"Garden Of Words" - (2013) - Cinem(ação): filmes, podcasts, críticas e tudo sobre cinema
Cine(filo)sofia

“Garden Of Words” – (2013)

Como seria refletir a respeito de um filme escrevendo a partir de uma percepção pessoal e de fora acerca de um personagem que vive sua própria história? É o que vou tentar em Garden Of Words.

A chuva traz o cheiro do céu.

O céu sempre esteve mais próximo quando era mais novo, mas o tempo o afastou, o levou para longe de onde estou agora. As incessantes batidas de ombros no trem pela manhã, a permanente vontade de sair daquele espaço. A chuva sempre me trouxe calma. O jardim pelo qual percorro quando saio do derradeiro ponto do trem acompanhado daquele cheiro de céu, naquela tarde, me trouxeram algo diferente, porém, comum à uma memória incerta quanto ao encontro que ali se deu. “O som leve do trovão, o céu nublado, talvez a chuva venha. Se assim for, você ficará aqui comigo?”

Desenho em meu bloco de notas trejeitos únicos daquela mulher que nas tardes chuvosas me faz companhia. Seu balançar de pés, quase que fazendo o salto saltar de encontro ao chão; gosto de reparar nesses detalhes. Era a chuva que mediava nossos encontros no parque, fazia com que de longe, pudéssemos ser vistos através de nossos guarda-chuvas, o meu azul e o dela vermelho. Muitas vezes ficávamos sentados sem ao menos trocar uma palavra um com o outro: eu desenhando e ela tomando suas latas de cerveja ao gosto de barras de chocolate. “Pra mim é como se ela fosse os segredos do mundo em si.”

O dia em que fiquei sozinho por um longo tempo e que pensei que ela não viesse, parte de mim não conseguiu se concentrar naquilo que desenhava; era uma questão apenas de espera e de insegurança. Gosto de desenhar calçados. Ela gosta disso. Quando após uma longa demora chega ao nosso banco no meio do jardim, se mostra curiosa em ver meus rabiscos, mas não me sinto bem com eles ainda, sinto que não estão prontos para serem vistos.

Os pingos de chuva molham os arredores da bancada onde ela de forma sutil e devagar, deita seus pés com o intuito de ser a primeira a vestir um de meus modelos de sapatos, o qual ainda não saiu do papel. Quando toco em seus dedos a chuva de certa forma diminui dando nascimento a um belo arco-íris no céu. Nossos encontros, cada vez mais, eram como desencontros da vida, tais, que levavam a nos encontrar. Não sabia nada sobre ela, queria saber mais. E mesmo sem o conhecimento de algo tão simples como um nome, a vontade e o desejo que me rodeavam significavam algo desconhecido, mas que tinha relação com um tipo de atração que sentia por ela.

Os dias ensolarados persistiam em continuar. Um sentimento de vazio ganhou vida diante daquele tempo sem nossos encontros. Estar diante dessa ausência, de certo modo, me trazia saudades, como também, leveza diante do que pensava sobre ela. E por mais que meus pensamentos tinham sempre algo de conexão, o melhor que tinha a fazer era produzir um par de sapatos especialmente baseado em nossos encontros e na imagem que tinha dela em minha memória. Continuo esperando pela chuva.

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