Crítica: Cegonhas – A História que Não te Contaram
Cegonhas – A História que Não te Contaram possui sua parcela de momentos esquecíveis, mas ganha brilho com alguns de seus personagens e uma bela mensagem final.
Ficha técnica:
Direção: Nicholas Stoller, Doug Sweetland
Roteiro: Nicholas Stoller
Dubladores: Andy Samberg, Katie Crown, Kelsey Grammer, Keegan-Michael Key, Jordan Peele, Jennifer Aniston, Ty Burrell, Danny Trejo.
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2016 (22 de setembro de 2016 no Brasil)
Sinopse: Cegonhas entregam bebês… ou pelo menos elas costumavam. Agora elas oferecem pacotes para a gigante global da internet Lojadaesquina.com. Junior, um dos principais entregadores da companhia, está prestes a ser promovido quando a Máquina de Bebês é acidentalmente ativada em seu turno, produzindo uma adorável – e totalmente não autorizada – bebê. Desesperado para entregar esse presentinho antes que o chefe descubra, Junior e sua amiga Tulipa, o único humano na Montanha das Cegonhas, correm para fazer sua primeira entrega de bebês em uma viagem selvagem e reveladora. Isso poderá fazer mais do que apenas iniciar uma família, mas também restaurar a verdadeira missão das cegonhas no mundo.
Não deixa de ser oportuno que, logo após meus comentários em um texto recente sobre a saturação de um mercado cada vez mais lucrativo – e prolífero – que é o da animação, tenhamos o lançamento de um exemplar do gênero que se encaixe em muitas partes daqueles comentários: Cegonhas – A História que Não te Contaram. No entanto, ainda que o filme possua as mesmas deficiências que boa parte desse tipo de projeto (que costuma ter como maior defeito o fato de sere esquecível), o que o salva realmente são as interações de seus personagens e alguns momentos inspirados.
Em Cegonhas, acompanhamos um mundo em que as aves não entregam mais bebês (devido ao perigo atribuído ao ato de carregar bebês por longos trajetos… e porque aparentemente os humanos descobriram que existem outras formas de se fazer bebês). Com o tempo, as aves passaram a entregar pacotes, como celulares, móveis e produtos domésticos, agindo como uma espécie de SEDEX. Junior (dublado no original por Andy Samberg) é a melhor delas. Porém, após um acidente provocado pela única humana da empresa, a hiperativa órfã Tulipa (dublada por Katie Crown), a máquina de bebês é reativada, produzindo uma adorável bebê de cabelos rosas. Para que a pequena não fique sem os pais – e custe o emprego de Junior – ele e Tulipa partem em uma jornada para entregar a bebê, aprendendo valores sobre o que é ser um pai e uma mãe no processo.
Como podemos perceber, o enredo segue à risca a estrutura de um road movie (e não há nada de errado com isso), geralmente com dois personagens que não têm muitas características em comum e partem numa jornada, com o já obrigatório conflito que é apresentado no início – normalmente uma mentira que vira uma bola de neve – apenas para causar problemas ao fim do segundo ato e separá-los brevemente. É tudo bem formulaico, “by the book”, e a sensação que permanece ao decorrer da aventura é de familiaridade (“Eu acho que já vi isso antes…”), apesar das inevitáveis boas risadas que os diretores Nicholas Stoller (de Vizinhos 1 e 2) e Doug Sweetland (que havia trabalhado no departamento de animação de alguns projetos da Pixar) conseguem arrancar. Quando fica evidente a sensação de que o roteiro escrito também por Stoller é feito no automático, quase que protocolar, o que nos resta mesmo são os personagens contidos nele, com destaque para os coadjuvantes e as situações que estes protagonizam.
Entre esses momentos, temos a hilária sequência em que Junior e Tulipa lutam contra um grupo de adoráveis -mas perigosos – pinguins, e todos os movimentos e golpes são calculados para não emitir sons, pois a bebê está dormindo. Quem rouba a cena (e tentam roubar a bebê) também, são os lobos Alpha e Beta, acompanhados de sua alcateia, que possui um talento enorme para transformar-se em veículos (!?) quando se junta. E o que falar de Jasper, cegonha dublada por Danny Trejo no original que representa, na maioria de seu tempo em tela, uma hilária piada recorrente de uma só frase?
Mesmo que sigam a velha cartilha dos olhos grandes e características fofas para os personagens (principalmente os bebês), o design de visual dos mesmos consegue ser interessante, principalmente na parte da animação, que abraça o nonsense e a distorção física dos personagens de acordo com os ambientes ou machucados que sofrem, ao melhor estilo Looney Tunes, com toda sua expressividade.
A dublagem Brasileira é competente. O ator Klebber Toledo não compromete como o protagonista Junior, sendo eficiente nos momentos que exigem mais energia e exagero (o que não ocorre quando os dubladores são celebridades e figuras da internet, que costumam apenas “ler as falas”), assim como Tess Amorim e sua inquieta e adorável Tulipa. Enquanto isso, o comediante Marco Luque (que também está em cartaz com outra animação, Mortadelo e Salaminho – Em Missão Inacreditável) dubla o pombo Luke com uma voz arrastada e anasalada que combina com o coadjuvante.
Apesar de pender mais para o grupo das “animações direcionadas aos mais novos”, com a simplificação de alguns temas referentes à lógica daquele mundo fantasioso e como ele funciona (e que deve originar algumas pequenas dores de cabeça à alguns pais), Cegonhas – A História que Não te Contaram diverte os adultos nos momentos em que faz pequenas críticas ao corporativismo (nada muito incisivo), junto com algumas gags visuais hilárias.
Se eu havia mencionado mais acima o caráter protocolar e formulaico da obra em certos aspectos, os instantes finais conseguem trazer uma relevância maior para a animação aos 45 do segundo tempo, e emocionar por retratar a diversidade de uma forma honesta e tocante. E ver casais do mesmo sexo e mães solteiras recebendo bebês em uma animação infantil demonstra que, ao menos nas representatividades, percorremos um longo caminho, atribuindo – numa animação que seria divertida mas esquecível até o momento – um bela mensagem para os mais novos – e também para os mais velhos.
*No melhor estilo Pixar, a Warner incluiu um curta da série Lego antes do filme, que é inventivo e divertido.
Resumo
Cegonhas – A História que Não te Contaram tem sua parcela de elementos genéricos, auxiliado pelo roteiro formuláico, contudo, o que salva esta animação são as interações dos personagens e alguns momentos muito inspirados – incluindo um final com uma bela mensagem.