The Station Agent (2003)
Artigo

The Station Agent (2003)

03

A solidão é como chuva.

Sobe do mar nas tardes em declínio;
das planícies perdidas na saudade
ela se eleva ao céu, que é seu domínio,
para cair do céu sobre a cidade.

Goteja na hora dúbia quando os becos
anseiam longamente pela aurora,
quando os amantes se abandonam tristes
com a desilusão que a carne chora;
quando os homens, seus ódios sufocando,
num mesmo leito vão deitar-se: é quando
a solidão com os rios vai passando…
(Rainer Maria Rilke)

O que é ser diferente? O que é ser comum, igual, semelhante? Se pertencemos a tribos diferentes das consideradas comuns, se pensamos de forma a não agradar a maioria não pertencemos. Somos como um alvo de difamações, chacotas, desrespeitos, preconceitos e simplesmente por sermos incomuns. O que afeta o ser humano, mesmo que sem demonstrar ressentimentos ou tristezas, acaba permanecendo no interior do ser e não pra quem o vê. Finbar (Peter Dinklage) não é diferente de ninguém, ele sente, ama, entristece, se alegra, ri, chora, ou seja, tem sentimentos, é ser humano, porém, é um anão. Quando o veem ele nunca pertence ao ambiente, sempre é considerado algo e não alguém, mas ele sabe disso, ele se acostumou com essa vida levada pela ignorância alheia. Mesmo tendo seus díspares o amor de um amigo existiu em sua vida, fez com que sua vida tivesse sentido e que o presenteou com uma paixão pessoal: trens. Ao trabalhar numa loja montando trens de brinquedo, se interessou tanto pelo ofício que gradualmente sua paixão pelos modelos foi de um grau a outro em pouco tempo, sua vida ganhou algo novo, algo bom. Contudo com a morte de seu único e querido amigo – Henry Styles (Paul Benjamin), Finbar voltou a ser só. Acabou recebendo uma herança em uma cidade isolada, pois, seu destino era viver em solitude. Ao transformar sua vida ao viver numa estação de trem numa cidade afastada, ele encontrou algo inesperado e algo que jamais imaginara ter após o falecimento da única pessoa que o acolheu: ter amigos novamente. Por mais que tenha sido difícil sair do casulo ao qual se escondeu por toda sua vida, com o tempo, seu sorriso e principalmente seu modo de ser realmente tornaram-se algo sensitivo para àqueles que tiveram o interesse em se aproximar dele, de conhece-lo melhor.
A simples vida de andar pelos trilhos, de sentar-se num banco de praça e observar os trens passando, ler livros sobre trens e ainda o fazê-lo só, com alguma relutância, Joe Oramas (Bobby Cannavale), que é dono de um trailer localizado num local abandonado, acaba se aproximando da vida de Finbar. A solidão de Joe faz com que, agora com a mudança de uma nova pessoa e que vizinha de seu trailer vive só, traz para si uma nova oportunidade de vida, uma nova amizade. Tornam-se parceiros, andam juntos, riem, se divertem, observam os trens, acabam se completando de certa forma. Porém, a região erma e vazia chamada Newfoundland tem mais uma alma que vive na solidão: Olivia Harris (Patricia Clarkson); que deprimida pela perda de seu filho, ainda passa por um divórcio. Olivia vive numa casa grande localizada próxima ao lago da cidade e por viver num local distante, tem que dirigir até o centro. O caminho é lindo, passa ao redor de muitas árvores e foi numa dessas indas e vindas que ela conheceu Finbar, quase o atropelando. O jeito doce, descontraído e muito distraído de Olivia transformam o choque de um quase atropelamento numa relação afetuosa entre os dois. Por saber que vive sozinho numa estação de trem, Olivia tenta se aproximar de sua vida, e surge algo como uma grande amizade, uma nova paixão e os antes sentimentos dispersos e distantes acabam tornando-se mais próximos, mesmo que não houvesse esperança alguma por parte de Finbar em senti-los. O que atrai mais na vida e no jeito de ser de Finbar, é que ele por ser simples e não esperar nada dos outros é íntegro e sincero, tem um olhar honesto e digno de confissão. As pessoas que permitem se aproximar dele acabam dizendo coisas que ele na realidade nunca quis saber, isto é, estar ao seu lado é confortante, é bom, e foi o que aconteceu na relação entre Finbar e Emily (Michelle Williams), uma moça muito bonita que trabalha na livraria da cidade.
O grande triunfo de The Station Agent (2003), dirigido por Thomas McCarthy é trazer à tona as verdades diante dos problemas dos seres humanos e não manter o sexo ou os atos de vontade de cada um serem os pilares e as soluções de suas fraquezas, imperfeições. Ninguém é perfeito, cada um tem seu jeito, seu modo de viver, seu modo de sorrir, de chorar, de fazer amizades. O filme trata de amadurecimento, de respeito, de sinceridade. Além disso, desvenda o ser imperfeito que é o humano, que por sermos adultos ainda o comportamento infantil se mantêm com vida, como no caso de não respeitar um homem baixo e não respeitá-lo como ele é. O riso difamatório e de desinteresse é visto por Finbar como algo que pertence à pessoas que ele não quer perto de si, e isso acontece numa cena linda e muito triste no bar da cidade, onde por perder a paciência ao ouvir grunhidos, risadas abafadas pela música alta, apontamentos, seu desespero raivoso, ao levantar-se na cadeira e gritar “Here I am! Take a look!”, revela sua antipatia pelo desrespeito que tais pessoas têm por ele ser um anão.
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