Crítica: Ele Está de Volta (2015)
Ele Está de Volta é uma comédia muito engraçada, mas que faz pensar…
Ficha técnica:
Direção: David Wnendt
Roteiro: David Wnendt, Mizzi Meyer
Elenco: Oliver Masucci, Fabian Busch, Michael Kessler, Katja Riemann, Christoph Maria Herbst
Nacionalidade e lançamento: Alemanha, 2015 (09 de abril de 2016 no Brasil – lançado diretamente na Netflix).
Sinopse: Hitler acorda em pleno 2014 e tem que se adaptar a nova realidade. As pessoas pensam se tratar de um imitador e não o levam a sério, mas mesmo como um “comediante” a figura dele causa um impacto bem forte.
Quantos filmes sobre nazismo/segunda guerra você já viu? Provavelmente um monte… Especificamente sobre o Hitler talvez o mais famoso seja A Queda (2004). Contudo, não é tão comum vermos comédias alemãs sobre o assunto. E é essa a proposta de Ele Está de Volta. E mesmo sendo um gênero leve, causa uma sensação amarga e faz o público refletir.
Narrado pelo icônico personagem, vemos a confusão mental de Hitler tentando se situar em um mundo bem diferente do que ele deixara décadas antes. A primeira cena mostra ele tendo aula de etiqueta e reclamando com o professor que ninguém mais faz a clássica saudação devidamente. Outras diversas piadas nessa linha são diluídas ao longo da trama. Há uma, bem rápida, com o livro “Minha Luta” que é hilária – o próprio personagem cai na gargalhada. E claro que a já clássica, inúmeras vezes parodiada, cena do já citado A Queda está presente.
Paralelo ao encontro de Adolf com as novas possibilidades, vemos a história de Fabian Sawatzki. Este é um freelancer que tenta vender uma história para um estúdio de TV. Não é difícil imaginar que ele se interessa pelo “sósia” que não sai nunca do personagem mais marcante da história da Alemanha… Além de muitas referências ao passado – a maioria funcionando muito bem – Ele Está de Volta vale muito pela indagação de como o mundo reagiria com o retorno de Hitler. E o resultado é… selfies.
Sim, a reação mais comum da população é do trato amigável e simpático àquele ser. Quase 100% das vezes as pessoas estão mais propensas a considerá-lo um amigo do que enxergam nele o perigo real. Parte desse fator está na justa descrença de cogitar que ele está realmente de volta, mas parte é dada por algo que podemos nos questionar: a glamorizarão de tudo e transformação rápida de qualquer coisa em um sucesso na internet – mas admito que ver Hitler criando um e-mail foi uma das coisas mais cômicas que vi recentemente.
Outro mérito de Hitler se encontra nos discursos. Oliver Masucci (que faz magistralmente o Hitler) imprime uma retórica muito poderosa e convence algumas pessoas da ideologia que ele quer vender – qualquer semelhança com a realidade, com políticos exaltando ideias extremas, não é mera coincidência. Ficamos facilmente cativados quando ele profere as palavras para as massas, tal fato ocorre umas 3-4 vezes e em todas ficamos com a sensação de “esse cara sabe o que está falando”.
A mídia tem um papel fundamental na trama e em vários sentidos. Há a subtrama de Sawatzki, a viralização das falas de Hitler e ele como figura central em vários programas (sempre com os demais personagens desacreditando, claro, que ali se tratava do verdeiro Führer). Além da pergunta: será que hoje alguém como ele teria mais facilidade para propagar as ideias?
Ele Está de Volta traz um humor muito mais textual que físico, apesar deste artifício estar presente o tempo todo na caracterização, trejeitos e em tudo que cerca Hitler. Ter um mínimo de conhecimento da história é bom para apreciar melhor o filme, já que algumas piadas são bem referenciais. Um roteiro direto e linear, mas de forma alguma simplório (há um momento de metalinguagem que é fantástico), e uma atuação impecável de Masucci são os pontos fortes aqui. Vale a pena conferir o longa, que está disponível no catálogo da Netflix.