Crítica: 360
Desde os primeiros momentos de 360, o espectador já sente que tudo se trata de escolhas na vida. A vida é feita de bifurcações, e tudo que temos a fazer é escolher um dos caminhos. Mas qual caminho escolher? Isso ninguém diz.
A fotografia gélida traz um ar de melancolia, e ainda denuncia: estamos na Europa, no frio. Na busca por uma vida melhor, cada um faz o que pode. O que leva uma mulher a fazer sexo em troca de dinheiro? Muito fácil julgar. O que leva um homem a optar por trair sua mulher com uma prostituta? Muito fácil fazer a ligação. O difícil é lidar com as decisões tomadas. Fernando Meirelles conduz o nosso olhar a cada momento sob o ponto de vista de um personagem. Um aperto de mãos é visto de cima, os movimentos em uma casa são mostrados em um único plano, a tela se divide para mostrar diferentes personagens ao mesmo tempo, como se para ilustrar que outros tomam suas decisões ao mesmo tempo em que tomamos as nossas.
Ao longo da projeção, acompanhamos diversas tramas que, de uma forma ou de outra, estão conectadas. Uma mulher trai seu marido com um fotógrafo brasileiro, cuja namorada decide voltar ao Rio. O marido traído, embora sem saber, decide não trair sua esposa com a prostituta, cuja irmã se envolve com o marido de uma russa que deseja se divorciar para se envolver com um dentista muçulmano que a ama platonicamente. Enquanto isso, um pai busca encontrar sua filha e um ex-prisioneiro luta contra seus fantasmas pessoais, quando ambos se deparam com uma simpática brasileira que acaba de deixar seu namorado.
A câmera é próxima dos personagens: mostra detalhes, mãos procurando botões, rostos preocupados. Muitas vezes, parece estar se intrometendo na vida dos outros, como que desejando viver na pele de tão interessantes personagens, ou bisbilhotar e investigar o que está acontecendo. Os diálogos são muitas vezes minimalistas, simples, diretos, fazendo com que o espectador se sinta ainda mais envolvido com os personagens. E a proximidade que Meirelles traz serve para contrapor o pouco tempo de tela de cada um deles: a partir do momento em que aparecem, eles estão próximos, quase íntimos.
As atuações são, em sua maioria, memoráveis. Por mais que Rachel Weisz e Jude Law não tenham oportunidade de mostrar seus talentos, Anthony Hopkins traz emoção bem dosada tanto no “monólogo” quanto na relação com Laura, personagem de Maria Flor. Ben Foster, Jamel Debbouze, Dinara Drukarova e Vladimir Vdovichenkov conseguem dar profundidade emocional a seus fortes personagens.
A trilha sonora é um show à parte e aproxima o espectador ainda mais dos personagens ao alternar músicas diegéticas com músicas não diegéticas, como se o personagem estivesse ouvindo as músicas tocadas no filme, ao mesmo tempo em que interrompe algumas trilhas com um brusco corte de cenas: o silenciamento rápido ajuda o espectador a entender que acompanha uma trama diferente.
Assim, 360 é uma trama envolvente, triste e feliz, que mostra apenas como cada um é fruto de suas decisões. No fim das contas, a história se repete como em um círculo.
Eu poderia não escrever uma crítica. Afinal, já escreveram uma. Mas tomei uma decisão, afinal. Só se vive uma vez: quantas chances teremos?
Nota: 04 Claquetes