Hotel Ruanda – Relembrar para não repetir
Genocídio em Ruanda completa 25 anos, hora de relembrar para não repetir
Ruanda, 7 de abril de 1992. Os olhos do mundo se voltaram para o país africano. Após a morte do presidente Juvénal Habyarimana em um acidente de avião, uma série de ataques e mortes contra os tutsis, orquestrados pelos hutus, se espalhou pelas ruas de Ruanda. Esse massacre matou cerca de 800 mil pessoas entre homens, mulheres e crianças, alguns dizem que os números podem chegar a 1 milhão de pessoas. Uma onda de terror que durou 100 dias e devastou Ruanda. Tudo devido ao ódio e rivalidade entre dois grupos distintos. Rivalidade entre grupos de oposição, discurso de ódio, isso te lembra alguma coisa?
Comparações a parte, o Genocídio de Ruanda é algo a se lembrar para que não cometamos os mesmos erros. E o cinema é o melhor caminho para isso.
O histórico do Genocídio em Ruanda
Em Ruanda existem dois grupos predominantes os tutsis e os hutus, este último é a ampla maioria. Essa divisão foi criada pela Bélgica, para manter um controle de castas sociais. Na prática a diferença emtre tutsis e hutus são mínimas, isso até me lembra a cena de Hotel Ruanda em que o personagem de Joaquin Phoenix pergunta a duas jovens amigas quais são as origens delas, uma era hutu outra tutsi e ele diz: “Não vejo nenhuma diferença entre vocês”. Mas o governo belga resolveu fazer essa divisão. Durante esse governo os tutsis estavam no controle, com a independência de Ruanda em 1962 os hutus tomaram o poder e passaram a marginalizar os tutsis.
Em 1989 após uma crise com a principal fonte de renda do país, o café, a economia de Ruanda entrou em colapso e o país entrou em uma crise alimentar. Os gastos aumentavam, em especial com a área militar, em contrapartida a infraestrutura e serviços públicos eram deixados de lado. Em 1990 a Frente Patriótica Ruandesa, composta de tutsis expulsos de Ruanda pelos hutus, invadiram o país, dando início a Guerra Civil de Ruanda, que durou até 1993.
Em julho de 1993, após uma série de acordos e reuniões, foi assinado um acordo de cessar fogo e a Guerra Civil em Ruanda foi interrompida. Foi criado o UNAMIR (Missão de Assistência das Nações Unidas para Ruanda) uma espécie de missão para manutenção de paz. Foi criado assim um governo de transição que teria a participação dos tutsis e hutus.
Essa intervenção não foi bem vista por muitos, em especial pela Interahamwe, a principal milícia hutu, que começaram a fazer treinamentos e ser equipadas pelo exército. Uma onda de medo começou a surgir em Ruanda, que foi agravada ainda mais por programas da RTLM (Radio Télévision Libre de Mille Collines), que era dirigido por hutus radicais, que incitavam ataques e ódio aos tutsis. O programa da rádio incitava a caça aos tutsis, em especial após a circulação de boatos que os tutsis iriam causar um genocídio contra os hutus.
Até que em 6 de abril de 1992, um ataque que derrubou o avião que transportava os presidentes de Ruanda, Juvénal Habyarimana, e de Burundi, Cyprien Ntaryamira, matando a ambos, desencadeou no dia 7 de abril de 1992 o Genocídio de Ruanda. Os hutus, que estavam com ódio inflamado, acusaram os tutsis de matar o presidente, que era da etnia hutu. Isso deu a eles um “motivo válido” para massacrar cerca de 800 mil pessoas. Essa perseguição, esse massacre se estendeu aos tutsis e a hutus moderados, ou seja, que iam contra ao Genocídio patrocinado pelos hutus extremistas.
Fake News, discurso de ódio, preconceito, país polarizado, isso te lembra algo?
O Genocídio em Ruanda e o Cinema
Vários filmes retrataram o Genocídio de Ruanda, entre ficções e documentários, mas o melhor e mais famosos deles é Hotel Ruanda. Escrito e dirigido por Terry George (Em Nome do Pai) o filme conta uma história real ocorrida no Hotel des Mille Collines na cidade de Kigali, capital de Ruanda.
O filme começa pouco antes do atentado que matou o então presidente ruandês Juvénal Habyarimana no Hotel des Mille Collines. Ali conhecemos Paul Rusesabagina (Don Cheadle) um ruandês hutu gerente do hotel, ele é casado com Tatiana (Sophie Okonedo) da etnia tutsi. A morte de Juvénal estoura um ataque sem precedentes orquestrados pelos hutus contra os tutsis e hutus moderados. A partir daí vemos a luta de Paul para sobreviver e proteger os tutsis e hutus moderados que estão refugiados no hotel. Usando suas influências na cidade, Paul faz acordos e faz tudo ao seu alcance para proteger os refugiados no hotel.
Terry George não poupou o público com cenas fortes e explícitas. O filme retrata de forma explícita o que foi o genocídio. O filme retrata cenas de violência cometidas durante o genocídio. São cenas bem explícitas que mostram a violência cometidas pelos hutus contra os tutsis. As cenas são chocantes, destaque para a cena da estrada, quem já viu sabe do que estou falando. Além disso Terry George recria as gravações assustadoras da RTLM que incitavam a violência contra os tutsis. São cenas e falas tão absurdas que revoltam a qualquer um com um pouco de compaixão ou coração.
No dia que assisti a Hotel Ruanda prometi a mim mesmo que nunca mais assistir, de tamanha foi a crueldade do Genocídio de Ruanda. E imaginar que aquilo é apenas uma encenação hollywoodiana do que aconteceu e que foi muito pior do que vemos ali é de doer o coração. Mas é um filme importante e necessário de se assistir.
Hotel Ruanda – Relembrar para não repetir
Mas, como o título desse texto diz, temos de relembrar para não repetir. O que causou o genocídio? O ódio. O ódio criado por uma polarização da nação. Os tutsis durante muito tempo ficaram no poder para o ódio dos hutus. Depois que subiram ao poder os hutus começaram a perseguir os tutsis. O ódio e o preconceito começaram a ser disseminados pelo governo e por rádios que incitavam o ódio aos que eram de etnia diferentes.
Agora pare e pense: será que o que aconteceu em Ruanda pode se repetir? Vamos analisar.
Em Ruanda pouco antes do genocídio tinhamos uma popularização tutsis de um lado e hutus do outro, ou você era um ou outro, não tinha meio termo. Estamos em uma época de polarização parecida. Não temos mais tutsis e hutus, agora temos esquerdas e direita, os pró-governo e os contra o governo. Ou você é de esquerda ou de direita. Ou você é contra o governo ou você é a favor do governo. Não podemos mais ser neutros e mais conscientes sem lados, você tem de escolher um lado, mesmo não querendo e se você não escolhe, você corre riscos.Ou seja, assim como em Ruanda quando os hutus moderados eram perseguidos e até mortos, hoje quem tenta não se envolver se manter neutro nessa disputa também corre risco até mesmo de vida.
Que dizer então dos discursos de ódio? Em Ruanda havia a RTLM que disseminava o ódio contra os tutsis e os hutus que não fossem a favor do massacre. Os líderes do povo de forma sutil, ou até explícitas, incitavam o ódio no povo. Será que algo mudou? A resposta nua e crua é um categórico: NÃO! E as coisas estão piores! Facebook, Twitter, Whastapp e afins são palcos para discursos de ódio. Discursos inflamados de ódio contra minorias e contra pessoas com pensamentos diferentes dos deles. Os nossos líderes de forma sutil e até de forma explícita fazem discursos contra todas as minorias. De forma sutil estão incitando ódio a quem pensa diferente deles.
Agora querido leitor te proponho uma reflexão. Te proponho o seguinte: se você já assistiu Hotel Ruanda, reassista, se não assistiu, assista. E após isso façamos uma reflexão: “Será que vamos deixar isso acontecer novamente?”
Pense nisso!
Para ver o quão importante é discutir esse tema ouça os seguintes podcasts Podcast Cinem(ação) #266, Podcast Cinem(ação) #292 e Podcast Cinem(ação) #296.