Era Uma Vez em… Hollywood – Crítica
Ficha Técnica
Direção: Quentin Tarantino
Roteiro: Quentin Tarantino
Elenco: Leonardo DiCaprio, Brad Pitt, Margot Robbie, Margaret Qualley, Austin Butler, Dakota Fanning, Al Pacino, Burt Reynolds, Bruce Dern, Emile Hirsch, Mike Moh, Damon Herriman, Maya Hawke, Sydney Sweeney, Lorenza Izzo, Rafal Zawierucha
Nacionalidade e Lançamento: EUA, 2019 (15 de agosto de 2019 no Brasil)
Sinopse: No final da década de 1960, Hollywood começa a se transformar e o astro de TV Rick Dalton e seu dublê Cliff Booth tentam acompanhar as mudanças. Em paralelo, acompanha-se o dia a dia da atriz Sharon Tate.
Na noite de 9 de agosto de 1969, a emblemática atriz Sharon Tate foi brutalmente assassinada por membros de uma comunidade hippie liderada por Charles Manson. O grupo ficou conhecido pelo nome Família Manson e foi responsável por inúmeros assassinatos no final dos anos 60 nos Estados Unidos. Na época do assassinato, a estrela de O Vale das Bonecas estava prestes à dar a luz ao seu bebê com o diretor Roman Polanski, diretor do clássico O Bebê de Rosemary, após pouco mais de um ano de seu lançamento mundial. Recriar tal história para o cinema sem afetar a integridade de Sharon Tate e seus entes queridos é uma tarefa extremamente difícil levando em conta a crueldade contida na descrição dos fatos do que ficou conhecido com o caso Tate-LaBianca, ainda mais quando o realizador é nada mais nada menos que Quentin Tarantino, conhecido em grande parte por seu cinema sangrento e violento. No entanto, para a surpresa de todos, Era Uma Vez em… Hollywood se mostra como o filme mais sensível de sua carreira e presta uma grande homenagem à indústria do cinema.
Ambientada em Los Angeles, a trama apresenta a história do renomado ator de televisão Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e seu parceiro de longa data e dublê Cliff Booth (Brad Pitt) na época em que a indústria encontrava dificuldades em suas produções. Dalton enfrenta um declínio em sua carreira na TV e no cinema, assim, precisa se redescobrir como ator para se manter na indústria. Ao passo que Booth, vive na sombra do ator trabalhando como seu motorista e procurando por trabalhos como dublê enquanto lida com acusações e problemas pessoais. Em paralelo, o filme exibe a rotina de Sharon Tate (Margot Robbie) e seu caso com Roman Polanski (Rafal Zawierucha).
Tarantino apresenta uma sensibilidade inédita em sua filmografia e que é manifestada no tratamento e na relação entre os personagens. Isso deve ao fato de que Era Uma Vez em… Hollywood, diferente de seus outros filmes, não se trata de uma grande história de vingança, perseguição ou ações que viriam a trazer grandes recompensas à seus personagens, o roteiro explora o dia a dia de Dalton e Booth representando o forte laço de amizade que os dois possuem e principalmente como o dublê se compromete a estrela do fictício faroeste Bounty Law. O humor se manifesta em grande parte da obra como de costume mas desta vez é acompanhado por um clima de tensão e certa melancolia devido ao conflito interno enfrentado por Rick Dalton em seus esforços para se tornar uma estrela de cinema que não se resume aos mesmos papéis, e a subtrama de Sharon Tate, que carrega consigo até quando está ausente o peso de toda uma história que desde o começo já sabemos qual será o seu destino, por se tratar de um dos maiores crimes que abalou os Estados Unidos e marcou o fim de uma era para Hollywood.
E tal sensibilidade é refletida com maestria pelo elenco da obra, em que Leonardo DiCaprio apresenta um de seus melhores papéis dando vida para o ator de televisão Rick Dalton ao exibir múltiplas facetas de diferentes personagens que o mesmo interpreta nos filmes dentro do próprio filme, o declínio que o ator enfrenta por não conseguir melhores papéis e a cobrança de seu agente Marvin Schwarsz (Al Pacino) que o faz conseguir diferentes papéis do que está acostumado e que definem parte de sua trajetória como o cowboy de TV. Seu dublê, Cliff Booth, é executado por Brad Pitt em que aqui também apresenta um de seus melhores trabalhos, sua dinâmica com DiCaprio dita o ritmo da obra, e não muito diferente do protagonista, acaba por enfrentar seus próprios dilemas enquanto está do lado de fora dos holofotes, o que o coloca em diversas encrencas, entre uma luta com Bruce Lee (Mike Moh) em um set de gravação onde não era bem recebido e o envolvimento com os hippies e a assustadora Família Manson. E por falar neste nome, uma simples aparição do infame líder do grupo, Charles Manson (Damon Herriman), é o suficiente para reafirmar o clima de tensão que reverbera pela projeção e a rotina de Sharon Tate, em que Margot Robbie captura com sucesso os belos e delicados trejeitos da atriz. O fantasma de Manson que acaba por perseguir Sharon Tate já é assustador demais para que o personagem precisa-se de mais cenas e este filtro revela uma forte empatia de Tarantino para com a atriz e seu legado.
A recriação da Hollywood dos anos 60 e o design de produção compõem uma estética rica e nostálgica para o filme apresentando um mar de referências para a indústria cinematográfica, as ruas de Los Angeles são preenchidas de pôsteres de filmes da época, cinemas de rua e diversos outros aspectos que marcam aquele tempo, como o surgimento do movimento hippie e da contracultura, em que os mais jovens apostavam em estilos diferenciados que refletiam em seus comportamentos como forma de protesto.
Os belíssimos figurinos também são responsáveis pela criação da atmosfera de tal era e presta grande homenagem aos materiais originais, desde os trajes dos heróis dos faroestes até os visuais apaixonantes de Sharon Tate. Tal representação também é refletida na forma como somos apresentados aos filmes dentro da obra, Tarantino e seu colaborador de diversos trabalhos, o diretor de fotografia Robert Richardson, conferem autenticidade ao se atentar aos mínimos detalhes de cada filme, como a proporção, os ruídos, serrilhados, a captação da luz, letreiros, créditos e enquadramentos mais utilizados na época.
A imaginação dos fatos de um dos casos mais assustadores de nossa história recente a partir da mente de Quentin Tarantino em Era Uma vez em… Hollywood apresenta um saldo positivo e possíveis suspiros que refletem numa sentimentalidade pouco casual na carreira do diretor, ancorados por excelentes performances e uma representação histórica que presta grande homenagem para o cinema.
Resumo
A imaginação dos fatos de um dos casos mais assustadores de nossa história recente a partir da mente de Quentin Tarantino em Era Uma vez em… Hollywood apresenta um saldo positivo e possíveis suspiros que refletem numa sentimentalidade pouco casual na carreira do diretor, ancorados por excelentes performances e uma representação histórica que presta grande homenagem para o cinema.