Crítica: Os Caras Malvados - Cinem(ação)
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Crítica: Os Caras Malvados

Os Caras Malvados

Sinopse: Baseado nos quadrinhos de Aaron Blabey, Os Caras Malvados segue um grupo de animais ladrões e suas travessuras. Sr. Lobo, Srta. Tarântula, Sr. Tubarão, Sr. Piranha e Sr. Cobra sempre foram vistos como maus, desajustados e que assustam todo mundo que os vê. Em um de seus planos de assalto em um evento de gala, Sr. Lobo percebe que eles podem ser bons, ou melhor, que pessoas podem ver eles como bons animais. Sendo pegos pela polícia após um plano malsucedido, o grupo de ladrões decidem se passarem de bonzinhos para que a polícia não fique na cola deles e para não serem mandados para a prisão. Eles acabam aceitando a proposta do Professor Marmelada para ajudá-lo a recuperar porquinhos-da-índia que estão sendo usados para testes em uma empresa. Será que a farsa do grupo se manterá? Ou eles vão finalmente serem os bonzinhos da história?
Direção: Pierre Perifel
Roteiro: Etan Cohen, Yoni Brenner, Hilary Winston
Elenco de dubladores originais: Sam Rockwell, Marc Maron, Awkwafina, Craig Robinson, Anthony Ramos, Richard Ayoade, Zazie Beetz, Alex Borstein, Lilly Singh, Barbara Goodson
Elenco de dubladores brasileiros: Romulo Estrela, Agatha Moreira, Sergio Guizé, Babu Santana, Luis Lobianco, Nyvi Estephan, Sérgio Stern, Pâmella Rodrigues, Isabela Quadro

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Em inevitáveis comparações com a Pixar, as animações do estúdio Dreamworks sempre foram aquelas que tiveram menos pudor em abraçar a cultura pop e as referências ao mundo de fora e incluí-las no universos de seus filmes, a começar por Shrek, primeiro vencedor do Oscar de Melhor Animação e marcado até hoje pela mistura eficaz da sátira com um coração genuíno no drama de seus personagens, combinação que continuou na maioria das animações do estúdio, que sempre contaram, também, com grandes nomes de Hollywood concedendo suas vozes para os personagens destas produções como chamariz. Um star power à moda de Hollywood aplicado nas animações.

Os Caras Malvados é a primeira animação original (sem ser uma sequência) da Dreamworks desde 2017, e temos aqui um retorno ao costume do estúdio: um elenco de estrelas e referências bem evidentes a filmes clássicos, dessa vez não só aos filmes de assalto no geral, mas com alusões diretas a obras como Cães de Aluguel. Isso se percebe já na abertura da animação, situada numa lanchonete, onde acompanhamos um diálogo ao melhor estilo Tarantino, cheio de assuntos ordinários – mas que revelam o necessário sobre a personalidade dos personagens – entre o protagonista Mr. Wolf (voz no original de Sam Rockwell) e a cobra Mr. Snake (dublado por Marc Maron no original) antes de um assalto que os dois personagens realizarão.

Dirigido por Pierre Perifel e escrito por Etan Cohen (com material adicional no roteiro por Yoni Brenner e Hilary Winston), Os Caras Malvados é baseado na série homônima de livros infantis best-sellers do New York Times escrita por Aaron Blabey , em que cinco animais formam um grupo de assaltantes, cada um com uma habilidade particular, que se encaixa também num arquétipo de filme de assalto, da hacker da equipe até o mestre dos disfarces. São eles: Sr. Lobo (Rockwell), Sr. Cobra (Maron), Srta. Tarântula (voz no original de Awkwafina), Sr. Tubarão (voz no original de Craig Robinson) e Sr. Piranha (voz no original de Anthony Ramos). Quando um roubo dá errado, a governadora Diane Raposina (voz no original de Zazie Beetz) coloca o grupo de foras da lei numa espécie de programa de reabilitação. Orientados pelo porquinho-da-índia Professor Marmelada (voz no original de Richard Ayoade), Os Caras Malvados terão a chance de se tornarem Os Caras Bonzinhos.

O elenco de dubladores nacional é composto por nomes como Romulo Estrela (Sr. Lobo), Agatha Moreira (Governadora Diane Raposina), Sergio Guizé (Sr. Cobra), Babu Santana (Sr. Tubarão), Luis Lobianco (Sr. Piranha), Nyvi Estephan (Srta. Tarântula) e Sérgio Stern (Professor Marmelada), com destaque para Guizé e Babu Santana, com sua energia contagiante. Estrela faz um bom trabalho, mas sente-se a falta da voz com cadência naturalmente relaxada de Sam Rockwell, ótima escalação no original, que atribui todo um caráter descolado e particular para Sr. Lobo.   

Os Caras Malvados se eleva  pela decisão criativa da técnica de animação empregada. Na já citada comparação entre Pixar e Dreamworks – por um tempo os únicos grandes estúdios de Hollywood a terem uma janela de lançamentos consistente – existia uma atenção mais clara para o “tipo de filme” que os estúdios entregavam, a primeira considerada mais madura em sua abordagem de temas sensíveis, e a segunda considerada mais despretensiosa em seus filmes “parque de diversões”. No entanto, animações da Dreamworks como Madagascar (2005) e Os Sem Floresta (2006) representam pontos fora da curva nesses desenhos de estúdio, muito pelas experimentações que fizeram com o estilo de suas animações. Ainda que o design dos personagens permanecesse estilizado e cartunesco, a maioria das animações utilizava o 3D da computação gráfica por um caminho que as aproximava do realista nas texturas e na interação dos personagens com o cenário. Filmes como Madagascar abraçaram a psicodelia visual, atribuindo uma lógica interna de cartoon 2D, onde os personagens de borracha se deformavam, onde as leis da física eram totalmente dobráveis, num estilo próximo da anarquia vista nos desenhos do Looney Tunes.

Essa experimentação com a animação 3D foi refinada no enérgico Tá Chovendo Hambúrguer (2009), dos empolgantes diretores Phil Lord e Chris Miller, em parceria Sony Pictures Animation. O grande divisor de águas, porém, foi mesmo Homem-Aranha no Aranhaverso (2018), produzido também por Lord e Miller, que refinou o estilo cartoon enquanto inovava no estilo de animação, elevando essa noção da lógica das animações 2D ao mesclar linguagens diferentes, revolucionando as animações modernas. Essa influência é sentida em Os Caras Malvados, que adota frequentemente o mesmo estilo de animação visto em Aranhaverso. Além dos dois frames por segundo que atribui um aspecto “travado” para animação sem perder a fluidez (pelo contrário; dando mais tempo para digerir as imagens), as expressões faciais dos personagens, modelados num 3D mais convencional, são feitas para emular o 2D, atribuindo um charme particular e atraente visualmente. Tudo é muito expressivo.

Assim, Os Caras Malvados é uma animação que encanta mais pelo charme de suas decisões criativas, elevadas pela competência da execução técnica dessas decisões, do que pela condução de sua história em si, com o pastiche de situações de filmes de assalto, reviravoltas, “mudanças de lado”, e planos maiores, seguido sem muitas surpresas a fórmula. O carisma de seus personagens é o suficiente para garantir a diversão, ainda que falte um pouco de coração nos momentos emocionais. O descompromisso também é familiar à produções anteriores do estúdio, mas isso não foi exatamente um problema com outras obras da Dreamworks, como os já citados – e fantásticos – filmes da serie Madagascar e derivados, e continua não sendo um problema aqui. Temos aqui um estilo de animação instigante e atrativo que fala por si só e torna tudo em cena mais interessante. Por mim tudo bem.

  • Nota
3.5

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