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Crítica: Uma Batalha Após a Outra

Uma Batalha Após a Outra
Direção: Paul Thomas Anderson
Roteiro: Thomas Pynchon, Paul Thomas Anderson
Nacionalidade e Lançamento: Estados Unidos, 2025
Elenco: Leonardo DiCaprio, Sean Penn, Benicio Del Toro, Regina Hall, Teyana Taylor, Wood Harris, Alana Haim.
Sinopse: Bob Ferguson é um ex-revolucionário que sai da aposentadoria para enfrentar a missão mais importante de toda a sua vida: resgatar a sua filha. Tendo vivido a juventude como integrante de um grupo de guerrilha, agora a sua fracassada vida o atinge em cheio com frustrações e tristezas quando o mais cruel de sua longa lista de inimigos retorna após passar 16 anos desaparecido e resolve sequestrar a garota.

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O plano de abertura e o final de Uma Batalha Após a Outra são, de certa forma, quase irmãos. Eles retratam personagens ligados por uma origem familiar e que precisam de algo na vida além da simples convivência. Necessitam agir e ajudar, viver além de um pouco.

Na de entrada, conhecemos Perfidia (Teyana Taylor), que faz parte de um grupo revolucionário junto de seu namorado Bob (Leonardo DiCaprio) e outros amigos. Eles, juntos, organizam manifestações, além de atacar sedes das instituições de um governo fascista e totalitário. Por fim, ainda realizam a libertação de grupos, como imigrantes, em uma abertura que remete muito ao atual momento dos Estados Unidos.

Aliás, o longa de Paul Thomas Anderson talvez tenha garantido sua força e diálogo dentro do boca a boca justamente por remeter a tantos elementos do mundo americano sob o governo Trump. Porém, mais do que isso, é uma obra que vai abordar um mal-estar da civilização, como diria Freud, sob um viés de uma tentativa de reconexão entre seus diversos personagens. Todos estão em busca do próprio espaço, da própria narrativa.

Até mesmo por isso, a trama brinca com os pormenores éticos de seus protagonistas. Perfidia, por exemplo, uma figura completamente forte, se vê em uma grande problemática consigo mesma ao não saber lidar com o peso de ter uma filha. Ao mesmo tempo, tem uma relação amorosa com um militar, Steven (Sean Penn), que é racista, mas se vê encantado por ela.

Nesse universo da amoralidade, a trama gira em torno dessas desconexões em seus primeiros 30 a 40 minutos. Até que ela avança no tempo e Bob agora cuida da filha dos dois, Willa (Chase Infiniti). Eles, no entanto, se veem atormentados quando Steven retorna para persegui-los e tentar esclarecer uma dúvida de 16 anos antes.

PTA constrói essa encenação pautada no encadeamento das ações e no peso de seus personagens. É um filme de ação, e isso fica bem claro do primeiro ao último minuto. Entretanto, a ação aqui é sempre pautada pelos gestos, olhares, sensações, toques e menos por um tiro um contra o outro ou um soco – não que esse elemento seja ignorado. A câmera reforça uma visão quase amorosa desses protagonistas, que são extremamente perdidos nesse cosmo. Eles buscam se provar sempre para algo.

Até mesmo por isso, a trama gira em torno de uma necessidade de pertencimento. A família, os grupos sociais, os ideológicos. Tudo que forma quem somos enquanto sociedade é posto à prova por aqui, justamente em uma busca eterna deles para encontrarem algo.

Bob, por exemplo, percebe uma necessidade que não tinha antes: a de proteger e ser um pai carinhoso com sua filha. Do outro lado, ela tenta compreender o próprio passado, entender quem é verdadeiramente sua família, seja a de sangue ou a carinhosa. Por fim, na tríade principal desse segundo ato, Steven também se vê em busca de um pertencimento ideológico, de um grupo de supremacistas brancos na qual ele é convidado a fazer parte.

Esse processo está menos em um plano dramático e quase sempre em um caráter cômico. Afinal, além de um filme de ação, Uma Batalha Após a Outra também é uma comédia. DiCaprio e Penn, aliás, usam e abusam de uma interpretação do humor físico de forma que pouco realizaram ao longo da carreira.

Nesse conexão de gêneros, a narrativa sempre se encaminha a uma continuidade. Nada acontece isoladamente e sim ao mesmo tempo. Um exemplo bem claro disso é uma sequência em que Bob está fugindo, contando com a ajuda de Sensei Sergio (Benício Del Toro), e, ao mesmo tempo, tentando se conectar com integrantes do velho grupo revolucionário.

Essa montagem – que brinca com as diversas formas – também constrói ao filme um caráter de espetacularização e épico na qual é evidente que visa ter. Não à toa, a hora final praticamente ocorre toda em um deserto, como se fosse uma espécie de neowestern. Ela também é palco, no clímax, de um momento que poderia estar desde em ‘Mad Max’ até mesmo em ‘No Tempo das Diligências’.

Falando sobre John Ford, há curiosos paralelos que Paul Thomas Anderson faz. Desde dessa encenação que sempre visa o épico, até mesmo em como a mesma se utiliza de um grande jogo de poder e moralidade de seus protagonistas. Marcado como racistas por muitos grupos, Ford tem em seu cinema uma enorme discussão sobre o papel dos brancos dentro de um apagamento de outros grupos nos Estados Unidos que se formava.

Em Uma Batalha Após a Outra, Paul Thomas Anderson se utiliza menos disso, afinal são muitos arquétipos presentes, porém eles sempre estão em uma grande discussão moral. São, no final das contas, anti-heróis, seja para o público ou seja da própria história. Tal atitude foi correta? Dedurar o outro é uma opção? Até que ponto é possível fugir do controle?

O mais interessante é em como esses personagens falhos vivem uma multiplicidade de discussões, que partem sempre de um interesse por um retorno ao seio da sociedade.

Em certo sentido, há uma brincadeira também sobre essa ideia revolucionária. Novamente, um debate moral. Ao mesmo tempo que busca quebrar as estruturas de poder, os mesmos estão sempre atrás de rememorar a forma como a humanidade foi construída, através dos grupos – sejam eles familiares ou de aproximação. O que buscam, ao final, é se sentirem realizados por fazer parte de algo, mesmo que isso signifique a própria morte. Desse jeito, há uma conclusão evidente de uma elipse de duas personagens no início e ao final. Nas duas há uma similaridade de intenções e, ao mesmo tempo, uma busca por algo melhor no futuro. É como se elas observassem que, para fazer qualquer diferença no mundo, precisassem apenas serem humanas.

Nota: 5 /5

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