Crítica: Valentina – 44ª Mostra de São Paulo - Cinem(ação)
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Crítica: Valentina – 44ª Mostra de São Paulo

“Valentina” venceu o prêmio do público de ficção brasileira da 44ª Mostra de São Paulo. (visto nos dias finais da “repescagem” da Mostra).

Ficha técnica:
Direção: Cássio Pereira dos Santos
Roteiro: Cássio Pereira dos Santos
Nacionalidade e Lançamento: Brasil, 2020 (44ª Mostra de São Paulo)
Sinopse: Valentina, uma menina trans de 17 anos de idade, muda-se para uma pequena cidade mineira com sua mãe Márcia para um recomeço. Com receio de ser intimidada na nova escola, a garota busca mais privacidade e tenta se matricular com seu novo nome. No entanto, a menina e a mãe começam a enfrentar dilemas quando a escola pública local começa a exigir, de forma injusta, a assinatura do pai ausente para realizar a matrícula. Apresentando a estreia no cinema da atriz e youtuber trans Thiessa Woinbackk, Valentina é um reflexo dos obstáculos que a sociedade obriga uma jovem mulher a superar, a fim de abraçar quem ela realmente é.

Elenco: Thiessa Woinbackk, Guta Stresser, Rômulo Braga, Letícia Franco, Ronaldo Bonafro.

Valentina - 44ª Mostra de São Paulo

“Valentina” é desses filmes que eu espero que seja exibido em escolas de todo o país. Afinal, além de tratar de um tema importante, o filme carrega consigo as vicissitudes de ser didático e verborrágico. Ao mesmo tempo em que é preocupado em caminhar com sua narrativa e explorar as nuances dos personagens, ele se leva ao excesso de explicações e diálogos muito expositivos.

Ainda que a atuação de Thiessa Woinbackk seja forte e verdadeira, outros atores jovens não seguem o mesmo caminho, e ainda que não comprometam demais, enfraquecem as decisões verborrágicas do roteiro, como explicar a maldade do “vilão” da cidade e escolher um jogo de “verdade ou desafio” repentinamente apenas para justificar uma fala da protagonista.

“Valentina” é bastante episódico ao mostrar a trajetória da jovem trans. Há força na maneira como o diretor escolhe mostrar seu dia a dia e suas dificuldades, mas o fato é que estamos em um filme de acontecimentos sequenciais que, muitas vezes, não se mostram necessariamente interligados.

Apesar de construir inicialmente um drama relacionado ao pai da protagonista, o filme muda seus rumos para uma situação de assédio e preconceito. Ou seja, a construção do medo de Valentina de nunca mais ver seu pai, ou de que ele terá uma relação problemática devido à sua condição, cai por água abaixo antes dos momentos finais. Os elementos discutidos na trama – que passam pelo assédio e vão para a intolerância, bem como o tratamento da sociedade com os jovens gays – são importantes, mas beiram o esquemático especialmente ao pintar os “vilões” como personagens unidimensionais.

Mesmo assim, o filme de Cássio Pereira dos Santos funciona como filme adolescente não apenas ao mergulhar o espectador no drama da protagonista, como também ao mostrar momentos importantes, como sua relação com o documento de identidade e o medo de que as pessoas descubram sobre ela.

É uma pena, portanto, que a forma com que suas conquistas ocorrem pareçam anticlimáticas, já que são construídas expectativas sobre seu pai e sobre a ameaça de que ela não será aceita na escola. Tudo ocorre de maneira sempre episódica e sem relação de causa e consequência – o que é evidenciado pelas denúncias da protagonista.

Assim, mesmo que trazendo uma mensagem fundamental e uma leitura importante para debater as questões relacionadas a adolescentes trans, “Valentina” acaba se tornando uma narrativa bastante esquemática e verborrágica. O final, simplista em sua solução, é mais educativo que realmente eficiente do ponto de vista dramático – ainda que o sorriso final de Valentina o compense.

No entanto, se é esse didatismo que leva o filme a te popularidade (vide o prêmio por voto popular da Mostra de São Paulo), então que sejam feitos mais filmes assim.

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