Crítica: Aftersun – 46ª Mostra de São Paulo
Aftersun – Ficha técnica:
Direção: Charlotte Wells
Roteiro: Charlotte Wells
Nacionalidade e Lançamento: Reino Unido, Estados Unidos, 2022 (46ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Sophie reflete sobre a alegria compartilhada e a melancolia particular de um feriado que passou com seu pai vinte anos atrás. Memórias reais e imaginárias preenchem lacunas entre as filmagens em miniDV enquanto ela tenta reconciliar o pai que conheceu com o homem que não conhecia.
Elenco: Paul Mescal, Frankie Corio, Celia Rowlson-Hall.
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Sophie (Frankie Corio) de 11 anos faz uma viagem de verão pra Turquia com o seu pai Calum (Paul Mescal), um homem jovem que está divorciado da sua mãe. É uma viagem como qualquer outra. Eles são um pai e uma filha também como qualquer outro casal de pai e filha. O que é tão único na forma que eles são retratados está no cuidado em perceber o que compõe essa viagem, um momento de vida especifico, uma idade especifica e como dividir ela com alguém que você ama em sentimentos que quase não surgem em palavras e sim em situações, gestos e principalmente imagens.
Essa viagem acaba sendo dividida em duas partes: o que esses personagens vivenciam externamente, que geralmente é algo comum e introspectivo, e o que eles estão vivendo internamente que é uma avalanche de inseguranças, descobertas, desejos, tensões do crescimento, da idade, depressão e ansiedade que possam passar rapidamente despercebidas, mas que estão lá sendo vividas e põem ser percebidas quando se para ou pouco para pensar sobre elas, relembrar e refletir.
E aí que entra novamente essa atenção gigante que o filme tem para imagens guardadas e registradas em câmeras, fotos e aparelhos de televisão. Como numa cena que ao invés de filmar Sophie e Calum conversando numa mesa, a câmera filma fixamente a foto de ambos que está em cima da mesa e só ouvimos a voz de ambos. São imagens guardadas numa memória que parece tão cristalina, de sentimentos tão cristalinos, mas já está muito distante também. Impressionante como é boa a decupagem da Charlotte Wells em criar planos que conversam tão bem entre si, nas escolhas extremamente inteligentes que toma em como filmar os seus protagonistas e são essas escolhas que vão se revelando tão imersivos dentro daquela viagem para chegar no momento em que um movimento de câmera e um jogo da montagem fecham a união entre os dois protagonistas do filme.
Temos Sophie e Calum filmados em conjunto em planos que o dividem, os separam no mesmo local e que em planos abertos mostram como eles são pequenos perto daquele local. Uma atenção total para a proximidade e separação dos seus corpos em uma cena chave do filme. Até finalmente na forma imagética de um pai ali presente, mas que pode desaparecer a qualquer momento na natureza, na dança ou passando por uma porta num plano geral que vai se fechando e se distanciando lentamente ao conversar lá no fundo com um plano anterior do filme. E uma filha. Que enquanto se descobre, vive e observa. Observa esse homem transformado em carne, osso e imagem. Por isso o ato final do filme é algo tão poderoso. Com algumas das imagens mais belas do ano.