Trash Freak #4: Teeth (2007), o curioso caso da jovem que tinha dentes na vagina
Há histórias que se espalham por todo mundo surpreendentemente. Elas funcionam como grandes memes replicando-se desde culturas antigas até chegar a nossa admirável era dos boatos via redes sociais. Talvez, o maior exemplo dessa viralização mundial bem-sucedida da lenda urbana é a história do lobisomem.
Ninguém sabe como… nem o porquê, mas o mito do homem que se transfigura num lobo aparece em relatos de culturas indígenas antigas como os Astecas, em grandes civilizações antigas como no mundo Greco-romano e, sabe-se lá por que, aparece também em lendas de povos que habitavam o extremo oriente do que hoje é a Rússia… sem falar nos ‘‘causos’’ daqueles seus amigos que vieram de Minas Gerais…
Na história cultural da humanidade existem vários cases de “lendas urbanas meméticas” e quiçá um dos mais bizarros desses enredos seja a história da vagina dentada. A fábula da mulher que tem dentes ou ventosas na vulva foi contada por egípcios, babilônicos, gregos antigos e foi turbinada na Europa, principalmente na Idade Média, com um intuito claro de repressão da sexualidade. A partir desse mote, o diretor americano Mitchell Lichenstein resgatou a história da vagina polêmica para o mundo dos cinemas e assim nasceu Teeth.
O filme foi considerado uma grata surpresa em 2007 no aclamado Festival de Sundance e logo ganhou uma distribuidora para ser lançado em escala global. Ele conta a história de uma adolescente americana, a estudante Down O’keefe (Jess Weixler), em conflito com sua sexualidade. A jovem nasceu com uma mutação genética que a faz possuir dentes em sua vagina.
Essa ‘‘peculiaridade’’ se manifesta pela primeira vez ainda na tenra idade, na infância, quando o problemático irmão mais novo de Down tenta boliná-la e quase tem o dedo decepado. Na adolescência, Down entra num grupo escolar de jovens cristãos americanos que prometem manter a castidade até o dia do casamento. A moça conhece um estudante novo que entra no grupo e a partir daí se desenrola uma série de críticas a um falso puritanismo de uma parte da sociedade americana.
Utilizando-se da relação conflituosa da protagonista com o sexo masculino, Teeth caminha entre a complicada linha entre a crítica social, o drama, o terror, o trash e a comédia. Justamente, talvez seja o maior defeito da película. Algumas críticas são originais e soam como bons pontapés na misoginia enraizada, não só na cultura americana, mas em boa parte da cultura ocidental. Porém, a maioria das críticas acabam caindo na superficialidade e na vala triste do lugar-comum.
Como drama não funciona de jeito nenhum pela total falta de capacidade interpretativa dos atores que atuam no longa. O roteiro acaba insistindo muito nessa perspectiva, o que torna a história um pouco massante. Algumas pitadas de comédia são bem legais. A cena da protagonista indo pela primeira vez ao ginecologista é hilária, pois entrou de cabeça no mundo trash. Alias, característica que faltou a obra. Faltou brincar mais com o nonsense da história. Vemos alguns pênis decepados pelo caminho(nada que impressione), mas faltou mais ousadia num roteiro que permitia exageros. Mitchell Lichenstein, você precisa assistir mais uns filmes do Robert Rodriguez, meu filho!
O final é bem previsível e com uma vingança poética que dá mote para uma continuação das peripécias da jovem Down e sua vulva pelo mundo. Seu olhar malicioso e sorrisinho irônico em direção ao espectador dão aquela sensação de déjà-vu… um clichê dos filmes do terror imortalizado pelo personagem Damien, da série “A Profecia.”
Para fazer a coluna Trash Freak aqui do Cinem(ação) sempre faço pesquisas na rede sobre como outras pessoas percebem os filmes que aparecem aqui. Com Teeth aconteceu uma coisa bem peculiar: ele caiu nas graças do universo cult… existem até artigos de psicanálise sobre o filme. Artigos sérios que citam Freud e outros estudiosos da área para analisar o filme. Como não sou psicanalista e sim apenas um rapaz latino-americano que curte o lado B do cinema, Teeth vai ser aquele filme que teve uma sacada legal, mas não soube bem como explorar totalmente seu potencial… Valeu pela originalidade de resgatar o mito da vagina polêmica que colocava terror na rapaziada nos seus áureos tempos e andava meio no ostracismo da geral.