Crítica: As Viúvas (Widows, 2018)
As Viúvas tinha potencial para ser um dos grandes filmes de 2018. O longa ainda tem um saldo positivo, porém há de se fazer algumas ressalvas. Mas antes, do que trata a obra dirigida por Steve McQueen (12 Anos de Escravidão)? O mote principal é um grupo de mulheres que acabou de perder os maridos e elas se organizam para efetuar um roubo (os maridos eram ladrões). Como tramas paralelas – obviamente relacionadas com a central – As Viúvas aponta para as histórias individuais de cada personagem, além dos bastidores de uma eleição.
A abertura do filme dá o tom: a alternância de um momento tranquilo de um casal e uma cena de perseguição intensa. Ambos os momentos muito bem filmados e intercalados na emoção certa, chega a dar uma angustia positiva. Esse prólogo vai ser o pilar das ações que se seguem. Então há um bom trabalho de instigar (por que chegou naquela situação? Quais serão as consequências?) sem usar artifícios baratos.
Não tarda para a teia da trama ir se desenrolando e termos o contexto daqueles envolvidos. O filme passeia por aquelas figuras e faz um ótimo trabalho de apresentação, sem exposições desnecessárias, sem atrapalhar o ritmo e criando empatia ou antipatia, ou no mínimo colocando uma pulga atrás da orelha do público.
Como há muitos personagens, a coisa por vezes sai um pouco do controle e pode gerar uma certa confusão ou carecer de mais tempo em tela para x ou y. Certas histórias são mais bem desenvolvidas que outras. O destaque vai para Veronica (Viola Davis, que mesmo acomodada na figura que possui é uma excelente atriz, das melhores da atualidade) já que ela movimenta a coisa toda e se articula com as outras mulheres, enquanto tem que lidar com as ameaças que recebe.
Mas o arco mais encorpado é o de Alice (Elizabeth Debicki). Toda vez que o filme caia nela a nota subia. Desde a relação com a mãe, passando pelo jeito que ela tem para ganhar dinheiro até nas soluções encontradas para resolver as tarefas designadas pela Veronica. Já Linda (Michelle Rodriguez) tem uma linearidade que falta um certo tempero. Uma cena que ela visita um senhor foge à curva, porém no todo é a personagem menos atrativa.
Colin Farrell e Robert Duvall dão show como pai e filho políticos. Apesar de beirar a caricatura, a qualidade dos atores e do texto nunca deixam escapar para tal. Ainda no lado masculino, vale o destaque para Daniel Kaluuya (o protagonista de Corra!). Aqui ele mostra novamente competência e versatilidade ao, por exemplo, colocar-se em uma linha oposta do longa que o projetou.
Não só pelo bom uso deste baita elenco (e olha que nem citei todos os nomes aqui), a direção de McQueen é meritosa. Há planos-sequências absurdamente bem feitos e criativos, além de diversas outras cenas destacáveis. Pequenos momentos que valem uma lembrança pós-sessão. Seja no vigor da abertura e em sutilezas como uma corrida de uma personagem, uma fechada de porta ou então um flashback devastador e bem encaixado.
Porém nem tudo são flores. A história se encaminhava quase plena, com alguns percalços de ritmo aqui ou acolá, mas em um nível bem alto ainda, até que um arco é posto e gera uma grande reviravolta. Mesmo sendo de fundamental importância, o jeito abrupto que é colocado e até encerrado torna essa opção quase dispensável. Ao fazer o público cogitar essa retirada de algo tão ligado ao âmago da história é um erro grave de As Viúvas.
Ainda assim, o caminho é tão grandioso, a parte técnica tão precisa e o elenco afiado, que mesmo os pequenos detalhes não mancham por completo.
Ficha técnica:
Direção: Steve McQueen
Roteiro: Steve McQueen, Gillian Flynn
Elenco: Viola Davis, Elizabeth Debicki, Michelle Rodriguez, Colin Farrell, Robert Duvall
Nacionalidade e lançamento: Reino Unido, EUA, 2018 (29 de novembro de 2018 no Brasil)