Crítica: Wicked
Wicked – Ficha técnica:
Direção: Jon M. Chu
Roteiro: Winnie Holzman, Dana Foz, Gregory Maguire
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2024
Elenco: Cynthia Erivo, Ariana Grande, Jeff Goldblum, Michelle Yeoh, Jonathan Bailey, Marissa Bode, Peter Dinklage, Bowen Yang, Ethan Slater.
Sinopse: Elphaba, uma jovem incompreendida por causa da pele verde, e Glinda, uma jovem popular, se tornam amigas na Universidade de Shiz, na Terra de Oz. Mas a amizade delas chegará a uma encruzilhada.
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Filme, livro e peça, o mundo mágico de Oz encanta plateias desde o início do século passado. Desde o livro de L. Frank Baum, eleito como “o maior e mais amado conto de fadas dos EUA” pelo congresso americano, lançado exatamente em 1900, Oz se apresenta para a cultura mundial como um clássico da fantasia cujos personagens emblemáticos são amplamente conhecidos e renovados a cada nova adaptação, seja para os palcos ou para as telas.
Em 1995, com os direitos de Baum sobre a história que criou caindo em domínio público, o escritor Gregory Maguire imagina uma história por trás da Bruxa Boa do Leste e da Bruxa Má do Oeste e então “Wicked: A História Não Contada das Bruxas de Oz” nasce. Em menos de dez anos, o livro se tornou peça na Broadway (e no Brasil, também) e então nunca mais saiu do topo das bilheterias nos palcos, atraindo fãs fiéis pelo mundo inteiro com músicas marcantes, personagens cativantes e discussões de temas atuais e caros à sociedade, como o racismo e a imposição de governos autoritários e seus falsos messias.
Com tudo isso, não demoraria muito para que a história prequela do filme de 1939 recebesse uma adaptação para os cinemas. De orçamento milionário, em torno de mais de 100 milhões de dólares, “Wicked” chega para as telas este ano arrastando tanto a legião de fãs que já conheciam sucessos como “Defying Gravity” da peça de teatro e os que já tinham o filme clássico na lista de favoritos, quanto novos entusiastas desta história, atraídos principalmente pelos nomes de Ariana Grande e Cynthia Erivo.
O diretor Jon M. Chu tinha uma grande tarefa pela frente. Adaptar ‘Wicked’ não significa apenas transpor a magia do livro de 1995 para as telas, como pede uma adaptação literária fantástica, trata-se antes de tudo de uma adaptação da peça musical de sucesso e isso implicou em, além de incorporar a roteirista da peça como parte integrante da construção do roteiro do próprio filme, honrar a natureza de um musical no palco e no cinema, com grandes números e performances.
Pode-se dizer que o primeiro acerto da adaptação está naquilo que eleva os números: a escolha das protagonistas e a câmera dinâmica. Nada nesse filme teria funcionado caso a química entre Ariana Grande e Cynthia Erivo não fosse tão hipnotizante. Com estilos diferentes de atuação, Cynthia e Ariana se complementam como antítese uma da outra, entre o naturalismo e o exagero. Ainda, o fato de ambas as atrizes estarem familiarizadas com os palcos do teatro e serem fãs antigas da história sem dúvidas parece ter colaborado para que ambas tenham sucedido em transpor uma energia contagiante para as câmeras, felizes por estarem ali e se divertindo, o que cria um carisma natural o qual impede que o filme caia mesmo quando parece que vai perder o ritmo.
A câmera dinâmica, por sua vez, é essencial para envolver o espectador no espetáculo dos musicais. Sem uma câmera dinâmica, filmar um número musical se torna um ato enfadonho e, em um filme de quase três horas de duração, manter o espectador engajado nessas performances é essencial. Além do mais, criar uma atmosfera única para cada número também é importantíssimo e eu acredito que Wicked faz isso. Você deixa a sala do cinema e, mesmo sem conhecer a peça, consegue se lembrar das músicas apenas pela atmosfera que o diretor cria para cada número e isso é valioso.
Contudo, ainda acredito que o filme poderia ter ido muito mais além. Embora a direção de arte seja absolutamente impecável, com a criação de quase um parque temático como set, a direção de fotografia não corrobora com este trabalho e peca pela escolha por uma câmera digital que não oferece muita profundidade de campo e trabalha de maneira pouco satisfatória seu contraste. O resultado é um filme com imagens não tão autênticas, que pouco honra o legado Technicolor deixado pelo filme de 1939.
O início de “Defying Gravity” é bastante escuro e difícil de enxergar e cenas inteiras, como a de Elphaba nos campos abertos em “The Wizard and I”, são simplesmente lavadas e unidimensionais. A busca de Chu por uma espécie de Oz “realista”, além de sem sentido, acabou criando alguns momentos difíceis de defender. Com a tecnologia atual e um orçamento estratosférico, não me parece vantajoso construir um set tão deslumbrante, para depois, no tratamento de cor, conceder pouca vivacidade a ele e plastificar tudo como seria com CGI.
Para ser real, Oz não precisava ser tão acinzentada ou mesmo com tanta luz. Luz não garante a criação de boas imagens por si só, ainda que na mais alta resolução possível. O tema central dessa história, o racismo, o bullying e, claro, a amizade entre Elphaba e Glinda nisso tudo, jamais seria menos real com um filme mais atrativo aos olhos. Ademais, acredito que falar sobre tais temas sob a perspectiva apresentada pelo filme já é, em si, extremamente importante e, por isso e pelas atrizes, principalmente, o saldo é positivo.