CRÍTICA: AS TRÊS FILHAS
As Três Filhas – Ficha técnica:
Direção: Azazel Jacobs
Roteiro: Azazel Jacobs
Nacionalidade e Lançamento: Estadus Unidos, 6 de setembro de 2024
Elenco: Carrie Coon, Natasha Lyonne, Elizabeth Olsen, Jovan Adepo, Jay O. Sanders
Sinopse: Em As Três Filhas, dirigido por Azazel Jacobs, três irmãs se reúnem para cuidar do pai em seus últimos dias de vida. À medida que os conflitos familiares e as tensões do passado surgem, elas enfrentam a difícil tarefa de se reconectar e lidar com os sentimentos não resolvidos, enquanto exploram suas diferenças e os laços que ainda as unem. O filme é um drama introspectivo que destaca a força das atuações e a direção habilidosa, mas que esbarra em uma narrativa por vezes repetitiva.
As Três Filhas, filme dirigido e escrito por Azazel Jacobs, acompanha a breve convivência de três irmãs que a muito tempo não se encontravam, mas que devido ao adoecimento do pai, terão que conviver juntas nos últimos dias de vida que restam ao patriarca. Centrado na força dos diálogos e atuações das atrizes principais, Jacobs se esforça para criar um drama robusto e sentimental que funciona até o início do segundo ato, mas que com o passar do tempo, perde força e cai em um sentimentalismo agridoce dependente da boa vontade do texto que nem sempre amarra muito bem suas conclusões e milagrosamente é salvo por excelentes atuações.
As filhas Rachel (Natasha Lyonne), Christina (Elizabeth Olsen) e Katie (Carrie Coon), se reúnem na casa do pai que está prestes a falecer em decorrência de um câncer. Acompanhar os últimos momentos da vida dele é uma tarefa que nenhuma ali desejava. Se reencontrar nessas circunstâncias não era o plano de ninguém. Numa convivência aparentemente harmoniosa nos primeiros momentos, tudo vai por água abaixo quando as verdadeiras rachaduras da composição daquela família vêm à tona.
Dividido em quase arquétipos, As Três Filhas se apoia em recortes de personalidade comuns: a impaciente e distante; a mais calma e voz da razão; a irresponsável – vista aos olhos dos outros – e calada de bom coração. Rachel ainda mora com o pai e faz o papel de cuidadora. Ela também é a irmã adotada do segundo casamento. Christina mora em outro estado, é mãe de primeira viagem e parece apresentar uma vida ótima. Katie mora na mesma cidade, mas em outro bairro, quase não visitava o pai, conflituosa com a filha adolescente e rígida com suas emoções. Apesar da pouca diferença de idade, é possível perceber a distância emocional entre elas e um completo desconhecimento da vida de cada uma.
Muito se baseia, pelo menos no primeiro contato, nas aparências. Há também completa indisposição de saber mais uma da outra, especialmente entre Katie e Rachel. Tudo gira em torno do afastamento e aproximação dessas irmãs em função de um bem comum: acompanhar os últimos momentos de vida do pai. Decisões burocráticas são postas à mesa, cuidados paliativos, o futuro da casa, o destino de cada uma. Jacobs até tenta tirar humor da posição do enfermeiro Angel (Rudy Galvan), responsável pelos cuidados paliativos, só que o efeito demora a aparecer e não passa disso. Uma vez apresentados os conflitos e a compreensão de como a ideia que cada uma tinha da outra era irrisória, pouco sobra para contar.
Azazel Jacobs confia no seu texto que é relativamente interessante. A cadência das emoções e a intensidade dos conflitos são bem estruturadas e respiros comoventes ao longo da rodagem criam espaços curiosos de contemplação. A escolha de deixar o pai fora do campo pelo filme todo e apresentá-lo no final, rende um dos momentos de grande emoção nos pegando de surpresa. Infelizmente não evita o deslize quando se firma demais na repetição de situações de quase conflitos que já foram apresentados e pouco acrescenta na dinâmica de entendimento das irmãs para além dos arquétipos criados. Apesar de sabermos mais da vida de cada filha através de conversas por telefone, é difícil chamar isso de desenvolvimento, pois pouco sabemos das personalidades delas em relação a elas mesmas.
A direção de Jacobs, por outro lado, é bem mais sagaz. Ao utilizar a estrutura arquitetônica da casa para contar mais sobre as personagens e filmá-la de maneira contemplativa e quase participante, escolhendo corredores, cantos e dividindo a tela com as paredes, se cria intimidade e claustrofobia num apartamento que claramente era muito pequeno para três mulheres muito diferentes e que pareciam estar se conhecendo de verdade naquele momento. Hora as paredes são muito grossas e quase impossível de detectar conversas que acontecem do outro lado, hora são finas demais a ponto de escutar coisas que não deveriam ser ditas e muito menos escutadas.
A boa direção da cinematografia aliada a excelentes atuações, salva o filme de ser completamente mediano. Natasha Lyonne, Elizabeth Olsen e Carrie Coon formam um trio deliciosamente bem afinado, cada uma a seu modo, compondo personagens diversas que, no próprio olhar, sabem que são irmãs apesar do abismo afetivo entre elas. Me chamou a atenção a performance de Elizabeth Olsen pelo peso dramático da sua personagem, quase como um pêndulo moral, ao mesmo tempo que transparece certa inocência frente aquela complexa estrutura relacional. Carrie Coon atua mais ou menos no mesmo tom de seus últimos trabalhos, com uma afetação bem acentuada, e Natasha Lyonne brilha mais uma vez com seu olhar melancólico e com a língua repleta de ironias e sarcasmos frente a tristeza que se aproximava.
As Três Filhas é um filme morno e suave. Faz de tudo para não agredir ninguém e parece não se preocupar em agradar demais. Sua história facilmente identificável, empática e em tom teatral, se sustenta mais pela boa escalação do elenco brilhante e de considerável inteligência e sagacidade da direção, do que pelo texto verborrágico e pouco desenvolvido. Isso não quer dizer que o trabalho de Azazel Jacobs seja ruim, está longe disso. Ele sabe muito bem o que está fazendo, parece ter consciência da sua história agridoce e melancólica de separação e reencontro e não parece muito ligado a instabilidades e desafios. Jacobs construiu um filme sólido e sem solavancos, sabendo que as boas emoções numa história calculada e segura, estão na agência interpretativa e confiança de suas atrizes em construir um espetáculo emocionalmente minimalista e comovente, e que no final, mais agrada do que faz torcer o nariz.