Crítica: Duna (2021) - Cinem(ação)
Duna - cena do filme
4 Claquetes

Crítica: Duna (2021)

Duna – Ficha técnica:
Direção: Denis Villeneuve
Roteiro: Denis Villeneuve, Jon Spaihts, Eric Roth
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 22 de Outubro de 2021.
Sinopse: Duna conta a história de Paul Atreides, jovem talentoso e brilhante que nasceu com um destino grandioso, para além até da sua própria compreensão, e precisa viajar ao planeta mais perigoso do universo para garantir o futuro de sua família e de seu povo. Enquanto forças malévolas levam à acirrada disputa pelo controle exclusivo do fornecimento do recurso mais precioso existente no planeta – capaz de liberar o maior potencial da humanidade – apenas aqueles que conseguem vencer seu medo vão sobreviver.
Elenco: Timothée Chalamet, Rebecca Ferguson, Oscar Isaac, Jason Momoa, Josh Brolin, Stellan Skarsgård, Zendaya, Dave Bautista, Stephen McKinley Henderson, Sharon Duncan-Brewster, Chang Chen.

.

Enquanto assistia a Duna, por um momento desejei esquecer do que havia lido nas páginas do romance de Frank Herbert – e até mesmo do filme equivocado de David Lynch. Mas o fato é que nunca saberei o que é ver a nova obra de Denis Villeneuve sem os conhecimentos prévios deste importante clássico da ficção científica.

Depois de filmar A Chegada e Blade Runner 2049, duas excelentes adaptações de obras literárias de ficção científica (mesmo que a segunda seja uma continuação), Villeneuve chega muito seguro de si para adaptar este romance que é talvez um dos mais difíceis de se transferir das páginas para as telas.

Com uma história bastante complexa que envolve Casas que comandam planetas dominados por um império, Duna tem teor político, ecológico e religioso em sua história. Colocar tudo na tela grande já seria difícil o suficiente em um longa-metragem verborrágico e didático, e se torna ainda mais complexo com a proposta do diretor autoral canadense.

Em Duna, acompanhamos a jornada de Paul Atreides, herdeiro da Casa que comanda o planeta Caladan e que é convocada a mudar-se para Arrakis, planeta praticamente sem água onde vive uma população nativa resistente ao império. O Duque Leto Atreides sabe que está sendo jogado em uma cilada política. O planeta é fundamental para a economia, pois tem a única fonte de extração da Especiaria, substância que funciona como fonte de energia para toda a galáxia.

É corajoso, portanto, que este “Duna” não se preocupe em explicar toda a mitologia ou os pormenores, deixando para que o espectador presuma que um personagem tem habilidades mentais ao virar os olhos; ou que uma tecnologia de escudo impeça uma pessoa de ser baleada, mas não de ser golpeada com facas e dardos lentos, por exemplo. Tal característica combina com a própria obra original, que também não explica os nomes e elementos do universo apresentado, deixando para que o leitor entenda pelo contexto.

“Os sonhos são mensagens das profundezas”, diz a legenda antes mesmo de o filme nos apresentar o logo da Warner Bros. Com isso, Villeneuve nos convida de maneira quase mística a adentrar neste mundo, que mistura fantasia com ficção científica – que, não à toa, influenciou obras como Star Wars e As Crônicas de Gelo e Fogo.

Ainda que para mim seja difícil imaginar como é ver o mundo de Duna pela primeira vez por meio desta adaptação, o fato é que as escolhas do filme fazem com que ele dependa de bastante investimento do público. Um espectador desatento ou pouco engajado certamente dirá que o filme é chato – e por isso mesmo ele ganha muito ao ser visto no cinema, onde o foco é total.

Isso acontece porque Villeneuve lança mão de todos os elementos para fazer de Duna um filme grandioso – em todos os sentidos. São duas horas e meia de duração, trilha sonora estonteante, cenários vastos e opressores, figurino sóbrio, personagens solenes. É um filme que sabe nos fazer sentir sua imensidão. O estilo calculado do diretor, bem como sua familiaridade com o épico impedem que o filme possa ser acusado de pretensioso. Filmes assim são aqueles que não atingem a grandiosidade que se propõem, e o fato é que este consegue alcançá-la.

Os sonhos de Paul Atreides (que, como vemos no começo, são premonições) e sua relutância em ser o messias do novo planeta apenas reforçam que estamos diante da famosa “jornada do herói”, ainda que incompleta (seja ela clássica ou “desconstruída”). Sua mãe Lady Jessica, interpretada por uma Rebecca Ferguson mais vulnerável, é mentora e também protegida por Paul.

Muitas das relações e sentimentos não são explicitados. O temor de que algo ruim vai acontecer está muito mais no clima do filme e em sua trilha sonora. A importância dos acontecimentos reside nos planos abertos e lentos, que reforçam essa grandiosidade por meio da linguagem. Mistérios não são respondidos, e muito do desenvolvimento dos personagens se dá no âmbito do onírico. E tudo isso torna o filme menos palatável a quem busca entretenimento fácil.

É nesse ponto que residem minhas ressalvas a Duna, e aqui falo mais do projeto que do filme em si. “Duna” é um filme quase perfeito: tudo nele é polido, belo e calculado. Fosse realizado nos anos 2000, poderia ser um sucesso estrondoso. Mas vivemos em tempos diferentes: além de enfrentarmos uma pandemia que afasta as pessoas das salas, o “cinemão” dos dias atuais depende cada vez mais do “filme-evento”, do entretenimento “pipoca”, e não vejo Duna com essa característica. Ademais, mesmo com o discurso anticolonialismo e pró-ambientalismo, sua trama grandiosa e fria parece distanciar-se do Zeitgeist (nosso espírito do tempo), que parece clamar por proximidade entre obra e público.

Posso – e espero – estar enganado. Villeneuve pode ser justamente o diretor a voltar com a solenidade clássica dos blockbusters sisudos, (como O Senhor dos Anéis e 300). Caso contrário, esta obra tecnicamente impecável pode não ter o retorno necessário e morrer na praia. Ou melhor: no deserto.

  • Nota
4.5

Deixe seu comentário