Crítica | "Tales from the Loop" e nossa relação com o tempo
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“Tales from the Loop” e nossa relação com o tempo

O ano de 2020 será lembrado para toda a nossa existência como o ano que passamos por uma quarentena forçada por uma terrível pandemia. Lembraremos que tivemos de ficar isolados de nossos amigos e parentes. Vamos olhar para o momento atual como um ponto de virada em nossas vidas, ainda que não saibamos como e nem quando sairemos dessa crise. O fato é que sairemos diferentes, pois já estamos vivenciando uma mudança em alguns comportamentos e nossa relação com o tempo também parece estar mudando. Quantas vezes não imploramos ao além para termos mais tempo pois parecia que as 24 horas diárias já não eram suficientes? Muitos hoje (pelo menos por alguns momentos) já não tem mais essa preocupação, pois a falta de tempo já não é um problema, porém essas mesmas pessoas hoje encontram outra dificuldade – o que fazer com esse tempo?


A ficção científica sempre se valeu da premissa do tempo para explorar diversas facetas do que seria possível fazer quando se há o controle do tempo. O que você faria se pudesse viajar no tempo? O que você mudaria na sua história se pudesse mudar algumas decisões? Outras obras optam pelo controle do tempo presente como “Logan” (2017), “O Homem Bicentenário” (1999) ou “A.I: Inteligência Artificial” (2001) e estudam o como lidamos com a infinitude. Outras buscam uma mescla entre filosofia e ciência na nossa relação com o tempo como foi em “Interestelar” (2014). Já na série original Amazon Prime Video que estreou no Brasil já durante essa crise causada pelo novo coronavírus, “Tales from the Loop”, a premissa busca explorar todas essas facetas da manipulação do espaço / tempo para ressaltar nossa complexa relação com o tempo.


A série, baseada nas pinturas do artista gráfico sueco Simon Stålenhag, é divida em pequenos contos que giram em torno de uma cidade que abriga uma máquina chamada Loop que foi construída para abrir e explorar os mistérios do universo. Em decorrência desses estudos, a cidade passa a apresentar algumas bizarrices que são exploradas nos seus 8 episódios. Em cada conto, somos apresentados a uma problemática que tem como ponto central a relação de seus personagens com o tempo. Por exemplo, no episódio que mais gosto uma jovem descobre como fazer para parar o tempo. Desta forma, ela congela o tempo para poder fazer tudo o que ela sempre quis fazer, porém, só parar o tempo não é suficiente pois temos uma relação muito complexa com o que é finito. Ninguém aprecia um término, mas pensar na eternidade das coisas também tem suas contrariedades.

Umas das pinturas de Simon Stålenhag que inspiraram a série


A séria parte de uma estética steampunk para criar atemporalidade à sua narrativa. A história parece se passar nos anos 80 mas a tecnologia empregada nesses gadgets futuristas que controlam o tempo é uma mescla de passado com presente. Dessa forma, o tempo passa a ser algo intangível, inexplicável e incalculável. Outro episódio que gosto bastante é o do garoto que sofre com uma grande perda e busca de todas as maneira reverter o tempo para trazer a pessoa de volta. Toda a complexidade que a morte traz quando falamos do tempo que passou carrega consigo o peso de não termos passado tempo suficiente com essa pessoa, ou que não tivemos tempo suficiente para que pudéssemos dizer algo que deveria ser dito. Novamente é mais sobre o que fazemos com o tempo do que o termos esse tempo ou não.


A cada episódio somos apresentados a uma problemática que não se soluciona. A série apresenta a questão, desenvolve as causas e efeitos mas não propõe a resposta, o que faz todo o sentido pois um dos elementos basilares da ficção científica é trazer perguntas e não respostas. E se pudéssemos? E se fôssemos? E se existissem?


“Tales from the Loop” propõe refletirmos sobre como pensamos, vivemos e reagimos ao tempo. É uma séria de premissa simples que não perde tempo com teorias e explicações, dando espaço para que reflitamos sobre os temas propostos sem pressa. Talvez esse seja o melhor momento para que nós repensemos nossa relação com tempo.

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