Três filmes que você deveria conhecer do cinema iraniano
O cinema iraniano, dentre todos os outros, é o que mais teve impacto direto na minha formação cinéfila, que por consequência se insere no interesse pessoal e acadêmico na filosofia. Se fosse resumir em poucas linhas o motivo, certamente seria na humanidade extraída através da naturalidade das cenas, onde ficção e documentário se confundem, de modo a sempre provocar o espectador sobre qual seria, de fato, a separação entre eles.
Nessa lista, construída com simplicidade e enorme carinho, me aproveito desse espaço que faz jus a grandiosidade, bem como a pluralidade do cinema, recomendarei cinco filmes que me marcaram infinitamente na minha adolescência, exato momento da vida que precisava enfrentar o dilema entre o que deixaria para traz e o que seria a seguir – algo tão comum, mas que no meu caso (seu) me possibilitou a ousadia em olhar para o cinema alternativo como uma fuga.
O Balão Branco (1995), dirigido por Jafar Panahi
Repleto de magia e fantasia, o filme começa em 21 de março, Ano Novo no Irã, quando uma menina, Razieh, sonha comprar um peixe dourado para as comemorações da data, repetindo uma antiga tradição do país. Com a ajuda do irmão, ela convence a mãe a dar seus últimos tostões para a compra do peixe. Em seu caminho para o mercado, a menina perde o dinheiro. Isso, no entanto, não é motivo para que ela desista de seu sonho. Ela sai à procura do dinheiro, vivenciando encontros inesperados e a solidariedade de estranhos personagens.
Um dos filmes mais fortes, viscerais e delicados que já vi na vida. Não tem como falar de cinema iraniano sem citar o quão forte é o trabalho com as crianças de modo a registrar a condição de vida da população sob a ótica da inocência. Essa história foi um presente de Abbas Kiarostami para Jafah Panahi e, com esse gesto, presenteia o mundo com a verdade mais doce que o cinema já viu.
Filhos do Paraíso (1997), dirigido por Majid Majidi
Ali é um menino de 9 anos proveniente de uma família humilde e que vive com seus pais e sua irmã, Zahra. Um dia ele perde o único par de sapatos da irmã e, tentando evitar a bronca dos pais, passa a dividir seu próprio par de sapatos com ela, com ambos revezando-o. Enquanto isso, Ali treina para obter uma boa colocação em uma corrida que será realizada, pois precisa da quantia dada como prêmio para comprar um novo par de sapatos para a irmã.
Esse é um filme muito conhecido, com narrativa mais linear, nem por isso óbvio; parte da simplicidade e através dela se desenvolve de maneira impressionante. É para se emocionar muito.
O Quadro Negro (2000), dirigido por Samira Makhmalbaf
Em busca de estudantes e de pessoas interessadas em aprender a ler e escrever, um grupo de professores vaga por uma região de extremo perigo na fronteira do Irã com o Iraque.
Política e educação são discutidos de maneira intimista pelo olhar da Samira Makhmalbaf de forma surpreendente. Em poucos minutos, ela consegue realizar uma obra-prima que desperta empatia, é uma representação da condição social, humana, da forma mais cinematográfica possível: registrando a verdade através do audiovisual e sua capacidade de imortalização de fatos e sentimentos.
Considerações finais
Indiquei três filmes, de diretores diferentes, não por acaso, visto que os três têm em comum uma sensibilidade devastadora e espero fortemente que essas dicas sejam a base para uma pesquisa ampliada sobre os seus outros trabalhos. No entanto, não poderia deixar de citar o mestre Abbas Kiarostami, falecido em 2016, que literalmente me salvou, quando o descobri com Close-Up (1990). Termino com uma frase dele – a qual considero a síntese do seu trabalho – e um vídeo que falo sobre a importância de Close-Up na minha vida.
Seja documentário ou ficção, o todo é sempre uma grande mentira que contamos. Nossa arte consiste em contá-la de modo que acreditem nela. Se uma parte é documentário e outra reconstituição, isso diz respeito ao método de trabalho e não ao público. (KIAROSTAMI, 2005:87)