Hollywood não gosta de joysticks: as pavorosas adaptações do universo gamer para o cinema
Super Mario Bros, Double Dragon, Street Fighter, Mortal Kombat, Doom, Tekken, Dead or Alive, Need for Speed, Far Cry, The King of Fighters… o que essas bem-sucedidas franquias de games tem em comum? Todas elas foram vítimas de um grande mal: a dificuldade colossal que a indústria do cinema tem para entender e decodificar para as telas o universo dos enredos dos games.
Quem gosta de literatura tem uma infinidade de adaptações cinematográficas para aproveitar. Nos últimos tempos, temos acompanhado nos cinemas uma invasão de adaptações de quadrinhos e graphic novels. Algumas como ‘V de Vingança’, ‘Sin City’ e a trilogia ‘Batman, O Cavaleiro das Trevas’ foram bastante elogiadas tanto por quem curte cinema quanto por quem é fã de quadrinhos. Já quando o assunto é a combinação videogame e cinema o resultado é constrangedor.
Qual o grande filme que tenha transmigrado do seu console para as telas do cinema e tenha se tornado num clássico arrasa-quarteirões? Nenhum. O máximo que essa combinação nos deu até hoje foram meia dúzia de filmes bem medianos. Cito aqui de cabeça dois: Tomb Raider, uma aventura que lembra de longe o Indiana Jones e ganhou até continuação… e a série Resident Evil, que talvez seja o melhor que a combinação joystick-claquete nos brindou até hoje. (convenhamos que é muito pouco)
Mas por quê isso acontece? Eu tenho uma teoria própria para esse fenômeno. Hollywood ainda não percebeu o tamanho dos games para cultura e principalmente para economia. Para se ter ideia, a indústria de jogos arrecadará o equivalente a US$ 91,5 bilhões em 2015, um aumento de 9,4% em relação ao valor registrado em 2014, quando foram contabilizados US$ 83,6 bilhões em lucros. Esse valor é mais de cinco vezes mais que a arrecadação em bilheterias das produtoras gigantes de Hollywood que movimentaram “apenas” US$ 10,8 bilhões em 2014. (Um verdadeiro Fatality!)
Adaptar sim! Viajar na maionese não!!!
Qual seria a reação de um fã da série ‘Guerra nas Estrelas’ se eu fizesse um jogo em que, de maneira repentina e sem explicações, o protagonista fosse o Jah Jah Binks e que ele desse um golpe de estado e reinasse de maneira tirana e soberana em todo universo? E tem mais… se além dessa história bizarra e totalmente nada a ver com o enredo original, meu jogo tivesse gráficos terríveis, jogabilidade deplorável e sprouts zoados dando a nítida impressão de que foi feito de qualquer jeito?
Sim, com toda certeza, os fãs da série Star Wars xingariam até minha décima geração por “audaciosa heresia”, mas acredite… situações semelhantes a essa hipotética situação bizarra acontecem o tempo todo quando enredos de jogos ganham as telas dos cinemas. Boa parte dos roteiros que foram adaptados tem uma dificuldade imensa de respeitar os ritos, mitos e mitologias próprios de cada game.
Há 22 anos, em 1993, a série Super Mario Bros inaugurou a nova temática de filme com universo dos jogos nos presenteando com uma imensa frustração. Assistimos um “super” Mario com medo de altura (logo ele que não respeita as leis da física) numa história tosca que simplesmente nada tinha a ver com a original. O filme parece ser ambientado em Las Vegas e Toad é um punk e não um cogumelo.
Como desgraça pouca é bobagem, um ano depois, a Universal lançou ‘Street Fighter, a batalha final’ esvaziado de fight e também de street… Sem dar explicações plausíveis, a produtora resolveu tirar o protagonismo dos personagens Ryu e Ken, e sua busca pelo aperfeiçoamento nas artes marciais, e dar para outro personagem, o coronel do exército americano Guile, interpretado porcamente por Jean Claude Van Damme. Assim, transformando o clássico dos fliperamas num filme genérico do Van Damme, com quase nada de ação e cenas dignas dos piores filmes dos anos oitenta…
Mortal Kombat sem sangue e com lutas bem meia-boca. Doom sem tiroteios incessantes e nada de terror gore. King of Fighters lembrando uma temporada da novela Malhação. Need for Speed com poucas corridas e recheado de piadas desprezíveis. Tudo isso já ocorreu e corrobora ao pensamento inicial que as pessoas que fazem cinema não jogam videogames. Ou então algo bem pior, subestimam a capacidade das histórias, fazendo literalmente qualquer porcaria para o público, desperdiçando tramas consagradas e uma boa oportunidade de ganhar dinheiro.
Há que se ter confiança nos enredos, adaptá-los de forma convincente e não reescrevê-los da forma mais grotesca. Quem consome games está acostumado com tecnologia, então é meio óbvio caprichar em fotografia, figurino, cenografia, mixagem de som e principalmente efeitos visuais. A meta tem que ser beliscar uns Oscars e não colecionar Framboesas de Ouro!!!
Zelda, Final Fantasy, Megaman, Medal Of Honor, F-Zero, God Of War, e mais uma infinidade de séries, certamente dariam excelentes bilheterias, se as adaptações fossem encaradas com um mínimo de esmero em suas finalizações. Os clássicos Mortal Kombat, Double Dragon e Street Fighter merecem um reboot respeitando seus enredos, com cenas de ação legais e efeitos visuais bacanas para apagar a terrível impressão deixada anteriormente por produções pavorosas.
Novas Perspectivas?
Agora em 2016, teremos uma boa oportunidade de avaliar se a indústria do cinema começará a tratar com mais seriedade as adaptações do universo gamer. Sob o selo da Fox, Assassin’s Creed estreará em dezembro, com direção do australiano Justin Kurzel e Michael Fassbender e Marion Cotillard como protagonistas. Vamos observar a história com cuidado, pois ela poderá representar a virada da conflituosa relação joystick-claquete ou então confirmar um prognóstico péssimo… que Hollywood definitivamente odeia videogames.