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“Steven Spielberg vs. Netflix”

O diretor norte americano Steven Spielberg tem estado incomodado com o fato de uma plataforma digital como a Netflix, ao lançar Roma, poder concorrer com seu filme à estatueta mais famosa do mundo. De acordo com o cineasta, a plataforma não concorre de forma igualitária com as outras plataformas, consideradas por ele, como estúdios analógicos. A seguir, algumas das reclamações, as quais podem ser lidas na totalidade no seguinte site.

  • Netflix spent too much. One Oscar strategist estimated “Roma” at $50 million in Oscar spend, with “Green Book” at $5 million. (The New York Times reported $25 million; Netflix insists awards were folded into their entire marketing budget.)
  • “Roma” only spent three weeks as a theatrical exclusive.
  • Netflix movies are available in 190 countries, 24-7.
Mandatory Credit: Photo by Michael Buckner/Variety/REX/Shutterstock (10107281az) Steven Spielberg 55th Annual CAS Awards, Inside, InterContinental Downtown, Los Angeles, USA – 16 Feb 2019

De fato, nessa reflexão, não venho detalhar analiticamente as questões que permeiam a opinião de Spielberg, apenas citei alguns fatos e suas fontes. Porém, acredito ser uma pauta interessante a ser debatida já que diz respeito ao cinema e ao modo de se fazer cinema. Há um modo tradicional de fazer filmes: a dificuldade de arrecadar dinheiro, tanto como, a forma de captar dinheiro, que no caso do Netflix, é ele como produtor do filme, à arrecadar tal quantia e não o diretor propriamente dito. Além disso, Spielberg acredita que o produto da plataforma citada diz respeito a um espelho de um formato televisivo e não cinematográfico e, por tal razão, não deveria concorrer ao Oscar, mas ao Emmy.

Em certa medida entendo a preocupação do diretor norte americano, principalmente com vista ao fato dele ter uma bagagem extensa e por ter uma credibilidade respeitada no mundo do cinema. Sua opinião não pode ser descartada, entretanto, estamos diante de um outro mundo. O avanço da proliferação dos serviços de Streaming, acompanhado das inovações e do desenvolvimento da internet são um reflexo desse mundo. Um dia íamos ao cinema, hoje ele vem até nós. De certo modo podemos observar esse acontecimento através de um prisma positivo, assim como, negativo. Quem gosta de presenciar a sala de cinema, estar diante da tela, sentir o som, estar ao redor de outras pessoas, ou seja, fazer do “ver filme” um evento e não um ato de entretenimento, apenas; com efeito, pode discordar da proliferação do Streaming. No entanto, apesar desse avanço, também, não pode-se afirmar que por tal razão, os filmes serão piores ou de menor qualidade: dizer isso, ao meu ver, é falso.

O que pode ser questionado acerca desse progresso, por assim dizer dessas plataformas, relaciona-se a uma demasiada produção de filmes. “Mas isso é uma coisa boa, não é, ter muita produção?”, poderíamos perguntar. Por um lado sim e por outro não. Quanto mais produção, mais filmes e mais acessos, porém, menos qualidade, talvez. Não que seja uma questão necessária, mas a arte não é uma máquina ou uma fábrica de produtos e, de tal maneira, é por essa via que poderíamos refletir sobre esse assunto, isto é, se o cinema pertence a um nível de arte maior do que a arte televisiva, se a televisão é arte, ou mesmo perguntarmos, o que é arte. Por tal razão, fica um pouco complexo definir ou mediar o que é o melhor, mesmo porque, tal asserção não é tão simples.

Embora considerar a procura do conceito de arte ser importante, penso ser significativo, à luz da questão aqui direcionada, pensar sobre o efeito do cinema no mundo, nas sociedades e na cultura. O simbolismo que a arte cinematográfica possui ao conversar com ilusão e com realidade através da arte faz dela por si mesma algo de poderoso. Para Nietzsche, por exemplo, o artista só pode existir em tempos de crise, ou seja, é ele quem ilumina a escuridão de um tempo sombrio. Mas, então, seria necessário um estado de crise para se fazer arte? E a questão da inovação tecnológica como forma de criar novas ilusões e novas realidades? Tal avanço, de certo modo, faz do cinema melhorar ou piorar – usando termos simplistas – pergunto. São perguntas a serem feitas e que considero valiosas para assim podermos dialogar com o movimento tradicional do cinema e com o movimento moderno ou contemporâneo.

A postura do Netflix diante do tema e da perspectiva dos diretores de Hollywood condiz com sua forma de atuação diante de sua abundante produção nos últimos tempos. Foi ela quem trouxe sua importância ao mundo como ferramenta de Streaming e, em certo sentido, merece crédito. Além disso, é devido a essa postura que tanto a Amazon, a Disney, quanto a Apple, estão diante de uma nova fase, visto que estão a criar suas próprias plataformas autorais de Streaming. Há algo de bom, então; mais concorrência e quanto maior a competição, maior o ensejo por algo melhor. Vejo como não tão seguro considerar se os produtos serão os ideias, bons ou ruins, tal caminho não cabe, já que faz parte de um juízo de gosto e tal, faz parte de uma análise do processo de conhecimento da verdade – ao olhar de Kant – e essa é uma outra conversa.

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