Crítica: Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa - Cinem(ação)
Crítica: Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa
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Crítica: Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa

Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa – Ficha técnica:
Direção: Jon Watts
Roteiro: Chris McKenna, Erik Sommers
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 16 de dezembro de 2021.
Sinopse: Peter Parker (Tom Holland) precisará lidar com as consequências da sua identidade como o herói mais querido do mundo após ter sido revelada pela reportagem do Clarim Diário, com uma gravação feita por Mysterio (Jake Gyllenhaal) no filme anterior. Incapaz de separar sua vida normal das aventuras de ser um super-herói, além de ter sua reputação arruinada por acharem que foi ele quem matou Mysterio e pondo em risco seus entes mais queridos, Parker pede ao Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch) para que todos esqueçam sua verdadeira identidade. Entretanto, o feitiço não sai como planejado e a situação torna-se ainda mais perigosa quando vilões de outras versões de Homem-Aranha de outros universos acabam indo para seu mundo.
Elenco: Tom Holland, Zendaya, Jacob Batalon, Benedict Cumberbatch, Jon Favreau, J. K. Simmons, Willem Dafoe, Alfred Molina.

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*ESTE TEXTO CONTÉM (POUCOS) SPOILERS DO FILME*

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Uma máscara se ergue e revela um rosto. As pessoas no cinema gritam: é ele! Alguns minutos antes, víamos Peter Parker chorar uma morte, mas não tivemos tempo para absorver sua ligação com a tia – que ele sequer chama de “tia”. O que mais emociona nesta sequência é a frase que ela diz alguns momentos antes – uma frase dita antes, em outro filme, lançado há quase 20 anos.

Os primeiros minutos de “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa” parecem o famoso “previously on…” dos episódios de séries – o que, de certa forma, ele realmente é, já que estamos vendo o fechamento de uma trilogia presente em meio a uma franquia de mais de 20 filmes que se mesclam, aqui, com outros cinco filmes de outro estúdio.

O novo filme de Jon Watts (que permanece como o típico “diretor da Marvel”, ou seja, um executor de tarefas) costura muitas informações e transformações que servem a algo que veio antes ou que vem depois. Aquelas explicações sobre o universo.

O Doutor Estranho que carregava tanto peso dramático nos primeiros filmes agora é um inconsequente – mesmo após o episódio (supostamente) gravíssimo com Thanos – e depois de ter visto milhões de possibilidades de futuro em poucos segundos. “Às vezes eu esqueço que você é só um adolescente”, diz o médico para Peter Parker. O Homem-Aranha também não mudou quase nada em relação ao que viveu antes, mas o adulto da cena decide fazer algo que pode trazer graves consequências porque… bom, porque o roteiro pede!

Pontuo estas questões para refletir sobre algo importante que este novo filme solidifica no cinema. Na trama de “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa”, os personagens pouco trazem de suas experiências passadas em outros filmes, e mesmo assim este é o filme da Marvel que mais finca os pés no passado – e nos fatores externos que saem do eixo do filme como obra.

Isso significa que a trama de “Sem Volta Para Casa” pouco importa. Encontrado o motivo para criar os “MacGuffins” necessários, tudo o que importa são os chamados “fan-services”, ou seja, as referências e aparições de atores que evocam outros filmes e outras épocas.

E isso não é de todo ruim. Quando vamos a um parque de diversões, queremos nos divertir. “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa” nos entrega isso. Não há nenhum demérito em fazê-lo, desde que o filme esteja consciente disso, o que me parece ser o caso.

São poucos os filmes da Marvel (este é com a Sony, eu sei) que funcionam como obras únicas. Consigo pensar em Homem de Ferro, Pantera Negra, Thor: Ragnarok – “curiosamente” os mais autorais. Não se trata de trazer informações a respeito das histórias que se concatenam, nem de repetir personagens. Estes filmes citados fazem tudo isso e continuam sendo obras únicas, porque sabem manter uma unidade de linguagem com camadas que os engrandecem.

É claro que “Sem Volta Para Casa” busca fechar um arco de amadurecimento do protagonista. Nós até esquecemos que Peter Parker desapareceu por cinco anos (uma experiência prolongada de quase morte?) e viajou pelo espaço: é só agora que ele precisa entender sobre suas responsabilidades. Não importa, pois não nos lembramos disso e não consideramos que tais fatores deveriam contribuir para a complexidade do personagem. Porque o que importa, aqui, é o filme “per se”, e não a trama.

É um paradoxo: no filme que mais “depende” de filmes anteriores para se valer como entretenimento, temos o menor comprometimento narrativo com o desenvolvimento dos personagens. O que importa é quem vamos ver na tela, literalmente: quais atores estarão presentes. E já que é pra ser assim, que bom que podemos nos divertir com ótima atuação do Tom Holland, e principalmente com o grande Alfred Molina e o gigantesco Willem Dafoe (um dos melhores atores da atualidade, se divertindo como nunca). Há momentos em que vemos os atores mandando mensagens extra-filme. “Tenho certeza que existe um Homem-Aranha negro por aí”, diz o personagem de Jamie Foxx. Sabemos que não é o personagem que diz a frase (a conversa por si só é meio jogada): é uma mescla de mea culpa dos estúdios misturada com pista para filmes futuros.

Em determinada cena, MJ é resgatada. Neste momento, é visível como os atores se entregam à brincadeira da referência, cientes da falta de sutileza. Nesses momentos, é como se o filme tivesse encontrado uma forma de quebrar a quarta parede sem que ninguém precise dar uma piscadinha para a câmera.

Quase todos os filmes da Marvel são promessas de adiamento da satisfação, mas “Homem-Aranha: Sem Volta Para Casa” vai a outro nível. Se as outras obras do estúdio eram como um sexo casual com a promessa de “vamos nos ver de novo, na próxima vai ser melhor ainda”, este filme é uma grande orgia – que ainda inclui a presença do ex!

No futuro, acredito que poderemos nos lembrar de “Sem Volta Para Casa” como um marco no cinema. Não por uma cena memorável ou por mudar algo na trajetória de Hollywood, mas por representar muito bem nossos tempos de stories e tik toks: um tempo em que o saudosismo chega em novas embalagens, a novidade é só uma fotocópia do que veio antes, e a piada interna chamada de “meme” faz um remix de imagens e sons que, apenas naquele momento, nos diverte.

E eu me diverti bastante.

  • Nota
3

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