Crítica: Operação Overlord (2018)
Operação Overlord é uma mistura de gêneros muito bem feita.
Ficha técnica:
Direção: Julius Avery
Roteiro: Billy Ray, Mark L. Smith
Elenco: Jovan Adepo, Wyatt Russell, Mathilde Ollivier
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2018 (8 de novembro de 2018 no Brasil)
Há várias possíveis introduções aqui. Falar da importância da operação de Overlord para a Segunda Guerra, da quase sempre precisa produtora do J. J. Abrams que está por trás do projeto ou até mesmo da opção de ver ou não um trailer (sempre recomendo não assistir para evitar spoilers- esta crítica inclusive revelará menos do enredo que o material citado).
Como todos estes elementos são extra-filme vou me ater à sinopse: um grupo de paraquedistas tem uma missão de desarticular uma torre de comunicação nazista para facilitar o acesso de outros companheiros. Contudo, chegando no local eles encontram coisas que não podem ser “desvistas”. O primeiro ato, e até parte dos outros dois, revela um bom, talvez muito bom filme de guerra. No meio dele, porém, o gênero se transforma (ou nem tanto) e temos elementos que podem surpreender a muitos.
A cena inicial é daquelas que já ganham o espectador: somos colocado no meio da ação em um ambiente fechado (um avião, um tanto frágil) e com vários soldados na eminência de morrer – seja por possíveis ataques aéreos, seja por uma missão de difícil resolução. O mais destacável é como esta cena é mostrada. Com um trabalho de câmera que passeia por aquele micro espaço e uma apresentação dos personagens de modo funcional. Rapidamente desenvolvemos empatia por aquelas figuras. Basta um objeto, um jeito de falar ou até um silêncio para termos simpatia ou não por x ou y. Quando a ação eclode, bons efeitos e uma montagem limpa também são destaque. E sim, tudo isso e estamos falando de poucos minutos de filme.
Outro ponto simpático a este início e de certo modo algo que se repete é a ausência de exposição. Não raro filmes de guerra caem na famigerada tentação de abrir com um letreiro explicativo na tentativa de imersão na marra. Pela descrição anterior vimos que é muito possível (e eu diria recomendável) não ter essa ferramenta que só passa um atestado de incompetência, como se o filme dissesse: não sou capaz de mostrar a minha própria história, ou então de duvidar da inteligência do público, deixando o contexto mastigado em letras garrafais. Operação Ovelord, como mostrado, não apela para isso. O que fica subentendido é benéfico também em outros momentos, por exemplo, a partir de uma relação abusiva entendemos que dois personagens têm um passado e aquela chantagem não ocorreu de forma inédita e explica uma situação de uma outra figura da casa.
O longa trabalha com alguns clichês e de duas naturezas: na construção dos personagens e no desenrolar das ações. O primeiro torna aquelas figuras um tanto rasas. Mas incrivelmente a fórmula não afeta o filme. Os caracteres escolhidos servem para termos informações dos personagens e eles não serem só figuras para morrer – e bem, é um filme de guerra não é nenhum spoiler dizer que teremos mortes…
Já o segundo tipo de clichês, os das ações previsíveis, este deixa um gosto um pouco mais amargo. Por exemplo, há um objeto em cena e sabemos como e quando ele vai ser utilizado. Ou então um personagem é feito de refém e não é difícil antecipar o desfecho. Aliado a este fator, o filme também vai no limite da suspensão da descrença com algumas saídas fáceis e coincidências. Em um filme bem feito, como é o caso, tais questões viram uma faca de dois gumes: temos mais boa vontade de aceitar pequenos escorregões, porém cada errinho fica mais evidente no meio de uma série de acertos.
Vale o aviso: Operação Overlord possui cenas graficamente impactantes. O gore é explicito e pode causar arrepios em quem não está acostumado ou quem é sensível. Sangue, cabeças explodindo, partes de corpos pouco usuais e em formas igualmente não muito comum são expostas. A classificação indicativa de 16 anos não é à toa.
Por falar em idade, vale demais ressaltar o personagem infantil. Eu normalmente tenho uma certa repulsa de crianças em filmes, pois elas são muito mal utilizadas. Tratam os pequenos ou como gênios ou como alívio fofo. Aqui o trabalho merece aplausos, pois vemos uma movimentação fidedigna tanto em cenas corriqueiras, quanto nos momentos mais intensos.
No elenco adulto, Jovan Adepo, que faz o protagonista Boyce, passa a integridade e fisicalidade necessárias que são pedidas. Compramos o caráter daquela figura e entendemos as decisões morais e inclusive as mudanças de tom. Sentimos que ele aprende e se transforma (nem que seja pela dor ou pela necessidade) e isso é fundamental em um personagem central.
Na parte técnica, vários elogios: o som, como é tradicional em filme de guerra, exige muito trabalho para tornar o desenho sonoro funcional, impactante e sem soar uma bagunça. Overlord não está cotado para Oscar, mas para poderia figurar nas categorias de edição e mixagem. Os efeitos, práticos ou não, também dão um peso imersivo cru. A maquiagem tem um papel fundamental e era outra que poderia ser pontuada em premiações.
A montagem merece uma nota à parte: é sensível o equilíbrio de tom. Há uma certa lentidão sem flertar com momentos que sobram e fazer tal opção em um filme de guerra é um tanto corajoso. As mudanças de ambiente estão suaves e os cortes nas cenas mais fechadas são honestos. Esta é uma montagem que não grita.
Operação Overlord talvez não agrade alguns por conta de certos excessos visuais (que cabem na proposta, diga-se), eu pessoalmente adoro… mas questão de gosto à parte temos um filme bem completo, que sabe o que quer ser – mesmo sendo muita coisa. Ele vai (e nos leva) do ponto A ou B de maneira muito fluída e instigante.
E comentei o filme também em vídeo, logo na saída da sessão junto com o pessoal do Razão de Aspecto:
Como complemento, vale o texto do Fernando Machado aqui no site sobre o mesmo filme