Crítica: O Décimo Homem (2016)
O Décimo Homem não honra a tradição recente de bons/ótimos filmes argentinos
Ficha Técnica:
Direção e roteiro: Daniel Burman
Elenco: Alan Sabbagh, Julieta Zylberberg, Usher Barilka
Nacionalidade e lançamento: Argentina, 2016 (05 de maio de 2016 no Brasil)
Sinopse: Ariel volta ao país de origem (a Argentina) e tem um choque com a cultura local e se envolve em diversas desventuras com o empreendimento “filantrópico” da família.
Recentemente tivemos bons/ótimos longas chegando ao Brasil vindos dos nossos vizinhos argentinos. Só para relembrar alguns: Um Conto Chinês, Relatos Selvagens, O Segredo dos Teus Olhos, O Clã e Trumam.
O Décimo Homem não seguiu a tradição e nos brindou com 1h20 de um roteiro desastroso e um filme vazio, principalmente de sentido. Minha experiência com o longa foi tão desagradável que é difícil extrair algo, para o bem ou para o mal.
Os dois grandes problemas recaem sobre Daniel Burman. Ele acumula funções ao dirigir e assinar o roteiro (prática comum na carreira dele, aliás). Na direção há, por vezes, o uso da câmera na mão para acompanhar o protagonista e causar uma sensação de que nós estamos caminhando junto com ele, mas a tentativa falha. Ela mais cansa do que obtém resultados positivos. Outro ponto negativo são algumas finalizações de cenas focando e se detendo em algo desnecessariamente.
A história poderia ser boa. Ariel, vindos dos EUA, volta para o bairro onde nasceu e foi criado e se relaciona com a família. Esta tem um empreendimento de caridade (que por vezes parece a máfia) com base judaica. Algumas situações remetendo a algo que os irmãos Coen dirigiriam, na linha da comédia de absurdos. O grande problema é que o roteiro aqui não desenvolve a história, ou faz um recorte muito simplório dela. Somos jogados naquele ambiente e temos que nos situar abruptamente. Sou contra histórias que mastigam demais e não deixam o público preencher as lacunas, mas a opção aqui não funciona.
O Ariel tem um que de George Costanza, do seriado Seinfield, até fisicamente ele lembra um pouco. Na personalidade a comparação fica por conta de um certo fracasso que diverte e em como ele não consegue se impor em relação aos demais personagens e acaba ficando passivo em algumas situações ou com diálogos absurdos. O ator, Alan Sabbagh (sim, filme argentino sem o Darín), e o personagem são as melhores coisas aqui. Únicas que valem uma nota positiva.
Uma certa falha de comunicação conduz a história principalmente no que tange à relação de Ariel com o pai Usher. É sintomático que a pessoa com quem Ariel mais dialoga é a “muda” Eva. Enquanto o pai se esquiva dos encontros com ele, Eva mostra-se aos poucos como melhor parceira de Ariel. A ausência do pai é bem marcada em uma cena de flashback, contudo falta uma profundidade maior nesse aspecto.
Ariel é um faz tudo para pai e “se mete em altas aventuras e muitas confusões”, mas sem grandes coesões narrativas. Há todo um arco com um personagem hospitalizado, onde vemos um potencial para uma história crescer, porém só nos é apresentado um grande nada.
Há uma opção de marcar, temporalmente, a evolução do personagem. O artifício simples (e desnecessário) causa uma agonia tamanha que cada passagem de tempo vira um martírio para o público. Incrível como um filme tão curto passa a imagem de tédio de uma forma tão convincente… e com o agravante que o ritmo do longa é acelerado e acontecendo coisas o tempo inteiro, ainda assim a já citada sensação de “nada” impera.
Mesmo estando presente de forma constante, a abordagem fica cada vez mais voltada para a cultura judaica da metade para o final. Só que o jeito como ela foi colocada no roteiro soa artificial e tudo propositalmente confuso. Os personagens são monotônicos e apenas funcionais. O tom superficial da cultura retratada me lembrou muito Casamento Grego, onde tínhamos personagens cuja função era ser grego, sem acrescentar valor ao enredo….
Logo no começo o protagonista exalta a preparação em detrimento ao evento. Em O Décimo Homem podemos até ter tido boas intenções e uma ideia com potencial, mas o evento – no caso o cinematográfico – não se apresentou.