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Crítica: A Última Showgirl

A Última Showgirl
Direção: Gia Coppola
Roteiro: Kate Gersten
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2024
Elenco: Pamela Anderson, Brenda Song, Kiernan Shipka, Dave Bautista, Jamie Lee Curtis, Billie Lourd, Linda Montana, John Clofine.
Sinopse: Acompanhamos a trama de uma experiente dançarina que, aos seus 50 anos, está prestes a encerrar sua carreira de forma abrupta e embarcar para uma nova jornada em seu futuro após 30 anos de exibição nos palcos. Tendo crescido sabendo fazer apenas o que faz de melhor, que é a dança, ela luta constantemente para decidir qual será o próximo passo a ser tomado.

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Pela primeira vez em anos, vemos o retorno da ex-estrela da icônica série S.O.S Malibu (1992-1997), Pamela Anderson, em um papel verdadeiramente dramático e exigente de um potencial performático. Em A Última Showgirl, agora disponível para aluguel digital, Anderson interpreta Shelly Gardner, uma showgirl, em um dos últimos espetáculos à moda antiga de Las Vegas no clube Le Razzle Dazzle, que está com os dias contados. Em torno da despedida do espetáculo, o filme da diretora Gia Coppola, neta de Francis e sobrinha de Sofia, com algum estilo, consegue explorar as dores de Shelly frente à despedida de uma carreira que sempre envolveu brilho, luzes, cores e muito strass. 

O ponto envolvente em A Última Showgirl é seu estilo naturalista, empurrando alguma urgência que nem sempre é sentida. Shelly é uma showgirl que está há 30 anos se apresentando todas as noites, e a notícia do fim do espetáculo cai como uma bomba. A cena de abertura é uma audição propositalmente filmada sem sutileza. A partir dessa entrada nada triunfante, o filme volta para acompanhar as últimas duas semanas de funcionamento do Le Razzle Dazzle. Todo o foco está em Shelly, visto que ela conhece todo aquele lugar e estampa, ainda nos anos 2010 — época em que o filme se passa —, um cartaz de divulgação dos anos 1980. A todo instante, o filme aponta para algumas contradições e eixos deslocados. 

O roteiro de Kate Gersten, aposta no drama tradicional com o aparente intuito de não cair em um melodrama rasteiro e se perder em divagações discursivas. Algumas discussões até poderiam ser empreendidas, mas seriam feitas de forma atropelada e rasa. O drama da protagonista, ainda que simplório, passa pela negação de seu lugar frente àquele tipo de espetáculo, cruelmente marcado por seu envelhecimento; um saudosismo dos tempos em que aquele tipo de show fazia sucesso e ainda era visto como a grande representação de Las Vegas; a tentativa de exercer a maternidade num mercado visto como objetificante e pornográfico, pois nesse espetáculo a semi-nudez é o projeto; e o desamparo afetivo e trabalhista das showgirls. Parece muito assunto para 90 minutos de filme, mas na maioria dos temas tem algum êxito.

O destaque maior acaba sendo para Pamela Anderson que brilha fora do espetáculo, com a cara sempre limpa e com uma desenvoltura surpreendente. Escanteada pela indústria em séries de TV sem grande prestígio ou reduzida a participações especiais em filmes tenebrosos, a atriz finalmente tem, em A Última Showgirl, um espaço para fugir da objetificação de seu corpo como marcador principal de seu sucesso nos anos 1990. O que o filme de Gia Coppola apresenta ao público, é o quanto Pamela Anderson consegue ser mais do que o corpo bonito que toda a indústria reforçava e a audiência lembrava. Essa discussão que atravessa o filme, ecoa também na vida de Anderson.

Além do envelhecimento e a recolocação na indústria por artistas mulheres mais velhas, a fina linha entre o esquecimento e a escalação para papéis secundários ou marcados pela idade, continua sendo um desafio. Conta em desfavor de Pamela Anderson, o vazamento criminoso da sex tape com seu ex-marido, Tommy Lee, retratado na minissérie Pam e Tommy (2022). A objetificação do corpo feminino — algo que S.O.S Malibu foi craque em fazer e boa parte da audiência se concentrava nesse fato —, apesar de mais discutido no entretenimento, ainda tem questões a serem resolvidas. A decisão de Gia Coppola de só mostrar o espetáculo no final do filme, sem a semi-nudez, e como algo lisérgico e idealizado pela própria visão de Shelly, dá a sensação de esperança, mesmo que chegue de forma esvaziada. O mundo daqueles palcos está apenas na boca da protagonista, pois o que interessa a diretora é o camarim e a vida fora do espetáculo. 

Esse movimento talvez explique a decisão questionável da diretora, junto à diretora de fotografia, Autumn Durald Arkapaw — parceira recorrente de Ryan Coogler —, de filmar em película, 16mm, com as cores saturadas, brilhos estourados e obviamente, o granulado. Questionável, pois a câmera na mão, quase documental, sugere o registro da vida fora dos palcos, porém, a confusão do movimento e a própria narrativa nem sempre sugerem essa ideia, tornando tal decisão mais estética do que narrativa. A captura dos coadjuvantes que têm alguma importância na trama — Dave Bautista como Eddie e Jamie Lee Curtis como a melhor amiga Annette —, são feitas de forma altamente protocolar, até quando os atores, em especial Curtis, estão muito à vontade em suas performances.

A Última Showgirl tem momentos interessantes, mesmo jogando no seguro e apresentando um drama sem grandes envolvimentos emocionais. Na direção, Gia Coppola se sai bem na maior parte do tempo, apesar das decisões estéticas não casarem com as decisões narrativas, e a dissonância criada a partir desse descompasso não ser muito agradável. A performance dramática de Pamela Anderson é realmente o bom destaque. É verdade, contudo, que não há grandes variações em sua atuação, tendendo a cair num melodrama fora de tom, como a cena do jantar, por exemplo. Ela, que foi indicada ao Globo de Ouro e (felizmente) perdeu para Fernanda Torres, é uma boa atriz e merece mais do que referências e paródias de seu trabalho eternizado. A Última Showgirl só é o que é, graças ao talento felizmente relembrado de Pamela Anderson.

Nota: 3 /4

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