Logan Roy: O Retorno de Succession
Artigo

O Retorno de Succession

O primeiro episódio da última temporada de Succession trouxe uma sensação diferente consigo, especialmente sobre Logan Roy. Enquanto nas últimas temporadas não víamos o todo-poderoso da família perder sua postura narcísica com facilidade, mesmo diante das mais extremas adversidades e conflitos que poderiam lhe levar a isso, logo nesse início da quarta temporada a força gravitacional de Logan parece estar se quebrando aos poucos e abrindo espaço para a total introspecção e autodepreciação, com direito a papos depressivos e existenciais com o próprio guarda-costas e um convite para seus próprios funcionários lhe alfinetarem em forma de piada.

A ausência dos filhos em seu aniversário e a traição de Kendall, Roman e Shiv ao fazerem um acordo que ele almejava com os Pierce antes do próprio Logan, atingiu o pai mais do que a gente pensava. A piada de Greg, por exemplo, acabou se mostrando como uma faca na ferida aberta sobre os herdeiros e o futuro da Waystar Royco. Esse foi o primeiro aniversário do pai em que os filhos não estavam presentes, reforçando para todos, especialmente para a imprensa, que a relação da família estaria abalada – um medo sabido de Logan, que sempre prezou por manter a imagem de união em prol do fortalecimento do negócio familiar. Desde a primeira temporada é clara a intenção de que Logan gostaria que o negócio ficasse entre os filhos, nunca foi um desejo dele, por mais que às vezes Logan tenha pressionado isso, que os filhos se separassem do ideal de servir ao negócio de família. O maior pesadelo pai, sem dúvidas, sempre foi perder vantagem e prestígio e, depois disso, se ver obrigado a abrir mão da possibilidade de passar seu legado para os filhos.

A verdade pra mim, que permanece até hoje, é que Logan de fato preferiria que Kendall Roy assumisse o seu legado, mas acha que o filho é muito fraco ou não se parece o suficiente com ele para manter o nome e a relevância do conglomerado bilionário. Por ser narcisista e egocêntrico, Logan prefere que Kendall seja submisso aos interesses do seu jogo mental enquanto viver, forçando o filho a adquirir uma mentalidade menos enviesada e mais próxima do conservadorismo. Por não conseguir mais controlar nem Kendall, nem os outros filhos, Logan vai se fechando em seu casco e se tornando o mais hostil, arrogante e desesperançoso que pode. Algo que veremos bastante no decorrer dos próximos episódios, eu acredito, começando pela última cena desse mesmo episódio.

Enquanto o chefe da família desmorona na nossa frente, Shiv e Tom têm seu momento Cenas de Um Casamento ao final do episódio que irá, a priori, concluir o que ficou em aberto da cena final do último episódio da temporada anterior. Finalmente temos uma resposta sobre como o relacionamento dos dois ficou, o que não sabemos ainda é como a relação de Tom com Logan irá ser afetada após o divórcio – embora Tom tente prever seu futuro em uma conversa que acaba sem resposta. A carga dramática do diálogo dos dois sobre o fim inevitável do relacionamento provocou sentimentos novos em quem assistia essa cena melancólica e evocou dúvidas sobre como a dinâmica dos dois deveria (ou não) se suceder. É um ponto pra ficar de olho nos próximos episódios.

Outro ponto que vale a pena trazer sobre o último episódio é a evolução de Greg enquanto um sujeito que cresceu de babaca submisso para um babaca supremo. Não é de hoje que a gente levanta a possibilidade de que o personagem seja muito mais do que a gente pensa, se mostrando um futuro herdeiro da empresa em potencial. Não seria a primeira vez que um “outsider” tomaria o poder do controle da narrativa, já vimos isso acontecer na maior paródia dos ricos do Upper East Side que existe, que é Gossip Girl. Faz sentido que alguém que passou 3 temporadas “comendo pelas beiradas” finalmente se revoltasse com tamanha humilhação e passasse a querer finalmente incorporar seu local dentro do sistema, eventualmente se tornando tão opressor quanto os outros. Afinal, a série se inicia apenas quando a perspectiva de Greg existe. No fundo, ele representa a gente: o espectador que tudo observa, mas que nada pode fazer diante do que tem conhecimento.

Ao meu ver, o único núcleo que parece não se mover suficientemente rápido na série em relação aos demais, é o de Connor e Willa. Tudo ali desde a temporada anterior parece não funcionar nem para adicionar à narrativa, nem para servir de alívio cômico. Com exceção das cenas em que Connor se mostra completamente incompetente e delirante achando que vai conseguir o cargo de homem mais poderoso do mundo, ou quando pede Willa em casamento de forma constrangedora, o irmão mais velho não se posiciona o suficiente nunca e seu arco parece nunca evoluir dentro da narrativa. Espero que, ainda nessa temporada, Connor acorde da mesma forma que na cena da intervenção que os irmãos tentam fazer com Kendall na Itália. Precisamos do Connor com o ódio na medida certa, seja a favor ou contra Logan Roy.

Isso porque, com Connor se tornando algo mais que uma piada de mau gosto, existe a possibilidade de equilibrar forças com Greg e Tom, tornando a quarta temporada uma espécie de time A contra o time B, com Logan bem ao centro da dinâmica divisiva da narrativa. O que reforça assim a semiótica presente no próprio pôster liberado para a última temporada – os quais são famosos por conter uma série de “pistas” acerca do desenrolar da história nas temporadas anteriores. Faria sentido uma ruptura significativa, ao mesmo tempo que seria difícil justificar alguma motivação para isso além dos interesses próprios de cada personagem os quais sempre parecem os mais egoístas e nefastos possíveis, o que inevitavelmente ao final ainda terminaria em conflito.

Fato é que o primeiro episódio consegue ser mais que satisfatório ao dar conclusão ao que precisava ser concluído (o arco Shiv e Tom), ao iniciar a série com novas motivações tanto para Kendall, Shiv e Roman quanto para Logan, e ainda usar o retorno dos Pierce como chave central do conflito entre gigantes. Algo da segunda temporada retorna para a quarta e última mais vivo que nunca: o desmoronamento de uma família é o lucro e o entretenimento de outra família, mostrando que o ciclo não se encerra no coração do capitalismo e que o dinheiro que faz o mundo continuar girando. É perceber o mundo, as relações familiares e as pessoas como verdadeiras unidades econômicas atuando juntas em um grande mercado.

Tudo permanece tão clássico quanto um romance Shakespeariano, mas tão ultramoderno quanto um mundo corporativo multibilionário. O conflito geracional e familiar de Succession volta de forma triunfal, conseguindo inclusive deixar uma negociação de alguns bilhões entre telefonemas e diálogos intensos, algo interessante, apreensivo e nervoso de se ver, surpreendentemente (mas não tão surpreendente assim, é claro) genial. O melhor que tem na TV atual, está realmente de volta.

Deixe seu comentário