Crítica: Transformers: O Despertar das Feras
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Crítica: Transformers: O Despertar das Feras

Ficha técnica – Transformers: O Despertar das Feras
Direção: Steven Caple Jr.
Roteiro: Joby Harold, Darnell Metayer, Josh Peters, Erich Hoeber, Jon Hoeber
Sinopse: Uma nova ameaça capaz de destruir todo o planeta surge fazendo com que Optimus Prime e os Autobots se unam a uma poderosa facção de Transformers conhecida como Maximals para salvar a Terra.
Elenco: Anthony Ramos, Dominique Fishback, Luna Lauren Velez, Dean Scott Vazquez

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Pensar na lucrativa franquia Transformers no cinema é pensar também em Michael Bay. Mesmo após Bumblebee (2018), reboot que contava uma história menos grandiloquente e mais intimista, a série de filmes ainda permanece associada com as características do cinema de Bay, como sua forma de filmar tudo como se fosse um clímax, os planos curtos numa montagem frenética quase experimental, o pôr do sol constante, a sensação geral de excesso… Existe uma ideia geral meio negativa em torno desses filmes muito por conta dos excessos, mas feita a revisão da carreira de Bay, existe um claro apego a um cinema de atrações que se devota a ação e o espetáculo – muito bem feitos, por sinal – e apenas a eles. Mais do que isso: nesse cinema de excessos, há uma assinatura por trás destes filmes. Bons ou ruins, são filmes de Michael Bay.

A marca do diretor ainda se associa com a franquia, e a falta dessa marca é sentida neste Transformers – O Despertar das Feras, sétimo filme da série que chega sem o fôlego dos anteriores. Enquanto o anterior – o reboot Bumblebee – seguia por um caminho que se aproximava mais do ótimo primeiro filme (Transformers, 2007), contando a história menor de uma garota e seu primeiro carro, o novo capítulo volta aos costumes de uma trama mais apocalíptica de fim do mundo, tendo como vilão um transformer do tamanho de um planeta – Unicron, que teve sua primeira aparição na excelente animação Transformers – O Filme (1986).

Ambientado em 1994, O Despertar das Feras segue o jovem Noah (Anthony Ramos), ex-militar à procura de um emprego, e a pesquisadora de artefatos Elena (Dominique Fishback), inseridos contra a vontade na guerra entre os Autobots – liderados por Optimus Prime na voz de Peter Cullen – e os vilões – desta vez os chamados Terrorcons no lugar dos Decepticons dos filmes anteriores. Outra novidade é a inclusão dos bondosos Maximals, robôs que se transformam em animais robóticos, figuras queridas pelos fãs e introduzidas na série de TV Beast Wars. A trama de perseguição envolve um antigo artefato que, nas mãos dos vilões, pode trazer Unicron à Terra.

Este é o segundo filme de um reboot iniciado em Bumblebee, mas existe um ar de familiaridade em O Despertar das Feras que não faz favores ao filme e segue o caminho da repetição que se empalidece na comparação com os anteriores, como a cena na qual Optimus Prime e os demais Autobots são apresentados a Noah, semelhante ao primeiro filme. Não existe aqui o tom spielbergiano de maravilhamento diante dos robôs se revelando, nem o arrojo visual que Bay trazia. A direção de Steven Caple Jr. (Creed 2) empalidece quando é sentido esse eco dos filmes de Bay, que possuíam mais energia em meio ao caos que promovia. A mão de Caple Jr. é sentida mais nas caracterizações dos anos 90, desde a inclusão de uma trilha sonora repleta de hip hop do estilo Boom Bap, característica da época, à inclusão de televisões de tubo e elementos como a camiseta dos Power Rangers vestida pelo irmão mais novo de Noah.

Conhecida pela sexualização do corpo feminino e a inclusão de robôs que possuíam características estereotipadas de minorias (a dupla de robôs marrentos que falava gírias e possuía dentes de ouro no segundo filme ainda representa um ponto baixo), seria possível dizer que a franquia dá um passo certo em direção ao progresso no fato de o protagonista Noah ser latino, enquanto Elena é preta. A dificuldade do primeiro em conseguir emprego sendo parte de uma minoria poderia ser relacionável, ao passo que a segunda é retratada com a dignidade de não vestir apenas roupas curtas e possuir um físico comum. A sensibilidade que o filme poderia possuir diante dessas escolhas, no entanto, para por aí. Transformers não está preocupado em se adentrar ou discutir as questões de ser mais inclusivo, então temos apenas skins de minorias no lugar dos costumeiros protagonistas brancos. Assim, quando o papel do sabe-tudo universal que auxilia o protagonista com soluções instantâneas coincidentemente fica para um dos únicos personagens pretos da trama, cria-se um incômodo. Os filmes anteriores retratavam estereótipos pretos de forma aberta, mas o novo filme não deixa replicar outro tipo de estereótipo.

A franquia Transformers é baseada em linhas de brinquedos e desenhos animados, e uma característica interessante é ver como a lógica infantil do “brincar com os bonecos” se traduz nestes filmes. Com mocinhos se tornando “do mal” e frases de efeito que parecem saídas da mente de crianças brincando, qualquer um pode morrer e voltar à vida mediante um artefato mágico; através de nomes como “Terrorcons” temos variações de vilões que não são muito diferentes dos Decepticons para além do nome. Sempre há um inimigo maior, mesmo que seja do tamanho de um planeta. Ver essa lógica sendo exercida neste filme sem as várias explicações que tentam racionalizar e justificar esse universo se torna um ponto positivo. Quando Noah e seu irmão caçula se comunicam através de um walkie talkie mesmo que estejam a países de distância, não nos importamos muito com as explicações porque, na lógica do brincar de Transformers, as soluções para o problema se apresentam magicamente quando se precisa, e tá tudo bem. Faz parte da lógica deste universo.

No mais, a familiaridade da trama com os filmes de Bay após Bumblebee apenas traz uma sensação de deja vu que se complica quando percebemos que deveríamos estar diante de um reboot. De quantas formas se consegue inovar numa franquia de brinquedos que se caracteriza justamente por sua natureza episódica, de personagens que possuem sempre a mesma voz nas dublagens icônicas de seus intérpretes fixos, nas intenções de dominações globais sempre parecidas de seus vilões, que sempre voltarão para dominar o mundo?

Transformers – O Despertar das Feras tenta trazer essa novidade nas mudanças de skins: os protagonistas humanos vêm agora numa “roupagem” mais inclusiva, mas suas papeis dentro da trama são os mesmos; temos agora robôs que viram animais e vilões de facções diferentes, mas a dinâmica também é a mesma dos Autobots e Decepticons nos filmes anteriores; o nome do artefato no qual o destino do mundo depende é diferente, mas a função é a mesma. A mudança de skin que significa algo de fato é a de seu diretor. A direção de Steven Caple Jr. é burocrática e não traz à narrativa a mesma energia que Michael Bay, e essa comparação só vem por causa das semelhanças que o novo filme possui com os anteriores. Nessas semelhanças, existe a também a sensação de que estamos acompanhando a mente de uma criança enquanto brinca com seus bonecos. A criança desta vez, porém, não possui a hiperatividade e imaginação da primeira para que essa brincadeira se torne mais do que um exercício um tanto tedioso de repetições, mesmo que ela prometa trazer os bonequinhos de outra franquia para a brincadeira, como prometido pela cena final.

  • Nota
2

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