Crítica: O Lobo de Wall Street

É a este mesmo patamar que “O Lobo de Wall Street” nos leva: em certos momentos, nos divertimos, rimos e celebramos com Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio), por mais cruel e desprezível que ele seja durante toda a projeção: afinal, a sociedade, de certa forma, nos transformou em verdadeiros apaixonados pelo dinheiro e por tudo o que ele nos permite comprar, em detrimento de qualquer amor próprio ou dignidade.
É neste ponto que Martin Scorsese começa a fazer de “O Lobo de Wall Street” algo incrível, embora polêmico. Ao fazer do protagonista uma figura que permite o espectador se aproximar tanto, o diretor mostra todos os detalhes e a realidade de uma vida totalmente voltada a ganhar dinheiro de forma absurdamente asquerosa.
Muitos espectadores dirão que o filme faz apologia à ganância indiscriminada e ao uso de drogas, mas isso é bastante questionável: Scorsese – e o roteirista Terence Winter – se utiliza de elementos sutis para, na verdade, condenar estas práticas sem jamais deixar de ser realista.

Em outro momento da projeção, Belfort e Donnie (Jonah Hill) humilham brutalmente um funcionário recém-contratado porque ele está limpando um aquário, ou seja, desperdiçando seu tempo. No ambiente da empresa de Belfort, ainda temos diversos momentos em que ele se pronuncia diante de seus funcionários que, em êxtase, vibram com cada grito e frase de incentivo do patrão, em uma similaridade assustadora com certas igrejas, cujos líderes vem conquistando má fama justamente por se aproveitarem da inocência de algumas pessoas (assim como o protagonista faz, tanto em relação aos funcionários quanto, principalmente, em relação aos pequenos investidores).
Já no terceiro ato do longa, o protagonista chega a colocar sua filha pequena em um carro, causando momentos de pânico para alguém que não entende o que está acontecendo. Desta forma, é mostrado ao espectador como o personagem chegou ao momento mais baixo possível de sua humanidade.
De fato, “O Lobo de Wall Street” poderia mostrar com mais ênfase as pessoas que sofreram com as atividades ilegais (e mesmo as legais, porém imorais) de Belfort e seus comparsas, mas é possível entender que Scorsese não quis ser didático e nem subestimar seu público.
Em certo momento, Scorsese faz questão de mostrar a forma triste como uma secretária ganha dinheiro após rasparem sua cabeça, mostrando-a alheia à festa bizarra que acontece na empresa – escolher esta situação degradante como a principal ação de uma festa é uma escolha interessante a se analisar.

Outros atores que merecem destaque neste longa são Margot Robbie que, não contente em presentear o filme com sua beleza estonteante, cria uma personagem forte e consegue fazer cenas interessantes. Mas Matthew McConaughey e Kyle Chandler como Mark Hanna e o Agente Patrick Denham, respectivamente, protagonizam as duas melhores cenas do filme. Ainda no primeiro ato, McConaughey faz uma “iniciação” de um Jordan Belfort ainda ingênuo, em uma cena que já prevê o quão ridículo o protagonista vai se tornar. Na metade da projeção, Kyle Chandler encena, junto com DiCaprio, o melhor diálogo do filme, que mostra a falsidade de dois inimigos em uma conversa que vai se tornando cada vez mais ameaçadora, mesmo que sutilmente, até que Belfort perca o controle no final.
