Crítica: Paulina
Paulina é traz uma mensagem importante e reflexiva, além de apresentar um bom filme em aspectos cinematográficos.
Ficha técnica:
Direção: Santiago Mitre
Roteiro: Santiago Mitre e Mariano Llinás
Elenco: Dolores Fonzi, Oscar Martinez, Cristian Salguero
Nacionalidade e lançamento: Argentina, 2015 (16 de junho de 2016 no Brasil).
Sinopse: Paulina é uma jovem advogada que está no meio do doutorado. Ela resolve largar a carreira para ser professora em uma área carente. Chegando no novo ambiente enfrentará, além do desafio profissional, uma questão pessoal muito complicada: um estupro. Tal fato fará ela testar na prática as próprias crenças.
Contar uma história, evoluir os personagens, diálogos com peso narrativo, passar uma mensagem, além de estrutura coerente. Eis alguns elementos que se bem realizados podem ser indícios de um bom roteiro. Paulina tem todos eles bem presentes.
A primeira cena, uma conversa entre pai e filha, já define muito do que este longa é. Somos muito bem introduzidos aos caracteres dos personagens, coisa que muitos filmes não conseguem fazer em 120 minutos. Além disso os elementos técnicos – fotografia, direção e edição – estão bem realizados naquele diálogo inicial. Sabemos que Paulina é uma mulher forte (mais uma para a lista): inteligente, decidida e com preocupações sociais. O projeto dela é levar um plano de difusão de direitos humanos para uma região desguarnecida. O pai considera isso uma “fantasia romântica de uma mochileira”.
A direção de Santiago Mitre é dinâmica. Muitas movimentações de câmera, por exemplo com o uso dela na mão e planos sequências. Algumas vezes a câmera é colocada em um local “errado”. A ideia de intencionalmente inserir esse artifício não é original, mas nos brinda com reações que normalmente não vemos. Tal ferramenta coaduna com a mensagem do filme, dita explicitamente: “[conhecer] uma realidade que não pode entender”. Colocar o ato do estupro, e mais alguns outros, em mais de uma perspectiva é um dos indicativos desse multifacetado recorte que o filme quer nos passar. A narração também foi posta de forma inteligente e acrescentando à narrativa.
Dolores Fonzi dá um vigor, uma retidão de caráter e ímpeto invejáveis à Paulina. O crescimento da personagem se deve também a atriz. Infelizmente os demais atores passam um ar mais amador para a trama. A Exceção fica talvez por conta do pai (Oscar Martinez), com quem Fonzi estabelece uma ótima dobradinha. Cada diálogo dos dois, a reflexo do primeiro, cativa o público e nos premia com argumento dos dois pontos de vista.
O ritmo é um pouco lento. Opção diferente, no caso, seria questionável. Todavia, há uma certa barriga e a sensação de pequenos arcos que narrativamente estão interligados, mas a edição passa uma ideia mais dispersa. Como vários temas (estupro, feminismo, liberdade, desigualdade) povoam a tela naqueles 103 minuto chegamos a conclusão que o objetivo é gerar reflexão e não dar respostas explícitas no corpo do texto cinematográfico.
Senti falta de um pouco mais de cenas mostrando a relação em sala de aula de Paulina com os alunos. Os discentes a desafiam – até com bons argumentos. A questão mais abrangente para além classe, o drama pessoal que a protagonista se envolve por acaso mais se mantém por retidão, fica mais no cerne do longa.
O filme Paulina propõe temas importantes, com uma narrativa coerente – apesar de bem pesada. A personagem principal tem muita presença e vemos uma protagonista completa. E mais do que a transformação dela temos a quebra de expectativa do público em relação à atitude de Paulina. Neste sentido o público também é convidado a tal mudança. A cena final, durante os créditos, serve para apreciarmos, com calma, os eventos do longa.