse: Vinte anos após viver um famoso romance que tomou conta da nação, um casal cede à pressão quando uma atriz chega para fazer pesquisas para um filme sobre que recontará a história.
Elenco: Natalie Portman, Julianne, Moore, Cory Michael Smith, Charles Melton, D. W. Moffett.

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Uma máxima conhecida da arte é que não tem história que já não tenha sido contada antes, o que há de novo, então, é o quão criativo você consegue ser ao escolher a forma de contá-la. Em May December, Todd Haynes filma a complexa história de uma atriz (Natalie Portman), que entra na casa – e na vida – de um casal cujo passado polêmico tem interesse em investigar para que possa interpretar Gracie (Julianne Moore) em seu novo filme. A dramatização da história de Gracie para os cinemas, no entanto, envolve abuso sexual infantil, prisão e uma personalidade um tanto complicada, o que faz com que quanto mais os três personagens se envolvem, mais Gracie e Elizabeth irão fundir a imagem uma da outra.

Sabemos que essa história não é nova e o diretor, por sinal, não esconde de onde tirou sua inspiração: há marcas do cinema de Hitchcock, do filme A Malvada (1950) e, principalmente, de Persona (1966), em todos os cantos. Seja nos frames em frente ao espelho onde ambas encaram, ora de frente para outra, ora de frente para a câmera, na câmera que espia os comportamentos desviantes e na trilha sonora de um filme noir (ou seria um thriller psicológico?), as inspirações e referências estão, de fato, por toda parte.

Eu não tenho problema com referências, claro, como eu disse: não há história inteiramente nova. Além disso, também acredito plenamente que todo diretor que se preze precisa de ao menos uma dúzia de referências antes de fazer um bom trabalho – nem que seja uma referência do que não deve ser feito no seu. No entanto, o que não me parece razoável é chamar o filme de Haynes de excepcional, de high camp ou mesmo de seu melhor trabalho até então. Todos esses elogios me parecem exagero.

Não só porque acredito que sua direção seja apenas competente e nada mais, mas porque ao longo do filme eu percebi um brilhantismo muito maior vindo das estrelas do que de um trabalho acima da média vindo da direção. Todd Haynes parece confiar muito que Julianne Moore e Natalie Portman farão seu filme ser, junto das referências um tanto óbvias e uma divisão episódica um tanto tosca – borboleta saindo do casulo, sério? -, acima da média.

Contudo, a verdade mesmo é que isso acabou fazendo de May December nada mais que uma adaptação moderna absolutamente comum e futuramente, facilmente esquecível, de histórias que a antecederam e executaram suas ideias de uma maneira muito melhor. O verdadeiro mérito do diretor esteve em dirigir suas atrizes, até mesmo quando a gente fala do Oscar bait mais óbvio de todos os tempos que Natalie Portman tem no filme (um monólogo de frente para a câmera emulando os trejeitos de Moore perfeitamente), e em adaptar, também, uma história já conhecida para os tempos atuais provocando um debate sobre moralidade, celebridades, tabloides e indústria.

Em Notes On Camp, Susan Sontag tenta descrever o que é camp como, na maioria das vezes, aquilo que causa estranheza imediata por não se submeter aos padrões da suposta normalidade e, consequentemente como algo que irá subverter também a ideia da própria obra, da sua função, do seu objeto. Infelizmente, na minha opinião, May December não chega nem à metade do high camp que tanto li em chamadas imediatamente após a sessão do filme.

Pelo contrário: o que Haynes faz nesse caso, ao menos para mim, é manter a premissa desses filmes anteriores, inclusive na forma, adicionando de novo apenas no que tange a abordagem de temas mais relevantes à sociedade contemporânea, incluindo à esse conto hitchcockiano um senso de modernidade que situa May December no tempo e no espaço, como fruto do momento em que se vive. O que tá longe de significar imediatamente algo bom.

Em suma, o filme até então mais bem avaliado do Festival de Cannes (escrevo esse texto no dia 21 de maio), é nada mais do que essa gama de referências que tendem a agradar o público especializado, alvo dos Festivais do mundo, junto a um comentário social que faz sentido para o mundo contemporâneo. Não existe nada que marque May December como um filme verdadeiramente revolucionário, original ou sequer digno de um reconhecimento tão grande. O que existe, para mim, é uma sede de validação que Haynes soube cutucar dentro do público e ganhou espaço e atenção desde então.

  • Nota
3

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