Crítica: Não Há Mal Algum – 44ª Mostra de São Paulo - Cinem(ação)
Não Há Mal Algum - 44ª Mostra de São Paulo
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Crítica: Não Há Mal Algum – 44ª Mostra de São Paulo

“Não Há Mal Algum” é um conjunto de histórias potentes e debates necessários. Venceu o Urso de Ouro de Melhor Filme no Festival de Berlim.

Ficha técnica:
Direção: Mohammad Rasoulof
Roteiro: Mohammad Rasoulof
Nacionalidade e Lançamento: Irã, Alemanha, República Tcheca, 2020 (44ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: No Irã, quatro homens são colocados diante de uma escolha impensável, mas, ao mesmo tempo, simples. Não importa a decisão que eles tomem, ela irá transformar de maneira corrosiva, direta ou indiretamente, eles mesmos, seus relacionamentos e a vida de cada um. As quatro histórias são variações de temas cruciais ao redor de questões morais e da pena de morte, e que questionam até que ponto a liberdade individual pode ser expressa sob um regime tirânico e suas ameaças aparentemente incontornáveis.

Elenco: Ehsan Mirhosseini, Shaghayegh Shourian, Kaveh Ahangar, Alireza Zareparast, Salar Khamseh, Darya Moghbeli.

Se for possível assistir a “Não Há Mal Algum” sem saber nada sobre o filme, é melhor. Acompanhar o pai de família Heshmat em um dia comum de sua vida é como ter um mistério a ser resolvido. Sua expressão fria, sua inércia no trânsito e seus remédios para dormir mostram que estamos diante de uma depressão silenciosa. O motivo para isso é que choca.

A partir de então, o filme de Mohammad Rasoulof passa a explorar de maneira mais aberta o tema. Na segunda das quatro histórias que acompanhamos, os diálogos fazem questão de explicar o funcionamento do sistema que ainda vigora no Irã.

Poder-se-ia dizer que “Não Há Mal Algum” carrega consigo os problemas de se contar diversas histórias em um longa: como não podemos nos aprofundar em todos os personagens, acabaríamos por ver tramas rasas. No entanto, trata-se de um filme mais sobre temática do que sobre personagens. É um grito de protesto.

Mesmo assim, o fato é que “Não Há Mal Algum” ainda consegue explicar de forma eficiente os personagens principais mesmo com menos tempo de tela. Além do melodrama evocado para engrandecer os sentimentos, as boas atuações e o roteiro, que engaja por revelar-se aos poucos, permitem que compreendamos a profundidade necessária de cada um.

De fato, há momentos em que a ansiedade ou perturbação por parte de alguns personagens é levada a um nível mais eficiente para questões fílmicas do que verdadeiramente realistas: a perturbação do primeiro protagonista me parece fazer mais sentido, ainda que os protagonistas mais jovens tenham essa função de elevar os sentimentos às máxima potência.

Considerando todas as histórias como independentes ou entendendo a segunda e a quarta como interligadas, o fato é que o filme também discute escolhas. Resistir ao sistema causa conflitos, mas submeter-se a ele também. Apertar um botão – que será pressionado por alguém de qualquer maneira – pode ser a diferença entre ter paz de espírito e permanecer com uma sombra ao seu lado por toda sua vida, tal qual a roupa colocada na árvore. Recusar-se e rebelar-se é um ato que merece ser celebrado com uma canção antifascista italiana.

Sendo o segundo país com mais execuções por pena de morte no mundo, o Irã é como uma fazenda que opta por matar as raposas em vez de cercar as galinhas. O cinema como espaço de reflexão sobre isso é uma das melhores formas de se debater – e de sentir.

“Não Há Mal Algum” é o tipo de filme que carrega imagens poderosas e mensagens importantes demais para ser ignorado. O fato de ser realizado com uma unidade temática apenas reforça o quanto o cinema pode fortalecer histórias que, separadas, não teriam o mesmo peso.

  • Nota
4.5

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