Crítica: Hereditário
Hereditário se destacou em Sundance e teve cobertura aqui no Cinem(ação)!
Ficha técnica:
Direção e Roteiro: Ari Aster
Elenco: Toni Collette, Alex Wolff, Gabriel Byrne, Milly Shapiro, Mallory Bechtel, Ann Dowd.
Nacionalidade e lançamento: Estados Unidos, 8 de junho de 2018 (21 de junho de 2018 no Brasil).
Sinopse: Após a morte da complicada e reclusa avó, a família Graham começa a descobrir elementos deixados pela matriarca que podem revelar segredos do passado e trazer à tona questões capazes de mudar o futuro de suas vidas, especialmente da sofrida mãe Annie.
Quando a câmera se aproxima de uma miniatura que vai se transformando gradativamente em um quarto em “tamanho real”, é como se o diretor Ari Aster quisesse chamar atenção para o fato de que estamos vendo em seu filme uma representação. E nada como um bom filme de terror que funcione como representação de algo presente em nossa sociedade. Os bons filmes do gênero fazem isso.
Na trama, acompanhamos a personagem Annie, vivida por uma Toni Collette especialmente inspirada. A artista faz miniaturas que sempre retratam momentos de sua história de vida – como uma espécie de catarse – em uma casa que por si só se parece muito com uma miniatura, especialmente graças às imagens aéreas comumente empregadas por Aster. O clima é sempre tenso, a casa é pesada e remete à sua mãe, cuja morte é citada logo no começo.
Ao longo da trama, vamos acompanhando a estranha rotina da casa: a menina Charlie, que era apegada à avó; o adolescente Peter, recluso e que não se dá bem com a mãe; e Steve, o pai que parece funcionar como um elo entre todos.
Os elementos se combinam para construir uma atmosfera densa que nunca se rende ao clichê. Nem sempre está nublado, a trilha não possui arroubos, as atuações mostram personagens sempre escondendo seus segredos. O destaque vai para a fotografia cuidadosa de Pawel Pogorzelski, que brinca com inúmeros pontos de luz como forma de não deixar as cenas escuras demais, e ainda assim manter a aura de mistério que o filme carrega.
O melhor de “Hereditário” é que ele possui inúmeras camadas. O próprio título é uma pista do que estamos a analisar. Se todos nós carregamos o passado do que vivemos – e do que nos foi trazido pela nossa família – estamos também condenados a passar o mesmo aos nossos filhos (seja pelo comportamento, seja por influências genéticas das mais diversas doenças). Enquanto Annie sublima os problemas do passado em sua arte (e aos poucos, descobrimos que seu passado é absurdamente traumático), sofre com a “sombra” que sua mãe deixou. No fim das contas, o terror é só uma forma de elevar à máxima potência, na arte, o que todas as pessoas carregam consigo de alguma forma, já que todos temos os nossos traumas.
Quando paramos para pensar nas informações que recebemos ao longo da trama – e certamente há muito mais nos detalhes em cada revisita ao filme – podemos perceber que as ações e reações dos personagens se encaixam. E se pensarmos que o longa representa também a valorização do corpo masculino em detrimento dos corpos femininos (um deles com algum grau de má formação, inclusive), talvez “Hereditário” se torne um filme ainda mais rico.
Mesmo com um final que parece perder o ritmo e seguir algo menos crível, o filme carrega uma história com elementos que poderiam retornar em outras produções, de forma a se tornar uma franquia, com continuações, prequels e spin-offs. Independentemente das possibilidades futuras, Hereditário é um ótimo filme.
Resumo
O melhor de “Hereditário” é que ele possui inúmeras camadas. O próprio título é uma pista do que estamos a analisar. Os elementos se combinam para construir uma atmosfera densa que nunca se rende ao clichê.