Crítica: That Kind of Summer – 46ª Mostra de São Paulo
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Crítica: That Kind of Summer – 46ª Mostra de São Paulo

That Kind of Summer – Ficha técnica:
Direção: Denis Côté
Roteiro: Denis Côté
Nacionalidade e Lançamento: Canadá, 2022 (46ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Convidadas a uma casa de repouso para explorarem seus desejos sexuais, três mulheres passam dias e noites tentando dominar seus conflitos internos. Sob a supervisão amigável de uma terapeuta alemã e de um esforçado assistente social, o grupo tenta manter um equilíbrio delicado.
Elenco: Larissa Corriveau, Aude Mathieu, Laure Giappiconi, Anne Ratte Polle, Samir Guesmi, Josée Deschênes.

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“Vocês não estão doentes”, diz a psicóloga que apresenta o projeto às participantes. A frase é um ótimo ponto de partida para a premissa de “That Kind of Summer”, novo filme do cineasta canadense Denis Côté. O que veremos a seguir é um estudo de personagens complexos sem qualquer tipo de julgamento.

Nos primeiros minutos, Côté abusa dos closes nos participantes da conversa, criando um mistério que evoca sensualidade e sedução. Não é difícil imaginar que “That Kind of Summer” vai se tornar um jogo de sedução, mas o filme vai além dessa simplicidade.

Na trama, três mulheres hipersexuais participam de um retiro que tem o objetivo de funcionar como terapia para seus impulsos, além de material de estudo para a pesquisadora Octavia – substituta da criadora do projeto. O diretor não se furta em utilizar a câmera como elemento para observar as relações dos personagens como um constante flerte – entre as pesquisadoras, entre uma das participantes e o ajudante, e curiosamente, nunca entre as participantes.

Mas essa atmosfera de flerte não dura muito tempo. O filme vai nos permitindo conhecer um pouco de cada uma das personagens, seus medos, suas histórias e suas experiências – incluindo Octavia e Sami, que estão lá para guiá-las. Aos poucos, vamos percebendo um pouco mais das questões que as envolvem – e as atuações de Larissa Corriveau, Aude Mathieu e Laure Giappiconi estão todas em alto nível.

A relação problemática das personagens com o sexo vem por meio dos discursos. Descrições de abusos e de momentos tóxicos confundidos com prazer são descritos com tamanha eficiência que o filme se torna “pesado” sem precisar de imagens fortes. Pelo contrário: as poucas cenas de nudez são naturais e mostradas com certa leveza.

No dia de “folga” das personagens, em que elas são livres para sair e fazer o que quiser (e até mesmo dar vazão ao desejo sexual latente, já que o objetivo do projeto não é impedi-las de nada) vemos os vislumbres daquilo que elas mais buscam: a aceitação e o carinho. Enquanto uma pede para o “namorado” ser menos violento, outra quer dormir na cama com o parceiro (e se decepciona ao saber que dormirá no sofá).

Em certo momento de “That Kind of Summer”, a personagem Geisha (Mathieu) questiona: “qual o problema de querer trepar a vida toda?”. De fato, o problema não está no sexo em si, mas em evitar que o desejo domine todas as partes da vida.

No fim das contas, a personagem mais transformada pelo verão é a própria terapeuta, que consegue romper o relacionamento em que se encontrava. No fim, as superações e transformações das personagens são sutis e subjacentes – podemos imaginar e sentir, mas sabemos que não é “um verão como esse” (como seria a tradução literal do título em francês) que vai causar tantas mudanças. Afinal, se ninguém está doente, não é preciso buscar uma cura. São apenas personagens vivendo com suas cicatrizes, não em constante fluxo como um rio, mas placidamente, como um lago.

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