Aniquilação (Annihilation, 2018) – Original Netflix
Aniquilação tem uma excelente ideia e uma boa execução.
Aniquilação tem vários elementos que o tornam raro. Mesmo sem ser excelente em todos eles, o longa indubitavelmente possui méritos criativos e técnicos.
Baseado em um livro (do qual herda uma herança capitular sem justificativa), o filme traz uma premissa das melhores, sem revelar muito, mas é possível dizer que os conceitos ali vistos geram reflexões para além da sessão. Física, biologia e até o que é o ser humano (ou qualquer outra coisa viva) estão em voga aqui. Você sai do filme pensando: “e se…”. A boa ficção científica traz isso no próprio âmago: projetar uma cenário e desencadear pensamentos sobre o comportamento.
Aqui isso é visto de modo exemplar. Tudo envolto em um mistério perturbador. Logo no começo vemos a nossa protagonista Lena (Natalie Portman) dando um depoimento. Não tarda para percebemos que algo de terrível aconteceu. O filme basicamente é um flashback dessa fala.
A montagem alterna diversas linhas temporais e dá algum “spoiler” do que virá, mas no saldo o resultado é bem positivo. Saltamos de um lado para outro sem ficar cansativo e de um jeito que por mais obscuro que certo momentos pareçam, as transições são límpidas.
Tal movimento possibilita que pistas sejam plantadas (daí o “spoiler” que eu mencionei). Algumas rendem rimas visuais com belos sentidos narrativos – vide o copo que possui dois significados e um deles reverbera de um jeito que poderia ser óbvio, mas a direção de Alex Garland escapa do clichê.
Aliás, a Garland veio de primor logo na estreia na função: Ex Machina, um dos melhores filmes daquele ano. Aqui, em um trabalho um pouco inferior, mas ainda com pinceladas inspiradas. Em ambos o futuro (já presente?) é tratado com um certo olhar crítico e até cru.
E chegamos no ponto mais delicado: boa parte de Aniquilação traz perguntas muito interessantes. As respostas infelizmente deixam a desejar. Um tanto mastigadas (e me estranha tanta gente inquieta com o final, vejo o mesmo problema em mãe!, ou seja: explicações demais e não o oposto), elas perdem viço no terceiro ato. Algumas inclusive soam bem preguiçosas, outras se boicotam ao colocarem a grande “explosão de mentes” momentos antes do necessário.
Outro ponto sensível. O longa na telona poderia ser melhor aproveitado e ao mesmo tempo poderia ter problemas. No quesito sonoro temos algo semelhante ao A Chegada. Os sons são naturais e estranhos. Poderosos ao criar um terror (inclusive em uma cena envolvendo um grito) e essenciais para a condução do todo.
Na parte visual tenho ressalvas. Sim, alguns ambientes são ricos e o design de produção merece os elogios. As plantas em especial também, tal como o som, tem uma proposta basilar aqui. Por outro lado, alguns efeitos ficam muito carregados e denotam uma pobreza que não condiz com o resto da proposta.
O elenco de nomes bem conhecidos (Natalie Portman, Jennifer Jason Leigh, Oscar Isaac, entre outros) entrega um trabalho pra lá de digno. Com caracteres diferentes e que tornam significativos personagens com pouco tempo em tela. Claro que Portman é a que mais tem material circulando em alguns espectros, porém os demais também conseguem se sobressair. Repare como cada um coloca a dor do personagem em tela – acredite não é fácil fazer aquilo.
Se nos dramas temos resoluções mais engajantes (até dava pra dar mais camadas, mas ok…), na ação a coisa é irregular. Há momentos de intensidade, por exemplo quando três personagens estão com movimentos reduzidos (quem viu sabe qual é) ou então na plasticidade do um confronto final. No entanto, no todo não temos grandes momentos nesse sentido – em parte pelo CGI e em parte por uma dinâmica genérica.
Aniquilação talvez seja punido pela ousadia de ser algo grandioso, algo que ele quase conseguiu.