Crítica: O Homem nas Trevas (Don’t Breathe, 2016)
O Homem nas Trevas é um dos melhores filmes do ano, suspense de altíssimo nível.
Ficha técnica:
Direção: Fede Alvarez
Roteiro: Fede Alvarez, Rodo Sayagues
Elenco: Stephen Lang, Jane Levy, Dylan Minnette, Daniel Zovatto
Nacionalidade e lançamento: EUA, 2016 (08 de setembro de 2016 no Brasil, com pré-estreias uma semana antes).
Sinopse: um trio de jovens invade casas e comete pequenos roubos. Eles resolvem arrombar uma residência de um velho que não enxerga, pois suspeitam que há uma quantidade grande de dinheiro lá. Mas as coisas não saem como eles preveem.
Este ano tivemos um filme claustrofóbico com um belo design de produção e ótimas atuações, o Rua Cloverfield,10. E também um bom suspense cuja protagonista não escutava e tinha que se proteger de alguém tentando invadir a cada dela, o Hush – A Morte Ouve. O Homem nas Trevas (cujo título nacional, apesar de bem diferente do original, ficou muito bom) pega elementos dos dois longas citados e os executa de forma impecável.
A primeira tomada já mostra que temos algo diferente aqui. Uma aérea que vai aproximando e mostra um movimento estranho ao fundo. Logo vemos uma cena chocante: um homem arrastando uma mulher ensanguentada em uma estrada. O ótimo trabalho com a câmera é uma constância não só nessa cena. Há um plano sequência bem utilizado para ambientar a casa e os que ali estavam. Plongée e contra-plongée também são percebidos em vários momentos. O diretor Fede Alvarez sabia como nos situar e o que e quanto nos revelar. Belíssimo desempenho dele.
A história começa bem simples, como a sinopse sugere. Algumas reviravoltas e um clímax poderoso fazem do simples algo avassalador, mas ainda brilhantemente simples. Às vezes – quase sempre – menos é mais. Não dá para revelar muito do desenrolar sem estragar a experiência. Fato é que todo os aspectos técnicos confluíram para ajudar no roteiro.
O ritmo nos conduz de forma a gerar uma tensão crescente e contínua. Os artifícios que a construíram vão desde jumpscares bem encaixados e não tão óbvios, um não saber o que o próximo cômodo releva e tampouco as atitudes dos personagens. Há um desconforto no que tange ao nosso sentimento em relação àquelas figuras. O diretor se diverte com o público nos deixando desnorteados. Incrível que há poucos momentos de respiro e ainda assim a coisa funciona.
Stephen Lang faz o homem cego. A força de atuação dele é sentida em todas as cenas. Mesmo parado ele causa uma imponência assustadora. E cada movimento dele reverbera de um jeito ímpar. Quero urgentemente ver outro longa da Jane Levy, que faz a personagem Rocky. Ela transita em vários sentimentos e todos com uma fisicalidade ao mesmo tempo despretensiosa e vigorosa. Os demais atores cumprem bem, mas sem o destaque desses dois. Há um personagem de um cachorro que nos presenteia com excelentes momentos, “atuação” memorável dele também.
A trilha sonora é pontualmente percebida. Sem nunca gritar mais que a narrativa ou antevendo os sentimentos do público. Os cenários são compostos por corredores, buracos, portas que não abrem, objetos potencialmente perigosos. A casa em si é quase um personagem também. A mise en scene contribui muito e sem o bom aproveitamento desse fator cênico perderíamos valor aqui.
Se é para achar algum problema no filme, que definitivamente não afeta o todo, são pequenos momentos de exposição no começo – que podem tranquilamente ser relevados. O que não dá para engolir tanto são algumas conveniências, principalmente no terceiro arco. Mas, ainda assim, O grande mérito é que O Homem das Trevas poderia cair em armadilhas fáceis do gênero ou se autossabotar. Isso não ocorre e a experiência causará taquicardia e mãos suadas, sendo o que importa: um baita longa metragem.
O Homem nas Trevas, portanto, é quase irretocável. Comove o público de um jeito raro. Mesmo não entrando na lista dos 10 melhores do ano, será lembrando nas menções honrosas com toda certeza.
[o trailer revele muitos dos jumpscares e alguns detalhes importantes da trama. Para quem não gosta de spoiler recomendo não assisti-lo]