A recuperação do audiovisual europeu e seus incentivos
A pandemia de COVID-19 ainda é um tema relevante para o mundo. Com as notícias de novas variantes circulando e a baixa adesão da população europeia aos imunizantes, o audiovisual ainda é um setor colapsado pela doença.
Mesmo com a reabertura das salas de cinema e retorno mais evidente de filmagens, o continente europeu teve que buscar ajuda estatal para conseguir manter suas portas abertas e ainda contratando mão-de-obra.
Essa não é bem uma novidade, visto que os incentivos públicos para a cultura existem há mais de 50 anos em países como a França e a Itália, por exemplo. No entanto, a pandemia floresceu uma discussão quanto ao papel do Estado no fomento da indústria.
A pandemia certamente acelerou alguns processos de convergência que já estávamos acompanhando. O crescimento astronômico das plataformas de streaming fez com que esses serviços brigassem por um protagonismo mais relevante nas hierarquias de janelas de lançamento.
Mas, embora queiram predominar como o futuro do audiovisual, o streaming ainda é bastante relutante para pagar os mesmos valores que a TV europeia paga para receber o conteúdo vindo diretamente dos cinemas.
Na briga de leões –– que ainda não tem data para terminar –– entram novas exigências e regulamentações que as plataformas precisam cumprir: uma guinada da União Europeia para garantir seu protagonismo aos novos tempos audiovisuais.
Dessa forma, países como Espanha, Alemanha e principalmente a França já mergulharam de cabeça nas suas cobranças de investimento por parte desses operadores.
No ano passado, abordei sobre como o streaming conseguiu bater €1 bilhão somente na Alemanha, país em que a contribuição das plataformas bate apenas 2% de imposto devido ao Fundo Audiovisual Alemão, o famoso FFA (Filmförderungsanstalt).
Essa cobrança ainda quase inédita, permitiu que a Alemanha pudesse gerar subsídios importantes para a preservação dos empregos no setor, bem como para não perder também seus próximos investimentos.
O que antes parecia algo inédito e bastante insuperável, passou a ser uma cota bastante reduzida. Em 2021, a França regulou e já determina que o streaming não só pague entre 20% e 25% para fomentar obras audiovisuais francesas diretamente, mas também destine 5% dessa receita comercial anual para o órgão competente da atividade audiovisual (Centre National du Cinéma et de L’image Animée).
Parte dessa “proteção exacerbada” está na preocupação em se preservar as salas de cinema do país, principalmente depois que a pandemia moldou um olhar mais reservado para esse consumo em casa.
Além disso, a preocupação do setor francês para os próximos anos é a garantia de que o seu cineasta independente tenha a possibilidade de acessar espaços maiores e consiga se manter trabalhando. O que está em jogo não é uma “liberdade”, mas sim a continuidade da economia criativa, sempre tida como a economia do futuro.
Mesmo sem fazer parte a União Europeia, o Reino Unido também entrou na jogada pelos apoios públicos para preservar o espaço audiovisual. Com uma estimativa de perda em £2 bilhões no parque exibidor, o governo britânico liberou um fundo de apoio de £7 milhões.
A expectativa é que o país termine 2021 com uma receita entre £600 e £900 milhões. Embora esteja um pouco longe de atingir a normalidade, o crescimento é encarado com bastante otimismo. Na zona do euro, a agenda do parlamento europeu ainda espera as novas normativas da Itália para a regulamentação do streaming cujo prazo inicial foi até o final de 2020.
Na esteira das expectativas, o país que já levou o título por sua política “anti Netflix”, deve aprovar obrigatoriedades parecidas com as da França, principalmente pelo recente mal-estar causado pela plataforma ao reduzir as cópias do novo filme do Paolo Sorrentino nas salas de cinema do país (*imagem acima).
O futuro reserva políticas de proteção do espaço físico e reserva de mercado aos grandes novos players da indústria. Um caminho parecido com esse poderia devolver valor ao audiovisual brasileiro, bem como ajudar na recuperação econômica de um país colapsado por políticas ignorantes.