Crítica: Nós ou Nada em Paris
Nós ou Nada em Paris tem dificuldades para achar a história que quer contar.
Ficha técnica:
Direção e roteiro: Kheiron
Elenco: Kheiron, Leïla Bekhti, Gérard Darmon, Khereddine Ennasri, Zabou Breitman
Nacionalidade e lançamento: França, 2015 (23 de junho de 2016 no Brasil).
Sinopse: uma comédia que conta a dramática trajetória de Hibat. Um advogado iraniano que nasce em uma numerosa família humilde, vai preso por ser contra o xá Reza Pahlevi, tenta dar um futuro para a família sem largar a política e faz um outro tipo de revolução na França.
Este ano chegou ao Brasil um longa protagonizado, escrito e dirigido por uma mesma pessoa e estreante na função de direção. De Amor e Trevas, da consagrada atriz Natalie Portman, traz uma bagagem emocional forte dada a raiz de Portman. Aqui em Nós ou Nada em Paris, o rapper e comediante Kheiron conduz da mesma maneira e se apresenta nas três funções. E ambos os filmes, apesar de diferentes, possuem um eco de A Vida é Bela – ao amenizar a guerra com subterfúgios. O longa israelense no conteúdo, ao usar da literatura para tal, e aqui na estrutura ao contrapor tortura, exílio e morte com humor.
A introdução, bem hilária inclusive, mostra de forma visual e lúdica como funcionava a mecânica da família de Hibat na infância e juventude do nosso protagonista no Irã, na década de 50. O que se apresentava como uma comédia que misturava tons de Borat com O Fabuloso Destino de Amélie Poulain logo ruiu em uma narrativa confusa e sem coesão. E a opção, muitas vezes bem sucedida em outros longas, de misturar a situação dramática com as piadas não tirou a força cômica, mas enfraqueceu muito o lado mais sério.
Logo Hibat é preso e passa muitos anos no cárcere. Apesar de boas cenas, o filme se detém tempo demais naquele arco. Posterior aquela fase na cadeia, os momentos familiares e a última parte, já na França, também funcionam – porém com problemas. E esse é o tom em Nós ou Nada em Paris: uma história em mini arcos que trazem bons momentos isolados. Contudo, no resultado final, fica uma sensação de desperdício.
Não há dúvidas que o personagem principal é bem constituído. A já citada introdução acelera alguns tantos anos, vemos como ele encara a religião, política e família. A chama revolucionária sempre acesa também é marcante. O ar resoluto como defende as próprias ideias, sacrificando o próprio corpo, avança para uma maturidade – também firme – para lidar com os problemas em um centro comunitário. Os dois tipos de revolução que ele faz parte possuem sentido narrativo, são boas analogias uma da outra e promovem discussões pós-filme.
Aviso importante: não se iludam pelo título brasileiro (originalmente Nous Trois ou Rien). O longa se passa muito pouco na França e menos ainda em Paris. Boa parte do filme é ambientado no Irã. Apesar de ser um problema externo à obra original, essa esquizofrenia geográfica está presente no longa em si. Somos transportados para incontáveis cenários e de forma abrupta.
Esse grave problema de montagem resulta em momentos desnecessários, má transição entre os ambientes e, principalmente, uma quebra de empatia em relação à situação e aos personagens. Apesar da mensagem edificante e de dar boas risadas com Nós ou Nada em Paris, tais elementos não é suficiente para sustentar a obra.