Crítica: Indústria Americana (2019)
Era 2008, ano do epicentro de uma das maiores crises econômicas da história dos Estados Unidos, que afetou milhares de pessoas em todo mundo. A maior potência global enfrentava sérios problemas financeiros, e claro, sua população foi uma das principais atingidas. Naquele ano, a fábrica de carros da General Motors, no Estado americano de Ohio, teve que fechar suas portas causando a demissão de mais de dez mil funcionários.
Do outro lado do globo, a China se consolidava como a segunda maior potência econômica mundial, ameaçando a hegemonia norte-americana. Alguns anos depois, uma empresa chinesa buscando expandir seus domínios decide investir cerca de 500 milhões para abrir na antiga fábrica da GM uma filial da chinesa Fuyao nos EUA, dando esperanças para a população local, que enfrentava sérios problemas financeiros devido à crise.
Assim somos inseridos na narrativa documental de Indústria Americana (American Factory), longa-metragem da Netflix indicado ao Oscar de Melhor Documentário. Dirigido por Steven Bognar e Julia Reichert, e distribuído pela Higher Ground, produtora criada pelo casal Michelle e Barack Obama, o documentário acompanha o processo de estruturação e abertura de uma empresa chinesa fabricante de vidros automotivos no EUA.
As gravações que tiveram início em meados de 2015 e se estenderam até 2018, segue a rotina diária de funcionários do mais alto escalão da empresa, como o fundador da Fuyao, até os cargos mais baixos. O espectador é apresentado a diversas narrativas, entre elas, a dos americanos, que trabalhavam na GM e agora foram contratados pela empresa chinesa. Do outro lado vemos a perspectiva dos chineses que se mudaram para os EUA para auxiliar na estruturação da empresa e precisam se adaptar ao modo de vida ocidental.
Após assistir cerca de vinte minutos de, um longa de quase duas horas, acreditei que a história apresentada se tornaria enfadonha e tediosa. “É só isso? Vou ver duas horas de homens chineses tentando abrir uma empresa nos EUA e suas dificuldades?”, eu estava enganado.
Em Indústria Americana os documentaristas trazem uma reflexão a cerca da precarização do trabalho em meio ao capitalismo selvagem. Aos poucos somos apresentados a antigos funcionários da GM, que com o fechamento da fábrica perderam sua renda e seus bens como casa e carro. Pessoas que perderam tudo e viram na empresa chinesa uma esperança para se reerguer e reconquistar sua antiga vida.
As dificuldades também atingem os chineses que saem de seu país para trabalhar nos Estados Unidos, tendo que deixar suas famílias por cerca de dois anos, enfrentando dificuldades para se adaptar a cultura norte-americana. Aos poucos os conflitos culturais tomam conta da narrativa. O estilo americano de trabalhar não condiz com a forma que os chineses veem o trabalho. Enquanto os orientais buscam ser os melhores no que fazem, os americanos querem ganhar dinheiro. É dessa forma que aos poucos você está envolvido com as histórias e conflitos.
É possível fazer um paralelo entre a realidade apresentada no documentário com o momento atual do Brasil, já que, Indústria Americana discute a utilização de mão de obra barata com menos direitos trabalhistas; a exploração do trabalhador, ignorando legislações que exigem condições dignas de segurança para o desempenho do trabalho. Além da tentativa de reduzir ou por um fim a sindicatos, usando a coação de empregados e ameaças aos que lutam pelo direito de realizar greves.
Aos interessados em entender um pouco sobre globalização, as mudanças ocorridas após a crise de 2008, o crescimento da China e a disputa de mercado internacional entre as duas potências, Indústria Americana é uma boa pedida. Lembrando que o doc está disponível na plataforma da Netflix.