Documentaristas #1: Michael Moore, o outro lado do American Way of Life - Cinem(ação): filmes, podcasts, críticas e tudo sobre cinema
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Documentaristas #1: Michael Moore, o outro lado do American Way of Life

O que faz o cinema ser tão especial? A resposta para essa questão não é simples, mas se tivesse que escolher um ponto de partida para responder, eu escolheria o seguinte: é fascinante a capacidade que o cinema tem de poder se misturar a outras artes e até a áreas diferentes de conhecimento. Como o trabalho do mais perfeito alquimista, o cinema insiste em combinar até com aquilo que deveria ser sua antítese.

Veja o caso dos documentaristas, por exemplo que conseguem casar jornalismo com cinema. Se o cinema trabalha com a perspectiva da fantasia, do lúdico, do ficcional, do poético… o jornalismo é o contrário, pois tem o dever de trabalhar com a verdade e informar a sociedade sobre tudo que a cerca e, se possível, trazer consigo diferentes pontos de vista e cobrar soluções para os problemas.

Um sujeito especial na lista de “alquimistas” da sétima arte é o cineasta americano Michael Moore. Um típico senhor de meia-idade, gordinho e com um andar meio desengonçado que, muito provavelmente, passaria batido numa multidão sem ser percebido. Porém, o mesmo não pode se dizer  de seus filmes que causam sempre repercussão, polêmica e muitas discussões

Moore é o outro lado do aclamado “american way of life”, o estilo de vida norte-americano tão famoso em todo mundo e invejado por muitos, mas que tem algumas falhas estruturais e que o cineasta faz questão de expô-las a todos. A indústria do armamento e sua contribuição para o problema do racismo, a relação da máfia dos planos de saúde com a falta de uma política universal para saúde pública, os grandes lobbys corporativos que influenciam o andar da política e as intervenções americanas em outros países já foram temas de seus filmes e abriram discussões na sociedade americana. Sua narrativa repleta de sarcasmo aliado a um amplo trabalho de pesquisas e dados históricos são características de sua filmografia que já conta com mais de 12 trabalhos.

Indicamos três trabalhos que sintetizam e exemplificam bem o estilo cinematográfico do documentarista Michael Moore.

SiCKO (S.O.S. Saúde)

sicko

Um filme de 2007 que faz uma dura crítica a falta de um sistema público universal de saúde nos Estados Unidos e como os mais desfavorecidos sofrem com isso. SiCKO vai além e mostra as relações perniciosas das grandes empresas de plano de saúde americano com políticos e assim como eles acabam trabalhando em prol dos seus interesses financeiros. Alguns relatos de pessoas que foram abandonadas doentes graças a brechas jurídicas imbuídas nos contratos de prestação de saúde são chocantes até mesmo para nós brasileiros que também temos a questão do problema da saúde em nossa agenda.

Com muito sarcasmo e uma pesquisa apuradíssima, Moore desconstrói o mito perpetuado na mídia norte-americana vindouro da guerra fria de que um sistema de saúde pública é coisa de comunista, que não funciona na prática, que vai contra as liberdades individuais e blá-blá-blá… Para isso, o diretor mostra como funciona o sistema de saúde pública Da Inglaterra, França e do vizinho Canadá onde alguns americanos imigram para buscar tratamento gratuito contra o câncer.

A falta de assistência do Estado Americano a bombeiros que ficaram doentes depois de trabalhar nos atentados terroristas de 11 de Setembro também é abordada e unida a um final que abre um debate interessante sobre o que deve ou não ser prioridade para um Estado.

Bowling in Columbine (Tiros em Columbine)

tiros em columbine

Para boa parte da crítica, essa película de 2002 é a obra-prima de Michael Moore. Tiros em Columbine é o filme mais premiado do cineasta vencendo vários prêmios importantes como Oscar, o Prêmio do Festival de Cannes e o César, Premiação dada pela academia cinematográfica francesa. Usando a tragédia do Massacre do Instituto Columbine (onde 2 adolescentes fuzilaram 13 colegas e feriram outros 21 em 1999) como pontapé inicial, Michael Moore pergunta por quê a sociedade americana é tão violenta.

A resposta para essa equação vem através de muita pesquisa histórica, uma análise perfeita da banalização do sensacionalismo em programas “Padrão Datena” e de uma crítica feroz a falta de um controle do mercado norte-americano de Armas. Mostrando a facilidade que os adolescentes tiveram para comprar as armas do massacre, eles compraram numa rede de hipermercados localizada atrás do Instituto Columbine, Michael Moore vai cobrar os responsáveis “indiretos” pela tragédia.

Excelente filme que conta com animações geniais desenvolvidas pelos criadores da famosa série South Park, os americanos Trey Parker e Matt Stone, que, coincidentemente, estudaram no Instituto Columbine na adolescência e tem uma visão peculiar sobre o incidente. O final apresenta uma entrevista surpreendente com o Ator Charlton Herston (Ben-Hur, Planeta dos Macacos, Os dez mandamentos), Presidente da Associação Nacional do Rifle e defensor da venda indiscriminada de Armas.

Roger and me (Roger e eu)

Roger e eu

A estreia de Moore no mundo dos documentários aconteceu nesse trabalho de 1989. A Montadora GM decidiu fechar uma de suas principais fábricas em Flint, cidade natal do diretor, localizada no estado do Michigan, para construir outra no México onde os salários são bem mais baixos. Mais de 30 mil pessoas foram demitidas de seus postos de trabalho e a pequena cidade vive uma terrível recessão econômica. Michael Moore então decide então tentar encontrar o Presidente da montadora da época, o executivo Roger Smith, para que ele veja com seus próprios olhos os problemas causados pela saída da fábrica.

A caçada ao executivo começa em 1985 e vai até meados de 1988 e durante esse período o filme narra toda a mudança social do outrora pacato lugar, que, com a saída da fábrica, tornou-se a pior cidade americana em nível de qualidade de vida. Em ‘Roger e eu’, vemos um Moore muito menos sarcástico que de costume, porém com a mesma capacidade de encontrar os “personagens” certos para se construir um bom  documentário.

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