Crítica: Pais e Filhas
Pais e Filhas é a prova que o clichê pode gerar um bom filme.
Ficha técnica:
Direção: Gabriele Muccino
Roteiro: Brad Desch
Elenco: Russell Crowe, Amanda Seyfried, Kylie Rogers, Jane Fonda, Octavia Spencer, Aaron Paul, Diane Kruger e Bruce Greenwood
Nacionalidade e lançamento: EUA e Itália, 2015 (19 de maio de 2016 no Brasil).
Sinopse: após a morte da esposa, Jake tem que lidar com uma doença e criar a filha. Anos mais tarde a filha já adulta se torna psicóloga, mas sofre para superar os próprios traumas.
Pais e Filhas tem um roteiro um pouco óbvio? Sim. Cai no melodrama? Quase sempre. Perpassa diversos clichês? Com certeza. Mesmo com tudo jogando contra, o longa mostra qualidades que o colocam além de outros do gênero. Os méritos a serem destacados ficam por conta da direção de Gabriele Muccino, montagem e do elenco.
O famoso escritor Jake Davis perde a esposa em um acidente de carro. Logo em seguida ele é diagnosticado com uma doença psicológica, ficando internado por 7 meses. A filha do casal, a jovem Katie, mora neste período com os tios maternos. Estes se afeiçoam tanto à menina que querem a guarda dela.
Jake tem três conflitos para lidar: mostrar que é capaz de criar a filha, escrever mais um livro de sucesso e a própria doença, que o afeta no dia a dia cada vez mais.
Paralelo à história de Davis é mostrada a de Katie adulta, 25 anos depois dos fatos anteriores. Ela notadamente tem traumas pelo ocorrido na infância e se declara autodestrutiva. Procura casos de uma noite com desconhecidos apenas para preencher lacunas. Ironicamente ela é assistente social e é responsável por um caso de uma menina órfã.
Um dos méritos em Pais e Filhas é narrar simultaneamente a história de Katie com 6 e 31 anos. Os eventos, descobertas e aprendizados da infância repercutem de forma clara na Katie adulta. Quando ela é criança o foco da história é no pai. E sentimos o peso e senso de urgência em cada atitude dele.
Outro ponto positivo é que os personagens não são lineares e tampouco perfeitos. Vemos claramente as qualidades e defeitos. A busca deles torna-se algo crível e ver essa transformação os tornam empáticos aos olhos do público.
O diretor Gabriele Muccino, que dirigiu o excelente À Procura da Felicidade e o bom Sete Vidas (ambos com Will Smith), mostra que sabe contar uma história envolvendo dramas familiares e pessoais. A narrativa tem um ritmo fluido e quase não tem barrigas. A câmera transita de uma forma dinâmica pelos ambientes, de modo a ressaltar os sentimentos a serem passados. Destaque para as cenas de sexo. Nelas quando a proposta é só um sexo casual não é mostrado os dois atores, mas quando há uma relação mais apaixonada é a única vez que vemos a cumplicidade evidenciada.
A emoção transmitida provavelmente levará muita gente às lágrimas (eu chorei em dois momentos). Mesmo sendo melodramático a coisa não é empurrada goela abaixo. Toda a construção é feita naturalmente.
Obviamente sem dar spoiler é necessário que eu fale das três cenas que encerram o longa. A antepenúltima é bela, rica e muito emocionante – poderia ter encerrado o filme. Mas, infelizmente, ele não acaba ali. Em seguida vem um momento completamente descartável e seguido de um clichê bem frustante. É muito importante saber finalizar bem e aqui o corte final deixou bastante a desejar.
A trilha sonora não antevê o sentimento passado na cena, mas ela é bem manjada e não se torna um destaque positivo. Salvo uma música cantada em mais de um momento da trama. Esta, além de bela, tem um sentido narrativo. A movimentação de câmera é outro elemento instável no longa. Ao mesmo tempo que explicita bem aquele retrato, cai em uma certa monotonia com a repetição do recurso.
Voltando às forças de Pais e Filhas é importante destacar as atuações. Atores ruins poderiam exagerar e tornar a história – que é sentimental – algo pouco palatável. Russell Crowe dá um vigor visceral ao Jake fazendo-o de modo preciso e reforça o já citado senso de urgência. Amanda Seyfried e Kylie Rogers fazem a Katie adulta e criança, respectivamente. Ambas são encantadoras e mostram personalidade. Os sentimentos vividos pela personagem são transmitidos constantemente em todas as relações.
Jane Fonda, Octavia Spencer e Aaron Paul tem papéis secundários, mas marcam presença. A experiente Fonda é a empresária de Jake e responsável por um belo discurso. Ela tem pequenas participações, mas faz uma ótima dobradinha com Crowe. Spencer (Histórias Cruzadas) também aparece pouco. Ela é a chefe de Katie e vem como uma profissional pragmática. Paul (Decisão de Risco) não lembra em momento algum o marcante Jesse do seriado Breaking Bad. Ainda assim, ele consegue demostrar outra faceta e comprovar que é um jovem ator bastante promissor. A Diane Kruger faz a Tia de Katie e acaba se saindo vilanesca demais e é a única que sai do tom. Já Bruce Greenwood faz um antagonista mais inteligente.
Pais e Filhas tem uma história envolvente, bem dirigida e com bons atores. Diverte em alguns poucos alívios cômicos, mas fundamentalmente emociona – quase que durante todas as duas horas. Sinto que alguns deslises foram decorrência da tentativa de agradar um público mais sensível. Apesar de todos os pequenos (ou não tão pequenos assim) problemas, creio que valha a pena conferir nas telonas.
[O trailer não faz jus ao longa e vende uma ideia mais genérica que o filme realmente possui]