Crítica: A Vingança está na moda
A Vingança está na moda traz tipos peculiares e um drama/humor que funciona bem.
Ficha Técnica:
Direção: Jocelyn Moorhouse
Roteiro: P.J. Hogan e Jocelyn Moorhouse
Elenco: Kate Winslet, Judy Davis, Liam Hemsworth, Hugo Weaving, Sarah Snook
Nacionalidade e lançamento: Austrália, 2015 (19 de maio de 2016 no Brasil)
Sinopse: Myrtle ‘Tilly’ Dunnage volta, depois de muitos anos, ao povoado que nasceu. Dunnage é uma estilista de talento e usa o ofício para se vingar dos antigos desafetos.
A Vingança está na moda (The Dressmaker, no título original, raro caso que a tradução tem um resultado mais interessante) tem como primeiras imagens um plano aberto, visto de cima, de um ônibus chegando em uma região rural e cortes confusos de crianças brincando. Logo em seguida é mostrado uma mulher deslumbrante (Kate Winslet) dizendo: “eu voltei, seus miseráveis”.
O veículo mostrava o regresso de Myrtle (Winslet) à cidade natal, um povoado interiorano com um ambiente que lembra o velho oeste americano (a trilha reforça essa ideia), mas a história se passa na Austrália. As imagens das crianças são da infância dela e o fato de não estarem tão claras é que a personagem vai lembrando do que ocorreu no dia ao longo do filme. E a miséria, principalmente de caráter, é bem presente.
A história gira em torno dessa volta e do impacto dela na região. Tilly saiu da cidade acusada de assassinar um menino. Fato que, dado o trauma, ela não se lembra. Há também um arco importantíssimo envolvendo ela e a mãe. Molly Dunnage, a mãe, vive às traças e está aparentando uma quase senilidade. Os habitantes locais, na maioria, não se dão bem nem com a filha e tampouco com a genitora.
A cidade é recheada de tipos caricatos, mas que incrivelmente funcionam bem. A crítica aos costumes é bem pontuada. A cena do golfe, que serve para dialogar com o passado da protagonista e nos inserir naquele mundo, é um belo resumo do todo: uma certa suspensão de descrença, um humor bem aplicado e um drama raivoso, além de atuações pra lá de dignas.
As relações estabelecidas, dado o excesso de personagens, podem ser confusas e soar superficiais. De fato o são, mas tudo no tom do longa. Ainda assim, perde-se um pouco de força nesse sentido. Agora tudo sobre o envolvimento mãe e filha está irrepreensível.
A personagem da Molly é a melhor coisa aqui. Todas as camadas, transformações e diálogos são brilhantes. Judy Davis mais uma vez triunfa e dá uma força interpretativa que assusta de tão boa. A dobradinha com a Kate Winslet tem um resultado muito positivo. Kate mostra que não é à toa que se enquadra dentre os nomes mais queridos da atualidade. A presença dela tem um impacto que não pode ser ignorado. Hugo Weaving é o exemplo máximo da caricatura, como Sargento Farrat. Só que o desempenho de Weaving é tão glorioso que transforma o que seria o motivo da crítica em um elogio.
O mesmo não pode dizer do Thor genérico, Liam Hemsworth – irmão de Chris Hemsworth, que faz o deus nórdico nos filmes da marvel. O personagem tem um arco importante, mas grosso modo passa a sensação que só está ali para mostrar os músculos. Alguns momentos até funcionam no humor (em geral ao lado de Judy), mas o romance com a personagem da Kate Winslet é bem genérico. Todavia, há um detalhe que o torna diferente de um clichê completo, mas aí é mérito do roteiro e não do ator. A cena em questão causa um efeito de surpresa geral, mérito também da direção.
A apresentação, como falei, foi boa. O meio do filme tem uma certa barriga. Mas a última meia hora merece um comentário à parte. Tudo melhora e sobe consideravelmente a nota do todo. Arrisco-me a dizer que tem elementos tarantinescos misturados com um que de Woody Allen. Judy Davis, aliás, já trabalhou com o diretor.
Claro que com o assunto moda no tema central não posso deixar de falar dos figurinos. Os vestidos estão sensacionais e realmente trazem um contraste interessante naquela comunidade. O design de produção como um todo está de parabéns.
A Vingança está na moda tem defeitos e poderia aproveitar melhor os personagens secundários. Contudo é uma delicia de se assistir: clima de western, comédia afiada, um drama que instiga e uma sátira aos tipos sociais.
[o trailer revela coisa demais e não recomendo para aqueles que, como eu, não gostam de spoiler]
https://www.youtube.com/watch?v=tE0TYg0hckA&ab_channel=QuadroporQuadro