Crítica: As Veias do Mundo – 44ª Mostra de São Paulo - Cinem(ação)
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Crítica: As Veias do Mundo – 44ª Mostra de São Paulo

“As Veias do Mundo” é um filme que busca na infância a conexão com a terra.

Ficha técnica:
Direção: Byambasuren Davaa
Roteiro: Byambasuren Davaa, Jiska Rickels
Nacionalidade e Lançamento: Alemanha, Mongólia, 2020 (44ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Amra mora nas estepes da Mongólia. Ele tem uma vida comum para um menino de 11 anos: seu pai o leva para a escola todas as manhãs, ele cuida das ovelhas e cabras da família à tarde e sonha em participar de um popular show de talentos. Mas a infância do garoto é brutalmente interrompida quando seu pai morre em um acidente.

Elenco: Bat-Ireedui Batmunkh, Purevdorj Uranchimeg, Algirchamin Baatarsuren.

A primeira imagem que vemos em “As Veias do Mundo” é de uma belíssima paisagem. Pudera: a Mongólia é um dos países com algumas das belezas naturais mais impactantes do mundo. O diretor de fotografia Talal Khoury explora isso muito bem, mas o filme vai muito além delas.

Acompanhamos a história do simpático Amra, menino carismático fascinado por acompanhar vídeos de canções baixados no celular. Ele vive uma vida simples e feliz ao lado do pai, da mãe e da irmã. É o que vemos também na fotografia do interior da casa em que ele vive, que aproveita da luz amarela que deixa o ambiente mais quente – em oposição a cenas posteriores, quando a vida do protagonista não estará mais tão feliz.

O embate entre o pai do protagonista – sempre carinhoso e compreensivo – e as mineradoras não é apenas mostrado por meio das máquinas que passam a fazer parte do cenário, mas também pelos diálogos das reuniões entre ele e seus colegas camponeses que o respeitam como líder.

“As Veias do Mundo” é também um filme sobre memória e ancestralidade, tal qual “Panquiaco”, “Os Nomes das Flores”, “Isso Não é um Enterro, É uma Ressurreição” e “Casa de Antiguidades” – cada um em diferente níveis. No filme mongol, o chamado “progresso” promovido pelas grandes empresas, desinteressadas nos povos da terra, recebe denúncias mais pungentes.

Note, por exemplo, como a própria tragédia na vida do protagonista se dá por causa das ações das empresas mineradoras. Não é à toa que, mesmo com base em uma ideia pueril, o filme fale do espírito do pai como forma de combate à exploração da terra. Quando vemos que a canção que Amra escolhe cantar é inicialmente considerada “infantil”, o filme defende a ideia de que a infância permite encontrar o caminho com o passado.

As artes e as canções são, desde os primórdios da humanidade, nosso mais poderoso elo com a história que carregamos. Na cena final, é a voz do menino que entoa o belo hino a evocar a tradição dos povos e a citar os demônios que fazer a terra perdida.

Aliada às imagens que se contrapõe às belezas da Mongólia, a canção provoca a reflexão inevitável: uma vez que as veias se abrem, não se recupera o sangue perdido.

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