Crítica: Asteroid City - Festival de Cannes 2023
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Crítica: Asteroid City – Festival de Cannes 2023

Asteroid City – Ficha técnica:
Direção: Wes Anderson
Roteiro: Wes Anderson, Roman Coppola
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2023 (Festival de Cannes)
Sinopse: A convenção Junior Stargazer tem seu itinerário influenciado por eventos globais que mudam o mundo.
Elenco: Jason Schwartzman, Scarlett Johansson, Tom Hanks, Jeffrey Wright, Tilda Swinton, Bryan Cranston, Edward Norton, Adrien Brody, Steve Carell.

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Quando eu comecei a escrever críticas, lembro-me de me questionar em todo texto se a dosagem entre minha opinião, meu lado mais subjetivo, e os comentários sobre os aspectos técnicos, em relação ao que eu estudava diariamente sobre Cinema, estava razoável. Lia e relia com um pensamento em mente que nunca ia embora – e se eu for honesta, nunca foi -, sobre até onde realmente vai a minha opinião, meu gosto pessoal, no momento de propor uma ideia sobre um filme.

A verdade é que hoje, embora sinta que sei bem mais sobre o que uma crítica deve ser (e ter), ainda percebo que essa dosagem é algo que ninguém jamais conseguiu explicar – não importando quão bom fosse o crítico em questão. Se formos ser honestos, ninguém saberá explicar a ciência (se é que existe) por trás de compartilhar e propor uma ideia sobre uma obra a partir da sua própria vivência e relação. A única coisa que nós sabemos com toda certeza, sobre uma crítica, é aquilo que ela jamais será: impessoal.

Em suma, nunca iremos concordar sobre a forma correta de se tecer uma crítica cinematográfica, mas convergimos, não importa a corrente, na convicção de que escrever sobre um filme é o mesmo que aceitar que não há espaço para ser imparcial, pois o ato da escrita é necessariamente antecedido pelo ato de mergulhar em nós mesmos, e retirar desse exercício o que há de mais humano da nossa experiência. Ao publicar, passamos adiante algo pessoal, buscando jogar a discussão para os outros, para quem lê.

Essa ladainha inicial inteira aconteceu para que eu pudesse compartilhar, de antemão, um pouco sobre a minha relação conturbada com Wes Anderson – antes que eu pudesse compartilhar o que penso sobre Asteroid City. Anderson nunca foi um diretor que me conectou com seus filmes. Eu nunca, em toda minha vida até então, saí de um filme do diretor pensando que sua obra me tocou de alguma forma profunda, mudou a minha vida, entrou para uma lista de favoritos – nada do tipo.

Moonrise Kingdom, Grande Hotel Budapeste, Isle of Dogs, Excêntricos Tenenbaums, A Crônica Francesa, nenhum. Nunca encontrei, seja pela maneira engessada de filmar diálogos, pela sua simetria obsessiva ou pelo seu perfeccionismo incontestável, uma brecha de conexão. Seus filmes passam por mim como se fosse apenas mais um trabalho indescritivelmente bem executado, só. Ao final de todos esses filmes, nunca foi uma questão para mim se Anderson era de fato um bom diretor, ele é. Mas sempre foi uma questão para mim porque seus filmes nunca parecem me tocar.

Então, quando eu falo sobre a dificuldade de conciliar minha opinião com o aspecto mais objetivo de uma análise, uma crítica cinematográfica que seja, Wes Anderson é uma personificação desse meu desafio. Eu entendo todo o propósito da forma na construção das suas histórias, dos seus personagens e acho muito interessante até, isso cria uma marca de um cinema de autor, de fato, eu só não acho que seja para mim. E Asteroid City é mais um dos seus filmes onde tudo parece estar no devido lugar, mas minha empolgação ficou de fora da equação.

Para construir seu sci-fi dos anos 50, Anderson tem não apenas ótimas referências, como faz uso da metalinguagem, fazendo cinema e teatro virem um só, em um filme episódico – com direito até a epílogo. Nessa história sobre luto, amor e recomeços, o diretor irá explorar as infinitas possibilidades de um elenco de dar inveja a qualquer cineasta, com Tom Hanks, Edward Norton, Adrien Brody, Steve Carell, Willem Dafoe, Scarlett Johansson e vários outros. Diferentemente de A Crônica Francesa, aqui os personagens estão na história bem mais que as estrelas estão no filme, se é que dá pra me entender.

Ao mesmo tempo, Asteroid City é o filme mais à vontade do diretor, em toda sua carreira. É o primeiro que assisto de Wes Anderson em que todo o perfeccionismo está voltado para satisfazer a forma em si mesma, sem maiores preocupações em desenvolver uma grande história. É a forma sendo utilizada para contar uma história sobre a forma. O que faz sentido, no final das contas, pois inicialmente temos um filme sobre uma peça que, ultimamente irá se tornar, em tela, um filme sobre outro filme – um filme sobre Asteroid City.

Esse é o tipo de brincadeira metalinguística que só funciona no Cinema: esculpir diferentes as dimensões do tempo e do espaço, alterar a noção de palco e transformar tudo, inclusive uma cidade inventada, em algo com vida e com cor, muita cor. De certo modo, Asteroid City me lembra Sapatinhos Vermelhos (1948) ao não reconhecer esses limites e, com o desenvolver do filme, expandir e rompê-los pouco a pouco em tela.

Nesse sentido, eu jamais posso dizer que Asteroid é um filme abaixo da média. Mas, ao mesmo tempo, jamais poderei dizer que foi um trabalho que encheu meus olhos, que me emocionou ou sequer que foi o melhor filme que vi no ano (e estamos em maio, ainda falta muito para o ano terminar). Com cada lançamento do diretor, tenho aprendido a aceitar que sua genialidade talvez nunca me toque, que essa empolgação que os outros parecem ter com o seu trabalho talvez nunca me contagie. Tenho aprendido que gosto pessoal é algo importante, e não anula o ato de reconhecer um bom trabalho quando eu vejo um. Ao fim e ao cabo, ser crítico não é ser imparcial, mas é ser honesto. E eu tentei ser, ao menos nesse texto.

  • Nota
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