Anti-heróis: mais reais do que os heróis? - Cinem(ação): filmes, podcasts, críticas e tudo sobre cinema
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Anti-heróis: mais reais do que os heróis?

Recentemente comecei a pensar sobre os  anti-heróis. Por causa disso acabei parando para analisar  como esse tipo de personagem é complexo e, em geral, o público adora. Basta ver como nos últimos anos proliferaram séries com protagonistas de caráter meio duvidoso, mas que não são vilões. São pessoas a quem a gente, como público, até se afeiçoa. O fenômeno de séries como Succession e Euphoria, onde todos os personagens são anti-heróis deixa isso claro.

Lembro que ali no final da infância, lendo Harry Potter, muitos amigos diziam não gostar do Harry. Eu adorava o personagem, mas como todo herói o Harry Potter tem qualidades demais. E isso muitas vezes o afasta da humanidade. A jornada do herói traz personagens que muitas vezes beiram a perfeição e se afastam da humanidade do dia a dia.

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Além disso, vários heróis são tipo os escolhidos. Seres virtuosos com jornadas inspiradoras e maiores que eles mesmos. Nada mais distante da nossa humanidade, sejamos honestos.

Não estou dizendo aqui que não gosto de narrativas de jornada do herói. Eu amo Matrix, só pra exemplificar. A jornada do herói funciona, não dá pra negar. Por isso que a estrutura narrativa é usada até hoje e vai continuar sendo usada. 

Só que a questão é que mesmo funcionando a jornada do herói e toda a sua mensagem moralizante não se aproxima tanto da realidade humana. Nós somos falhos, até demais. Temos bons sentimentos, mas também sentimos inveja, somos mesquinhos e até mesmo um pouco malvados de vez em quando. Nós temos algo de anti-heróis em nós mesmos. Nós somos anti-heróis. 

Pensa comigo. O anti-herói não é um vilão. Ele não faz mal aos outros única e exclusivamente pelo prazer em ver o sofrimento alheio. Ele comete atos duvidosos por pensar em si mesmo; mas mesmo fazendo algumas coisas que a sociedade pode condenar, ele não é necessariamente uma pessoa ruim. 

O anti-herói é ambíguo, cheio de dualidades. Ele tem diversas habilidades, qualidades, mas possui falhas significativas. É por isso que a gente como público consegue se identificar. Porque nós temos nossas habilidades e qualidades, mas também temos grandes falhas. E independente disso nos incomodar ou não, é a verdade de todo ser humano. 

E na época que a gente vive, encontrar personagens que estão mais próximos da gente faz diferença.

Durante anos, na TV, os anti-heróis só eram os homens. Mulheres precisavam performar aquela ideia de feminilidade que foi construída segundo os ideais masculinos. Hoje, com um número maior de criadoras, vejo que já temos várias protagonistas absurdamente falhas. E mesmo que a aceitação não seja completamente igual a aceitação dos homens complicados, essas mulheres são mais próximas de mim e de você.

É importante ver na tela pessoas com falhas mas que conseguem grandes feitos. Óbvio que nas telas, muitas vezes as coisas são um tanto quanto exageradas. Só que é importante perceber que as narrativas abrem mais e mais espaço para as nossas imperfeições, para os nossos problemas, até para as falhas de caráter.

Não é sobre romantizar o que temos de ruim, mas sobre reforçar que no fim do dia a nossa humanidade é falha e não podemos nos livrar disso. Mesmo que façamos o nosso melhor, ainda continuaremos errando. Talvez menos que os nossos personagens favoritos, talvez saber disso nos ajude a conviver melhor com o que não gostamos em nós mesmos.

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