Eu Cinéfilo #15: "Do começo ao fim" e os muitos meios
Eu Cinéfilo

Eu Cinéfilo #15: “Do começo ao fim” e os muitos meios

Cartaz Do comeo ao fim4.inddTestemunhei pela terceira vez – por livre e espontâneo arbítrio – como fez Thómaz ainda bebê, ao abrir os olhos apenas quando quis.

Esse hábito de re-assistir um filme cuja historia já conheço do começo ao fim, é culpa do cascão resultado da forte coceira que ele me provocara no primeiro encontro.

Ah nossos olhos! Abertos vêem tudo, fechados sentem mais.

Privilegiado é o pequeno Tom Tom que foi contemplado em ao abrir os olhos pela primeira vez, ver o amor, materializado em Francisco.

Pensar que os defensores da verdadeira ‘família real’ tentaram podar a arte do seu pintor.

Abro aqui um parêntese para compartilhar minha exclamação!

Exclamação e interrogação por não entender como em pleno século XXI – era digital, era tecnológica – o nosso cinema nacional – e o que de bom ele consegue nos oferecer em meio ao lixo cômico que insistem em plagiar dos americanos, as dificuldades estruturais e as algemas da distribuição global – ser vítima de censura. A tecnologia avança, o conteúdo regride ao Estado Novo ‘Velho’.

Por que o incesto tem que ser entre dois irmãos de sexos opostos? Por que um incesto entre um irmão e uma irmã pode? O pecado é menor? A punição é menos infernal? São perguntas que – particularmente – não tem respostas, simplesmente não deveriam se quer precisar ser proferidas. Blasfêmia!

Mas como nem tudo está perdido, Marco Nanini aparece e com toda sua sapiência e sabedoria de um grande ator (e cidadão), topa produzir o filme do astuto Aluizio Abranches.

– Profano, Nanini!

A audácia de Aluizio é de tirar o chapéu. Tratar de um tema tão polêmico, que é a homossexualidade, abordando a relação incestuosa entre dois irmãos, não é pra qualquer um.

Um trunfo do roteiro é mostrar com delicadeza o nascimento da relação, da infância à fase adulta dos protagonistas, Thómaz e Francisco.

O que no inicio parece ser uma afinidade de irmãos (bem defendidos pelos interpretes mirins, Lucas Cotrim e Gabriel Kaufman), que moram juntos, brincam juntos, estudam juntos, se descobrem juntos… E com o vai e vem do calendário se desenha uma sólida paixão.

Esse rito de passagem e o papel da família, em especial da figura materna ‘Julieta’ (Julia Lemmertz à flor da pele) é exposto de uma forma tão naturalista e simbólica que fez eu me pergunta: Onde está o problema? No sentimento ou na própria sociedade?

A brancura da narrativa e a falta de conflitos externos das personagens centrais, fez com que essa pacificidade fosse questionada e o filme recebesse varias críticas por mostrar o relacionamento homossexual de uma lente elitista e que não estamos acostumados a ver.

E a natureza do incomodo pode estar justamente aí, na passividade generalizada que prevalece na narrativa.

De tanto testemunharmos – na ficção e na realidade – dramas familiares entre filhos e seus pais preconceituosos e atitudes reacionárias da nossa sociedade conservadora, causa certo estranhamento uma mãe e dois pais descobrirem a relação homossexual dos filhos e agirem naturalmente, no tempo do sentimento que os une.

Estórias como essa podem acontecer em qualquer família, cada uma reagirá de uma forma, mas estamos tão condicionados, seja pela mídia ou pela própria cultura familiar, a polemizar tudo, que o mais singelo ato de amar, seja lá quem for, vira o começo do fim.

 

Texto escrito por:

Felipe Ferreira
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