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Crítica: Música (2024)

Música
Direção:
Rudy Mancuso
Roteiro: Dan Lagana, Rudy Mancuso
Elenco: Rudy Mancuso, Camila Mendes, Francesca Reale, J. B. Smoove, Camila Senna, Andy Grotelueschen
Sinopse: Um jovem atormentado pela música em sua cabeça precisa lidar com um futuro incerto enquanto equilibra amor, família e cultura brasileira em Newark, Nova Jersey.

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Música, comédia romântica que estreou no Prime Vídeo recentemente, é uma interessante — pelas brincadeiras com a linguagem — e simpática história que acumula algumas inconsistências e talvez inconveniências ao longo de sua jornada autobiográfica. Acompanhamos Rudy, um sujeito que tem uma condição neurológica rara, a sinestesia, na qual todos os sentidos são percebidos simultaneamente. No filme, isso é utilizado como uma eterna percussão, ou seja, todos os sons do ambiente são transformados em percussão musical pelo protagonista. Além de Rudy, que é filho de mãe brasileira, Maria Mancuso, que interpreta ela mesma no filme, temos outra filha de brasileiros, Camila Mendes, do seriado Riverdale. Camila interpreta Isabella, interesse romântico do protagonista.

O filme é uma declarada história autobiográfica pois, em vários momentos, há situações muito específicas que só poderiam ter ocorrido na vida real. Um daqueles casos em que só a realidade é capaz de proporcionar, já que a ficção não alcança tamanho detalhe e espontaneidade da ação. Música está cheio de momentos que proporcionam algumas risadas e economias de tempo sagaz. O conflito cultural de uma mãe brasileira em New Jersey, com um filho que fala inglês e português, e que a todo momento é interrompido por uma mãe preocupada demais, algo bem comum de mães brasileiras. Isso tudo é interessante pois vem acompanhado de um tom novelesco – caracterização muito próxima de uma boa novela das sete – com cores fortes e saturadas, e um tom teatral muito simpático.

Rudy Mancuso é ator, diretor, roteirista, produtor e compositor, ou seja, tem tudo dele nesse filme. Isso é bom pois confere verdade cênica ao projeto, ao mesmo tempo, compromete a espontaneidade, já que tudo está muito seguro, engessado. Apesar de ser um filme de 90 minutos e ter saídas muito eficientes com a montagem, todas as boas ideias parecem muito mornas, sem energia e sem urgência. Talvez por ser seu primeiro trabalho no cinema, e ocupando tantas funções, isso tenha comprometido sua capacidade de relaxar e deixar a história correr o fluxo com mais naturalidade.

Bebendo de fontes muito brasileiras, inclusive nos momentos da percussão, Música é uma comédia romântica clássica, sem grandes novidades. Um adolescente perdido, com um ‘’dom’’ pouco compreensivo para o público comum e que precisa de um empurrão na vida, já que se vê pressionado e não encontra compreensão e incentivo para seguir em frente. Será necessário conseguir um novo amor para que seja empurrado para o próximo passo na vida. É um coming of age com muita referência ao olodum e ao samba carioca e termina por aí. Apesar desses gracejos imprimirem relativa modernidade ao projeto, o resto é uma repetição constante e um drama romântico rocambolesco com cheiro de naftalina para 2024.

Cheio de câmeras com movimento circular e steadicam para todo lado – o que gera um cansaço –, há outras repetições que deixam o filme um tanto estagnado. Todo o dilema do triângulo amoroso é mais longo do que precisava, mesmo encontrando uma saída interessante ao fazer a passagem de tempo com trocas de cenários muito parecido com o que Wes Anderson faz em seus filmes. A finalização com a cena da churrascaria parece querer ser teatral, muito próximo do que tinha sido feito, mas é anticlimática, já que a duração é maior que deveria. Essa falta de timing no tratamento do roteiro, me lembrou, ao contrário, de Tick Tick…Boom! (2021), que conta uma história muito semelhante, só que bem mais ágil, esperto e sabe a hora de se despedir dos dilemas e caminhar para frente.

O primeiro longa de Mancuso carrega algo interessante, é um filme de plataforma de streaming, tem todos os elementos. É pequeno, carregado de charme visual e até animado com suas ideias, mas a falta de tempo para um refino imersivo no roteiro e na direção prejudicam sua vida longa, e a jornada acaba sendo o famoso e temido esquecimento. Isso não tira o charme colorido e novelesco das atuações, nem a qualidade da equipe de arte e da composição musical, apenas se coloca como um filme feito, sem qualquer vida para além da sua duração.

Música tenta se equilibrar entre uma empolgação forte do realizador e protagonista com uma anemia de ritmo que não têm altos nem baixos. É um filme que gasta seu carisma nos minutos iniciais e depois se transforma em algo morno, mas consistente, e escorrega num sentimentalismo insosso. É um filme de principiante com potencial, que as vezes parece um longo vídeo de YouTube com sacadas novelescas — um dos pontos mais interessantes — mas seguro demais para provocar alguma inspiração. De todo modo, é possível ver talento e boas ideias em Mancuso, que é um sujeito muito carismático e esforçado. Talvez com mais tempo de experiência e uma equipe mais próxima para dividir o trabalho, algo mais interessante possa surgir. Esperar os novos capítulos dessa jornada pode ser uma boa ideia.

  • Nota
2.5

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