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Crítica: Destacamento Blood (2020)

O ano de 2020 prometia ser recheado de novidades na indústria cinematográfica. As expectativas eram grandes em relação a diversos lançamentos que estavam programados. Entretanto, fomos impedidos de conferir essas novas produções nas salas de cinema e nós brasileiros não temos ideia de quando poderemos voltar a prestigiar um longa-metragem nas telonas.

Felizmente o cineasta Spike Lee, em parceria com a Netflix, nos proporcionou um suspiro de alivio em meio as fracas produções, que mesmo com a quarentena continuam a estrear nos streamings. Chegou a plataforma no dia 12 de junho o longa Destacamento Blood (Da 5 Bloods). O elenco do filme conta com Chadwick Boseman, Jonathan Majors, Delroy Lindo, Clarke Peters, Norm Lewis, Isiah Whitlock Jr., Jean Reno, Paul Walter Hauser e Mélanie Thierry.

Na trama acompanhamos quatro afro-americanos, veteranos de guerra, que decidem voltar ao Vietnã, após décadas do conflito para procurar os restos mortais de capitão. O grupo aproveita a viagem para encontrar um carregamento de ouro enterrado próximo do local onde o comandante do destacamento morreu em combate. O que parecia ser uma simples missão honrosa entre velhos amigos vai ganhando contornos quando os personagens se deparam com os cenários de seus maiores pesadelos. Aos poucos o grupo começa a reviver e confrontar os estragos da Guerra do Vietnã em suas vidas.

Se você ainda não assistiu o filme e está lendo esta crítica, saiba este não é apenas mais um filme sobre a Guerra do Vietnã. Em Deatacamento Blood, Spike Lee consegue mais uma vez nos tira da zona de conforto e nos apresenta a guerra pelo olhar dos soldados negros, enviados para uma guerra por “liberdade”, enquanto os próprios afro-americanos lutavam por seus direitos e sua liberdade nos EUA.

Essa nova perspectiva é fundamental para conhecer o outro lado da história americana. O cineasta expõe como os primeiros movimentos de luta pelos direitos dos negros impactou a vida dos afro-americanos que lutavam na guerra. O filme nos convida a refletir a cerca da contrariedade das justificativas de uma guerra pela libertação do Vietnã do comunismo, enquanto os próprios soldados afro-americanos, sem liberdade alguma em seu território, eram enviados para a linha de frente do conflito para morrer.

Spike Lee como sempre é didático e insere no decorrer do filme fotos de personalidades negras, como Dr. Martin Luther King Jr., um dos maiores ativistas negros e crítico assíduo da Guerra do Vietnã, o qual inclusive foi assassinado. Essas inserções na edição podem gerar críticas dos mais perfeccionistas, por talvez haver um certo descompromisso de Spike Lee com a montagem do filme. Contudo, é evidente que ele não está preocupado com isso. Ele sabe o que está fazendo e o faz muito bem.

Como de praxe suas obras são repletas de críticas ao governo norte-americano. E mesmo abordando uma guerra da década de 1960, Spike Lee consegue fazer um ótimo paralelo com o momento atual vivido e o movimento Vidas Negras Importam.

Destacamento Blood não procura nos apresentar como foi todo o conflito, mas uma história pouco conhecida pela sociedade. Essa preocupação em focar apenas nesse aspecto da história, acaba, de certa forma, reforçando o negacionismo norte-americano sobre fatos importantes. Primeiro, os Estados Unidos foram responsáveis por verdadeiros massacres. Foram mais de 1,1 milhão de vietnamitas mortos, alguns apontam que o número supera 3 milhões. Além disso, EUA foram responsáveis por envenenar o solo vietnamita, destruindo plantações agrícolas e florestas. Danos que são sentidos até hoje no Vietnã.

Porém o fato principal desta história é que, a Guerra do Vietnã foi um verdadeiro desastre para os norte-americanos, os quais perderam a guerra. Não estou querendo dizer que o Skipe Lee “passa pano” para os crimes norte-americanos, mas a crítica ou exposição do fato é quase mínima, inserida em pequenos comentários sobre os filmes do Rambo, por exemplo.

Tirando esse detalhe, Destacamento Blood mantém o nível das ótimas obras de Spike Lee. Com duração de 2h30 o filme não é cansativo, mas tem alguns elementos e personagens que agregam a narrativa. Infelizmente o roteiro não consegue se aprofundar na história de todos os ex-combatentes, e apenas Paul (Delroy Lindo) e Otis (Clarke Peters) ganham mais tempo de tela, e desenvolvem um conflito interno no decorrer da trama. Entre as atuações o destaque vai para Delroy Lindo, que entrega uma excelente atuação, com dois monólogos emocionantes. Espero que seja lembrado na temporada de premiações.

Na parte técnica, a fotografia de Newton Thomas Sigel, aliada a edição de Adam Gough merecem aplausos. As cenas de flashbacks conseguem transmitir a ideia de que as imagens são antigas. Já a trilha sonora, produzida por Terence Blanchard, é precisa e envolvente, dando o tom aventuresco da história. Outro aspecto interessante é as referências a Apocalypse Now, um dos maiores filmes de Guerra, de Francis Ford Coppola.

Em suma, Destacamento Blood é um bom filme, com um roteiro bem construído, apesar de pequenos excessos. Repleto de críticas políticas, característicos de Spike Lee, o longa ganha forma aliado ao bom elenco e trabalho de som e fotografia. O resultado é um convite ao debate a reflexão sobre assuntos como direitos civis dos afro-americanos e as consequências dos horrores da guerra.

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