Crítica: Pedregulhos – 45ª Mostra de São Paulo
Pedregulhos – Ficha técnica:
Direção: P.S. Vinothraj
Roteiro: P.S. Vinothraj
Nacionalidade e Lançamento: Índia, 2021 (45ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: No sul da Índia, na região onde reside o grupo étnico tâmiles, vive Ganapathy, um homem pobre e alcoólatra e que é movido por um sentimento de raiva inesgotável. Ele embarca com o filho pequeno para tentar reencontrar a esposa, que o deixou em virtude de seu comportamento abusivo e voltou ao vilarejo de sua família.
Elenco: Karuththadaiyaan, Chella Pandi.
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Presente na Competição de Novos Diretores da 45ª Mostra de São Paulo, o filme “Pedregulhos” me fez lembrar o excelente filme sérvio “Pai”, exibido na Mostra do ano passado, especialmente pelos contrastes o filme indiano carrega. Ainda que ambos tenham a figura paterna, aqui violenta e disfuncional, o filme de estreia do cineasta P.S. Vinothraj se preocupa com o ponto de vista do filho, mesmo que alternando as histórias e mostrando até mesmo personagens que tangenciam a trama principal.
Na história, acompanhamos um pai pobre e alcoólatra que parte com seu filho ao vilarejo vizinho em busca da esposa, que o abandonou devido ao seu comportamento. O que se segue é um “quase road movie” no qual vamos entendendo a realidade dos personagens e os sentimentos do menino.
Em diversos momentos, P.S. Vinothraj opta por tomadas com uma grande angular para evidenciar a distância dos personagens e até mesmo a solidão e pequenez deles em meio ao cenário árido da região. O filme também dá intensidade a diversos momentos de caminhada, em que a câmera se volta ao rosto dos personagens, sem nunca abandonar totalmente o ambiente.
Ambientação, aliás, é um elemento importante em “Pedregulhos”, já que o filme se demora em determinados momentos a mostrar outros personagens, como a mãe sozinha com um bebê ou a família que caça ratos para comer – e a cena da menina feliz com as sementes da árvore é particularmente especial.
Centrado nos homens, “Pedregulhos” também não se preocupa em mostrar a personagem que os dois procuram. Temos, assim, o embate entre duas gerações: a do adulto que responde à dureza da vida com brutalidade, e a do menino que encontra doçura nos brinquedos, no cãozinho e até mesmo nas pedras que intitulam o filme. Enquanto o pai briga com o cunhado, a câmera se demora na reação do pequeno, como se nos permitindo imaginar a mistura de sentimentos que estão ocorrendo. Há doçura até mesmo no olhar para o avião, símbolo da liberdade e dos sonhos do garoto, que é tolhido imediatamente pela violência do pai – em um tipo de filmagem que se repete no longa, com a câmera fugidia a circundar a cena.
Mas são os pedregulhos do título que trazem consigo o símbolo de como se pode lidar com os sofrimentos da vida. Podemos interpretar que as próprias crianças são esses pedregulhos, ainda a serem lapidados. E da mesma forma que podem machucar, essas pedras também podem simbolizar os golpes que recebemos, acumulados depois de terem sido absorvidos, como se processados e regurgitados.
“Pedregulhos” funciona como uma crônica indiana sobre as mudanças nas relações e na forma como as mulheres reagem aos homens truculentos. E certamente a maneira sensível com que Vinothraj filma torna tudo mais completo: temos o homem em seu ambiente e com seus sentimentos, formando a complexa tessitura que nos faz humanos.