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Crítica: Coringa

Coringa é um filme impactante, potente e difícil de digerir.

Ficha técnica:
Direção: Todd Phillips
Roteiro: Todd Phillips, Scott Silver
Elenco: Joaquin Phoenix, Robert De Niro, Zazie Beetz, Frances Conroy, Brett Cullen, Shea Whigham.
Nacionalidade e lançamento: EUA, 4 de outubro de 2019 (3 de outubro no Brasil)

Sinopse: Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) trabalha como palhaço e convive com a pobreza e o preconceito contra sua doença mental em uma sociedade à beira do colapso, em uma história que conta a formação de um dos vilões mais icônicos arqui-inimigos de super-heróis das histórias em quadrinhos.

Estudo de personagem, comentário político, crítica social e adaptação de histórias da cultura pop. Coringa é tudo isso. E ainda causa controvérsia por aquilo que apresenta.

No longa, acompanhamos um estudo de personagem do palhaço Arthur Fleck, que sofre com depressão em uma cidade à beira do caos e precisa lidar com o fato de que ninguém ao seu redor respeita ou compreende sua condição psiquiátrica, que o faz ter acessos de riso.

Dirigido por Todd Phillips, famoso pelas comédias da trilogia “Se Beber, Não Case”, Coringa surpreende pela apresentação de um domínio minucioso da técnica, incluindo a combinação de cores, posicionamentos de câmera e elementos de maquiagem e design de produção muito bem pensados: o azul que desce como uma lágrima do olho de Arthur em certo momento; a câmera lenta utilizada quando em que ele se sente empoderado e dança nas escadas; o resquício de maquiagem branca no rosto do personagem; além da paleta de cores tristes e escuras que permeiam o filme todo, em oposição às roupas que Arthur usa no final, vivas porém de tons roxos (que traz historicamente o significado da morte). Além disso, vale ressaltar que todas as referências a Taxi Driver e O Rei da Comédia apenas enriquecem o filme.

E se a atuação de Joaquin Phoenix é extremamente cuidadosa e intensa, o mesmo se pode dizer de sua transformação física: não apenas o fato de o ator ter emagrecido para o papel, mas também por curvar-se e aparecer constantemente sem camisa e com a barriga murcha ou os ombros tortos, como se carregando realmente o peso do mundo em suas costas, para mudar totalmente sua postura a partir das mudanças que ocorrem com o personagem.

Do ponto de vista da sua narrativa, é curioso notar como o filme retrata elementos que o protagonista cria como fantasiosos para em seguida o filme gerar dubiedade em seu caráter. Afinal, quando ele sai do apartamento de sua vizinha, fica no ar a dúvida do que ele teria feito (ou não) contra ela. Essa dúvida – bem como aquela a respeito de quem seria seu pai, quiçá não respondida – é importante para que o público duvide de sua maldade até os minutos finais, quando sua transformação se completa.

Há quem diga que Coringa enaltece a violência, ou a justifica. Não enxergo desta forma. O simples fato de vermos a formação de um vilão (um dos mais icônicos da cultura pop e do cinema) faz com que possamos ter a percepção de que não se trata de um personagem por quem possamos ter qualquer simpatia. E a forma como o filme conta sua história nunca é com um olhar que justifica suas ações (aliás, matar nunca deveria ser algo justificável… nem mesmo os tais ‘ricos’).

De fato, há momentos de Coringa que mostram Arthur Fleck como uma vítima do sistema e de uma sociedade à beira do colapso. Mas há muitos outros momentos que mostram uma série de outros fatores. O próprio protagonista questiona, no programa de TV, o que se tem quando se mistura um doente mental solitário com uma sociedade que o trata como lixo. Antes disso, no entanto, ele tem acesso a uma arma dada pelo colega. São vários fatores que transformam Arthur Fleck em uma pessoa má.

Mais do que empatia, o filme nos faz sentir pena do protagonista. E isso é o ponto principal. Mais do que justificar ações ou enaltecer alguém que encontra na violência sua busca por algum tipo de vingança, o filme mostra o quanto a insanidade de sociedades tumultuadas contribui para que grandes massas confundam um louco com um herói.

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